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A Infância do Brasil – José Aguiar

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Nas primeiras aulas de História da escola nos é ensinado que vivemos em um país marcado por chegadas, partidas, doutrinação, escravidão e mudanças políticas. Nesses pouco mais de quinhentos anos, a infância do Brasil é ainda surpreendente para muitos brasileiros que, ao descobrirem relatos de exploração, se sentem incomodados com nossa própria História. O importante aqui é percebermos que existem dois lados do mesmo relato: o que normalmente aprendemos na escola (contada pelo lado vencedor) e o lado que vamos descobrindo depois (ignorada pela maioria dominante, o lado dos oprimidos e excluídos socialmente).

Tão importante quanto perceber os dois lados do processo histórico é nos vermos como agentes ativos da sociedade. Falando de forma simples, isso significa que enquanto aprendemos sobre o passado do nosso país e do mundo, somos nós mesmos pessoas que estamos vivendo o presente e, este mesmo presente será o passado das próximas gerações. Indo além, isso também significa que hoje passamos por diversas situações que são consequências daquele passado. E é aqui que queremos chegar.

A dramática Infância do Brasil

A graphic novel “A Infância do Brasil” foi criada por José Aguiar e contou com a curadoria da professora, mestre e doutora Claudia Regina Baukat Silveira Moreira. Com sensibilidade típica de artistas e mensagem reflexiva própria de acadêmicos, a obra nos convida a conhecer a história do país através do olhar das crianças de cada época.

Das crianças filhos de colonos do século XVI, às indígenas nativas desta terra do século XVII, aos enjeitados do século XVIII, aos descendentes de escravos livres do final do século XIX, aos sobreviventes do início do século das guerras, o curto porém inesquecível século XX e aos nossos pequenos do século XXI, conhecemos a história do nosso país, sendo convidados a olhar para o nosso redor, alcançando a nós mesmos.

São esses os personagens que nos surpreendem e, devido à sua inocência e total adaptação à sua realidade, nos mostram o passado de nosso país sob uma ótica que explica muitos de nossos comportamentos diários.

Ao chegarmos ao final da leitura, emocionados e reflexivos, cabe a cada um de nós decidir o que fazer com nossas próprias ações dentro da sociedade para que possamos garantir às próximas gerações uma sociedade melhor dentro de um país que além de “ser rico por natureza” é construído por gente forte e guerreira que sabe o que faz, ah! essa brava gente brasileira!

Às nossas crianças, de ontem, de hoje e de amanhã

A Infância do Brasil é dividida em seis capítulos, dedicados a contar a história de cada século do país até os dias atuais. Cada capítulo apresenta a narrativa de uma criança ou de um grupo delas e personagens dentro de seu tempo, trazendo uma situação cotidiana inserida na cultura do local e em seu período histórico.

Traçando um paralelo entre o nascimento do país Brasil e seu crescimento, os capítulos trazem crianças desde o momento de seu nascimento até o momento em que, frutos de seu tempo, se tornam crianças sem infância. Indo além, o autor é provocativo ao nos mostrar que hoje as nossas crianças são frutos daquelas crianças. Será que superamos tão bem nossas cicatrizes culturais e coloniais? Hoje somos justos com os povos que a custo de suas vidas e almas nos trouxeram a modernidade e tecnologia? Já que somos uma sociedade civilizada, cuidamos bem de nossos pequenos?

Apesar do tema delicado, o autor não abusa do drama ou se coloca como tirano de nossos antepassados. Ao contrário, com naturalidade, ele nos mostra que o processo histórico é sagaz e fluído, construindo uma teia de ações que sempre terão consequências. É um convite, enfim, a nos vermos como agentes ativos da sociedade e não apenas passivos.

Análise Crítica

A graphic novel “A Infância do Brasil” possui 96 páginas, todas coloridas e em papel Couché Fosco 115g, no tamanho 21×28 cm. Lançada pela Editora Avec, a edição é muito bonita.

Os desenhos e narrativas criadas por José Aguiar são incríveis! De fácil entendimento, os traços são bonitos e provocam facilmente envolvimento para com a obra e emoção ao leitor.

É notável o bom trabalho de edição do projeto como um todo, já que a graphic novel é amarrada, do começo ao fim. Ao final da brochura, foram colocados textos complementares que explicam melhor ao leitor os processos históricos os quais as narrativas trabalham. É mais um exemplo de compromisso que um artista assume ao conceber uma obra, além do claro compromisso da editora Avec em publicar obras de qualidade e reflexão, destacando a nossa literatura nacional.

Por todos esses motivos, “A Infância do Brasil” é uma obra brasileira graphic novel de leitura obrigatória e, como não poderia ser diferente, entrou para minha seleta lista de livros favoritos. Convido, por fim, todos a conhecerem também. #LeiaNovosBR

Nota

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Nome:
 A infância do Brasil
Autor: José Aguiar
Edição: 1ª
Editora: Editora Avec
Ano: 2017
Páginas: 96
ISBN:
Sinopse: Em A Infância do Brasil, o premiado quadrinista José Aguiar lança seu olhar sobre a História do Brasil não pela perspectiva dos grandes eventos, mas pela das pessoas comuns, pelo viés da infância.
Nela o autor atravessa nossa história cheia de contradições, abusos, descaso, abandono, entre outras situações que insistem em não ficar para trás. A Infância do Brasil é sobre refletir o presente a partir do nosso passado para, quem sabe, projetarmos um futuro melhor.
Esta edição ainda conta com prefácio da historiadora Mary del Priore e textos finais sobre o contexto histórico de cada capítulo.

 

 

Star Wars: Os Últimos Jedi – Confira o novo trailer legendado

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Foi divulgado o novo trailer legendado de Star Wars: Os Últimos Jedi. O filme chega aos cinemas no dia 14 de dezembro de 2017 e pelas imagens inéditas está de tirar o fôlego!

A luta entre o bem e o mal continua e Rey permanece em busca de respostas. O problema é que elas podem levá-la a um confronto além de sua imaginação ou expectativa, colocando-a diante de uma decisão que pode mudar todo o rumo da galáxia. Será que Rey vai conseguir vencer a si mesma?

É hora de escolher o seu lado nessa luta épica!!! May the force be with us… (we can need it!)

 

Galinha cega – João Alphonsus

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Qual é a última coisa que olhamos ao comprarmos uma galinha? Acertou o leitor que disse os olhos, pois isso foi a primeira coisa que o carroceiro e dono da galinha Branquinha viu. Assim se inicia a narrativa de Galinha cega (DCL, João Alphonsus), uma história divertida e emocionante.

O pregão de um vendedor de frangos chama a atenção de um carroceiro que compra uma bela galinha. Satisfeito com a compra, o orgulhoso dono da galinha percebe algo especial nos olhos de sua nova aquisição. Encantou-se o carroceiro com a tal galinha e em pouco tempo já recebia até um nome: Branquinha.

Mas havia algo de incomum naquela galinha. Seu dono percebeu que Branquinha não ciscava no terreiro como as outras galinhas. O carroceiro procurou o motivo da desorientação de Branquinha, que não bicava mais o grão de milho largado no terreiro. Por sua vez, a galinha do carroceiro via tudo escurecer, até que uma madrugada, ao abrir os olhos, não viu mais nada. Escurecera de vez.

Com um projeto gráfico impecável, o livro possui um texto de fácil visualização, com uma fonte bastante legível para leitura, além de uma guarda na segunda e terceira capa, num formato vertical ricamente ilustrado, com imagens de página inteira e em páginas duplas.

Na parte final da narrativa ainda há um glossário com as palavras mais incomuns, ilustrado por galinhas e ovos como vinhetas finais. Também encontramos as biografias do autor e do ilustrador com ilustrações em ambas.

O que seria de uma galinha cega? Sua sobrevivência estaria comprometida não fossem as mãos ágeis do autor, em tirar vida da ligação entre uma galinha e seu dono. Mas esta narração é mais do que isso. Fala da amizade sincera que não vê defeitos e limites para que de fato aconteça.

Galinha cega é um livro para divertir, mas sem dúvida para fazer pensar.

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Nome:
 Galinha Cega
Autor: João Alphonsus
Edição: 1ª
Editora: DC
Ano: 2003
Páginas: 40
ISBN: 9788573387858
Sinopse: Esta é a história de um pobre carroceiro que nutria um profundo amor pelos animais. Um dia ele descobre que sua galinha predileta tinha perdido a visão e passa a cuidar da pobre criatura com grande afeição e carinho. .

Kazuo Ishiguro é o vencedor do Nobel de Literatura 2017

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O escritor Kazuo Ishiguro é o vencedor do Nobel de Literatura 2017. Ele é autor dos livros “Não me abandone jamais” e “Noturnos“.

“Não me abandone jamais” foi lançada no Brasil em 2005 pela editora Companhia das Letras e já foi resenhado aqui no Leitor Cabuloso. O livro conta a história de Kathy H, uma cuidadora que em breve se tornará uma doadora de órgãos, missão de sua vida.

Na obra, o autor nos convida a refletir sobre solidão, amizade, superação e perdas, características essas que nos tornam humanos. O diferencial da obra é que acompanhamos tudo isso enquanto aprendemos e nos encantamos por personagens que são clones. A maestria do autor é tamanha, que nos faz sair da terceira pessoa (leitor) e nos faz voltarmos o olhar sobre nós mesmos e sobre nossa condição humana.

O livro foi adaptado para o cinema em 2010 por Mark Romanek e é considerado pela crítica como um bom filme.

Apesar de ser um dos preferidos, Kazuo Ishiguro foi uma surpresa. A mídia apostava que o Nobel de Literatura 2017 seria entregue a outros nomes de peso como Margaret Atwood (“O Conto da Aia“, já adaptado em forma de série como “The Handmaid’s Tale“), Haruki Murakami (autor de “Minha Querida Sputnik“, entre outros) ou Mia Couto, por exemplo.

O escritor Kazuo Ishiguro tem 62 anos. Nascido em Nagasaki, no Japão, desde seus seis anos mora com sua família para a Inglaterra onde vive até hoje.

Cidade de Deus Z – Julio Pecly

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É mais um dia na Cidade de Deus. Isso é o que todos os moradores pensavam até descobrirem que o morro tá fechado e cercado pela polícia, sem previsão de liberação. A ordem é clara: ninguém entra e ninguém sai. Porque? Ninguém sabe.

Enquanto a mídia tenta cobrir os principais acontecimentos do lado de fora, os moradores tentam sobreviver. A ameaça dessa vez é mais complicada e um risco iminente de morte: viciados em crack estão agindo de forma estranha, dominando a favela, matando sem medo e se arrastando pelas ruas. Algo deu muito errado: eles se tornaram verdadeiros zumbis.

Quem está lá dentro, quer sair. Quem está lá fora, quer tentar entrar. A TV está cobrindo tudo e a Secretaria da Segurança tem que resolver. Como? “Limpa tudo”.

Esse não é mais um dia qualquer na Cidade de Deus.

O convite para a Cidade de Deus Z

“Cidade de Deus Z” de Julio Pecly é um livro que nos convida a entrar em um mundo onde o simbolismo domina, exceto quando se fala na violência cotidiana, que já é tão conhecida no Rio de Janeiro.

Ao falar de uma droga que condena milhões de vidas, Julio coloca em sua estória tal poder que os usuários se tornam zumbis. Sim, aquelas criaturas que conhecemos em filmes e séries de terror que matam sem distinção com o objetivo de se alimentar.

O grupo seleto de personagens do livro nos aproxima da cultura local, infelizmente de forma esteriotipada. A fantasia domina a obra, porém sua mensagem crítica está lá, se estendendo por todas as páginas.

Análise Crítica

“Cidade de Deus Z” é um livro curto que traz uma reflexão importante: qual o real perigo das drogas dentro de uma favela? Indo além, Julio cria personagens que buscam por uma saída do problema que chegou até eles sem eles pedirem. São pessoas comuns, com vidas comuns, que nunca se envolveram com drogas. Mas o reflexo chega até eles, ameaçando suas vidas e a vida das pessoas que amam.

Do lado de fora da Cidade de Deus Z, o autor se volta para quem decide como funciona a vida dessas pessoas: o secretário de segurança do país, os policiais, o BOPE, a televisão. Tudo isso visto pela ótica de um morador de dentro da Cidade de Deus, nos trazendo uma visão bem diferente do que nos chega através da mídia.

A ideia do livro é boa, a promessa é excelente! Criar uma horda de zumbis que foram criados pelo sistema de corrupção e por serem usuários de drogas é uma tacada de mestre. Infelizmente, falta profundidade no livro. Todos os personagens são caricatos, todas as mulheres são mal trabalhadas e, apesar das cenas de ação serem simples e rápidas de se acompanhar, falta espaço para profundidade e criação de laço dos personagens para com os leitores.

O livro passa rápido, a leitura é simples. Fica a reflexão para depois.

Nota

 

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Nome:
 Cidade de Deus Z
Autor: Julio Pecly
Edição: 1ª
Editora: LeYa
Ano: 2015
Páginas: 160
ISBN: 9788577345861
Sinopse: Até onde pode ir o estrago causado pelo crack? Neste romance ao mesmo tempo cômico e provocador, Julio Pecly dá a resposta com uma história que traz o fantástico para o cotidiano da favela carioca. No lugar do convívio diário com o vício e o tráfico, nos deparamos com a luta desesperada de um grupo de moradores para fugir da favela invadida por zumbis contaminados pela droga. E onde esperaríamos o auxílio do Estado, vemos a perspectiva ainda mais assustadora de uma polícia que entra na favela para calar e matar. Com uma escrita leve e direta, acostumada aos becos e vielas da comunidade, e à experiência de quem passou uma vida inteira lá dentro, o autor alia fantasia e crítica social para construir um thriller inusitado e um dia comum na Cidade de Deus, os moradores se veem impedidos de entrar e sair da comunidade por policiais armados. Seria apenas mais uma das muitas operações a que já estão acostumados, não fosse o motivo inédito e assustador: uma invasão zumbi na favela. Ao se ver cercado, um grupo de moradores e traficantes decide fugir, mas para isso precisa enfrentar não apenas a ira dessas criaturas assustadoras, mas também as armas dos soldados enviados pelo Estado, dispostos a matar qualquer um – zumbi, traficante ou morador.

Um café e o fim do mundo, por favor

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Laura soube que o dia ia ser uma bosta quando o vômito respingou no vaso e acertou seu olho.

Depois de escovar os dentes três vezes e mais outra depois do segundo banho, ela sabia que já tinha tirado o gosto podre da boca. Sabia, mas ainda assim tinha calafrios de nojo dirigindo para o trabalho. Odiava se juntar ao coro de ódio às segundas-feiras, mas quando acordou com o sol brilhando no seu olho ela soube que já estava muito atrasada. Tinha, então, levado a mão ao celular no criado-mudo, o coração em uma cavalgada furiosa tentando fazer o cérebro pegar no tranco, para tentar saber por quê o alarme não tocou. Demorou dois segundos, meio levantada e meio agachada ao lado da cama, um pé ainda enroscado no edredom, para entender também por que sua mão estava encharcada.

Ela xingou o gato de todos os nomes que conseguiu pensar, correndo para o banheiro, torcendo o nariz para o cheiro de mijo na mão.

— Posso saber que gritaria é essa logo de manhã, Laura?!

Ela respondeu à colega de apartamento com o máximo de educação que conseguiu encontrar — que no caso não foi muita —, explicando com os devidos adjetivos o que seu gato havia feito. Em resposta, ela gritou de seu quarto para Laura parar de ser enjoada e limpar a pia antes de sair.

— Eu tô atrasada! Quando eu voltar eu faço!

— Toda vez a mesma merda! — Ela foi abaixando a voz. — Acho bom você começar a fazer as coisas por aqui.

As reticências implícitas foram claras. Laura, com metade da blusa do pijama para fora e já sem as calças, pensou nos três meses atrasados de aluguel que devia para a colega. Suspirou, vestiu a blusa de volta, enrolou as mangas — que ficaram caindo durante todo o processo — e lavou tudo o mais rápido que conseguiu. Foi batendo a tampa do ralo na lata de lixo, depois de lavar tudo, que ela começou a amaldiçoar a hora em que resolveu colocar o pé para fora da cama: um pedaço de macarrão velho, molenga e gelado, voou para dentro de sua boca.

*

Laura teve outro calafrio. Engatou a primeira e acelerou, avançando no sinal fechado. O sedã a acertou de lado. Laura não percebeu, mas seu carro girou três vezes antes de parar na outra pista. Para ela, todo o acidente se resumiu a um leve apagão, barulhos de metal amassando e vidro explodindo ao mesmo tempo, alguns segundos de desorientação e pneus derrapando — que foi o que a trouxe de volta à consciência.

As mãos travadas no volante, ela olhou ao redor. Sentia uma dor aguda acima do supercílio esquerdo e sua lombar estava gritando. Não sabia onde estava, nem mesmo lembrava seu nome. Ela nem lembrava por quê estava sentada no meio-fio, segurando um copo de plástico rachado. A água gelada escorria por seus dedos, molhando sua camisa de manga comprida até o cotovelo. Laura olhou para a mancha escura, profundamente incomodada com a sensação do pano molhado colado à pele, mas voltou a olhar para o copo. Ele só estava rachado até a metade, ainda tinha água nele. Laura girou o copo, virando a rachadura para o outro lado — para o lado dos carros amassados —, e tomou a água.

Ajudou bastante.

Ela conseguiu até apertar os olhos na direção das latarias, numa tentativa de entender porque tinham policiais e bombeiros ali. Alguém gritava com ela.

Depois de assinados os papéis do seguro, Laura lembrou que deixou a bolsa no banco do carro. Estava com o celular que a empresa lhe deu na mão, vendo o guincho ir embora. Ela olhou para o celular, refazendo seus passos. Precisou pensar muito para entender que pegara a bolsa, depois o celular de toque polifônico e, enquanto apertava os botões de borracha, Laura devolvera a bolsa ao carro.

Piscou os olhos várias vezes, antes de pensar em chamar em voz alta. Quando chegou a isso, o carro já estava longe. Pensou em como estava vulnerável sem seus documentos, sem seus cartões e completamente sem dinheiro. Nem sabia o nome da rua em que estava. De pé, no meio da calçada, ela demorou vários segundos para lembrar que estava segurando um aparelho celular. Por pior que fosse, ainda fazia ligações.

Laura riu de sua própria idiotice, enquanto apertava o botão verde para ver as últimas ligações. Apertou as setinhas para baixo, procurando o número do seguro, mas viu que só estava abaixando o volume da ligação.

Ligação?

Com um pequeno pulo de susto, Laura levou o telefone à orelha. Não tinha percebido que estava tocando e, ao apertar o botão, atendeu a ligação. Escutou a voz de seu patrão, muito baixa, do outro lado.

— Oi, seu Araújo! Péra só um segundo que eu não tô ouvindo!

Ela afastou o celular do rosto, apertou a setinha para cima até a barrinha estar completamente cheia e o encostou na orelha novamente.

— Pronto! Pode falar!

—… e passa aqui para pegar suas coisas!

— Oi?

Mas ele já tinha desligado. A boca de Laura secou enquanto ela abaixava o aparelho. Estava desorientada demais para chorar. Sabia que deveria chorar, que tinha o direito de chorar, mas não conseguia. Colocou o celular debaixo do braço esquerdo e caminhou em uma direção qualquer, sem perceber que estava sem sua bolsa e que, na verdade, tinha jogado o celular no chão.

Deu um pulo de susto ainda maior quando alguém tocou seu cotovelo.

— Moça? Desculpa, mas seu celular caiu.

Ela olhou para o sujeito, cabelos pretos, olhos claros. Alto. Um sorriso confuso no rosto. Olhou para o aparelho que ele estendia. Nem sabia que ainda fabricavam aquele modelo de celular. Abriu a boca para falar que não era dela, que tinha deixado seu celular em casa porque o gato da colega de quarto mijou nele, quando os acontecimentos do dia passaram pela sua cabeça. Ela olhou do celular para o rapaz e não soube o que dizer, nem o que pensar.

*

Quando conseguiu raciocinar de novo, estava sentada em um sofá novo, mas que parecia velho. O lugar era escuro, mas não muito. Aquele lugar era familiar. Laura olhou para o celular em sua mão. Apertou o botão lateral para ver a hora, mas ele não ligou. Acabou a bateria ou ela não sabia mais qual era o botão que devia apertar. Antes que chegasse a uma conclusão, o rapaz da rua apareceu na sua frente, com dois copos brancos de papel na mão. Entregou um a ela, com um sorriso, e se sentou na poltrona à frente. O copo estava quente. Tinha uma sereia com duas caudas desenhada. As sobrancelhas de Laura subiram. Precisou de menos segundos, dessa vez, para entender onde estava. Bebeu um gole do café.

— Hmmm… Eu gosto de frappuccino.

— Imagino que tenha sido por isso que você pediu.

— Eu pedi?

— Moça… — Ele semicerrou um olho e colocou o copo sobre a mesinha entre os dois. — Tem certeza que você tá liberada para andar assim por aí?

Ela levou a mão ao rosto. — Assim como?

— Hã…

Ele apontou para o rosto dela, para a sobrancelha esquerda. Laura tateou pela lateral do rosto e deu um pequeno pulo na cadeira quando sentiu, ao mesmo tempo, uma grande atadura sobre e uma grande dor.

— Eu…

O rapaz levantou as mãos. — Você me disse várias vezes que estava bem e que não precisava te levar para o médico nem nada assim, mas eu ainda…

— Eu disse?

— Você… Você não lembra?

— Eu…

Laura forçou a cabeça, mas não, não lembrava. Disse a ele que não lembrava. Quando percebeu estava contando tudo que aconteceu durante o dia. Quis parar de falar mas, agora que tinha começado, achou melhor terminar. Explicou até como foi parar naquele apartamento, como tinha se endividado, como estava meio sem esperanças de conseguir pagar e como achava que seria expulsa de lá.

De longe, de muito longe, Laura pensou ver a si mesmo ali sentada, falando e falando. Estranhou que não estivesse chorando. Depois de algum tempo, lembrou-se que não deveria estar lá falando e aqui observando, então voltou a ocupar um lugar só. Esses pensamentos lhe deram uma certa vertigem, então ela parou de pensar nisso.

O rapaz deu uma risada. — Parece que você teve, oficialmente, o pior dia da história da humanidade.

— Ah… Eu concordo, viu.

— Essa rotina cansa, né? — Ele apontou para a janela do lado dos dois. — Olha só para todo mundo, autômatos sem alma.

Laura olhou, achando graça no jeito dele falar. Desviou o olhar rápido, pois viu seu reflexo de cara inchada encarando-a de volta. Estava horrível. O rosto esquentou e agora ele ia ver que ela estava corada e, sinceramente, Laura não achava que poderia ficar mais ridícula, mas olha ela ali. Laura sempre superava as próprias expectativas, parecia. O rapaz ainda estava falando e ela fez força para prestar atenção.

—… um simples jeito de acabar com tudo isso.

— Acabar?

Ele voltou a encará-la. — Sim, acabar. O que acha? Dar o troco no seu patrão, terminar com essa segunda-feira maldita e ainda garantir que nunca mais vai precisar se preocupar com aluguel.

— Parece bom demais para ser verdade.

— E é. — Ele riu. — Eu faço parte de um grupo que, já há algum tempo, está tentando acabar com esses problemas tão mundanos. Sabe, consertar tudo.

— Algum tempo?

Muito tempo. — Ele sorria, sempre. — Mas parece que não temos o que precisa para fazer isso.

Laura riu do jeito engraçado que ele falava. — E o que seria?

— Realmente, realmente, querer que tudo acabe.

— Eu… Não sei se entendi.

Ele ficou sério. — Olha, eu sou um membro dedicado do nosso culto.

— Culto?

— E eu já fiz coisas por nosso grupo que, digamos, não me orgulham muito.

— Tipo sacrificar inocentes?

— Ah, não. Todos os nossos sacrifícios são completamente voluntários. Acontecem só uma vez por século, também. Mas isso nem é o problema, sempre vai ter alguém disposto a se sacrificar.

— Ah é?

— Claro. Algumas promessas de um lugar melhor, no além, uma vida eterna ao lado de nosso patrono. Essas coisas.

— E quem seria seu patrono?

— É um nome complicado demais de pronunciar com línguas humanas. Mas voltando ao que eu te falava…

Laura teve, outra vez, a sensação de ver a si mesma sentada ali. De fora, ela conseguia se questionar o que estava acontecendo. Culto? Patrono? Sacrifícios? E ela estava lá, simplesmente conversando? Bom, obviamente era hora de levantar dali e… Era impressão ou o rapaz tinha virado o rosto justamente na direção que ela estava agora? Ali, sua consciência à parte do próprio corpo e… Ele tinha olhos amarelos? Como ela não tinha reparado nisso ainda? Duas piscadas de olho e estava de volta na poltrona. Ele realmente tinha olhos amarelos, mas isso não parecia incomodá-la mais. Muito pelo contrário. O rapaz ainda falava.

—… o que acha? Pode fazer isso?

Laura sorriu com a possibilidade de poder fazer alguma coisa por ele. — É claro. Claro que posso.

— Excelente.

Ele abriu um grande sorriso enquanto procurava alguma coisa nos bolsos da calça. Laura apertou os olhos, tentando se lembrar do que ele dissera, tentando entender com o que tinha concordado. Mas um papel foi estendido a ela e o momento se foi. Ela pegou a folha, uma metade rasgada de um caderno qualquer. Viu muitas letras ali, letras que não combinavam umas com as outras, que não deveriam estar uma do lado da outra. Combinações que machucavam uma parte de seu cérebro que ela nem sabia que tinha. Sentindo outra vertigem, ela desviou os olhos do papel. O rapaz ainda sorria.

— Eu só… — Ela arriscou um palpite. — Eu só preciso ler?

— Exatamente.

Laura ficou aliviada por ter acertado. — E por que vocês, digo, você ou alguém do seu culto, não pode ler?

— Pelos motivos que eu te expliquei. Nenhum de nós realmente quer que tudo acabe. Todos os que tentaram sempre acabaram se arrependendo antes do último verso. Alguns nem chegaram na metade. E isso… Bom, isso não foi bom nem para eles nem para nós. Coisas desagradáveis aconteceram e paramos de tentar. Mas você, ah… Com você eu sei que vai dar certo.

— Eu quero que tudo acabe?

— Não quer? Acabar com essa segunda-feira, pelo menos?

— Ah… Isso sim. — Laura olhou de relance para o papel e desviou o olhar rápido. — Mas é que… Você é tão dedicado, você mesmo disse…

— Eu tenho um filho.

Ela ficou decepcionada. Achou que conseguiu disfarçar. — Mesmo?

— Sim. Toda vez que estou lendo eu lembro dele, dos seus sonhos de adolescente, da vida que ele acha que escolheu.

— Entendi… E você não se importa que ele não alcance esses sonhos?

— Vamos nos concentrar no que você sente, Laura. No que você sente e no dia de hoje. Seu dia foi péssimo, não foi? Eu garanto para você que, se você ler esses versos, este dia acaba.

Ela pensou. O dia estava uma bosta mesmo. Ela teve outro calafrio enquanto ele falava. Com certeza foi porque lembrou da sensação de nojo do macarrão gelado na boca… Sacudiu a cabeça. Com certeza era isso, não a desconfiança de que não tinha falado o próprio nome para ele. Mas devia ter falado sim. É, claro que falou.

Ela levantou o papel. — É só ler?

— É só ler.

Laura desviou o olhar do sorriso do rapaz, que estava largo e pontiagudo demais, e encarou o papel. Forçou-se a não parar de olhar. As letras estavam muito fora de lugar ali, pareciam intrusas, pareciam uma violência. Era como se um quadro tivesse sido pintado com um espancamento de cachorro. Como se uma ideia tivesse entalado na garganta de uma pedra. Ela sacudiu a cabeça de novo. A sensação estranha era só por ser um idioma que ela não conhecia, Laura tinha certeza. E não, com certeza não porque eram palavras que nunca deveriam ter sido escritas com letras criadas por humanos.

Claro que não.

Laura começou a ler com dificuldade. Duas palavras depois, sua língua se acostumou ao movimento estranho que precisava fazer para pronunciá-las. Era preciso fazer ângulos errados com ela na boca, senão os sons sairiam quebrados. Depois da terceira linha, Laura nem precisava mais prestar atenção no que fazia, o que lhe deu tempo de pensar que realmente gostaria que esse dia bizarro acabasse. Seria um grande alívio, para ser sincera. Não podia esquecer de agradecer ao rapaz por essa oportunidade.

Alguns segundos depois, ou muitos, ou nenhum, Laura acabou de ler. O próprio ato de levantar a cabeça do papel parecia estranho. Pareceu levar tempo demais só para relembrar qual lado era para cima, qual músculo era o do pescoço e o que era seu pescoço em meio a todo o resto das coisas do mundo. Mas Laura conseguiu olhar para a frente, para onde o rapaz estava sentado.

Ela olhou ao redor. Ele não estava mais ali, nem na poltrona nem no café.

Laura olhou para fora, daquele jeito lento e veloz de um tempo que não tinha uma direção certa a seguir. O céu estava com um tom verde-amarelado, algo doente e fora de lugar. As pessoas saíam dos prédios, paravam de andar nas calçadas, olhando para cima. Coisas começaram a cair das nuvens esverdeadas, formas que a cabeça de Laura não conseguia processar, formas que eram esquecidas assim que ela desviava o olhar.

E elas não pareciam cair, na verdade. O chão parecia subir ao seu encontro. Ao encontro de todas elas e de cada uma ao mesmo tempo. Mas o chão continuava parado, Laura via as pessoas de pé ali. O chão estava parado e ao mesmo tempo convulsionava ao encontro das criaturas, das coisas. As pessoas estavam paradas e apontando mas também estavam correndo e…

Laura ficou enjoada. Fechou os olhos e se recostou na poltrona.

Não queria vomitar de novo.

 


Rafael Peregrino é carioca, mas conquistou a dupla cidadania paulista. Ama a boa leitura, seja ela ficção, biografia, filosofia ou rótulo de margarina. Gosta de Futebol Americano, correr e de fazer planos megalomaníacos junto da esposa. Escreve de tudo, seus muitos contos podem ser encontrados no Wattpad e seus poucos livros na Amazon.

Descubra novos livros nacionais com a #LeiaNovosBR

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Durante o mês de setembro está rolando a #LeiaNovosBR, uma campanha criada e organizada por mim, Domenica, e pelo Basso do Covil de Livros para apresentar novos livros nacionais para o grande público.

Quem disse que literatura brasileira é chata? Quem disse que literatura aqui no Brasil é só Machado de Assis?

Com a #LeiaNovosBR, nós apresentaremos novos livros nacionais e atuais, que estão sendo produzidos por pessoas que estão próximas de você. Essa é uma grande oportunidade de conhecer novas histórias e mundos, saindo do mainstream e ampliando a divulgação e apoio aos novos escritores e novas escritoras brasileiras.

Gostou da ideia? Não estamos sozinhos!

Nós não estamos sozinhos nessa! Convidamos vários podcasts, blogueiros, resenhistas, Youtubers e produtores de conteúdo para participar desse movimento. Muitos mostraram interesse e todos estão produzindo conteúdos super legais e trazendo indicações excelentes.

Além disso, escritores e escritoras e editoras nos apoiaram e nos concederam vários prêmios para oferecermos a vocês. Os prêmios foram divididos por todos os participantes da campanha para que eles escolhessem e distribuíssem ao seu público como o desejar. Quer mais? Alguns deles também conseguiram outros prêmios e estão sorteando em suas casas podcastais.

Conheça novos escritores e novas escritoras e concorra a prêmios

Procure pela hashtag #LeiaNovosBR e encontre dicas sobre novos livros nacionais para ler. A hashtag está rolando no Twitter, no Facebook e no Instagram. Você também pode encontrar postagens escritas e vídeos no YouTube, além de podcasts divertidos e informativos, é claro.

Para concorrer aos prêmios, é fácil. Basta procurar pela hashtag e acompanhar os programas participantes para saber quais prêmios e como está sendo realizado o sorteio. Aqui no Leitor Cabuloso já sorteamos uma cópia do livro autografado “Amor Plus Size” da Larissa Siriani e lá no Covil de Livros foi a vez do “Arquivo dos Sonhos Perdidos” de Rodrigo Rahmati. Aguarde que a partir da semana que vem tem muito mais sorteios aqui no Leitor Cabuloso e lá no Covil Geek. Fique ligado, pois faremos sorteios diários pelas nossas mídias sociais.

Agradecimentos a quem nos apoia!

Agradecemos aos participantes da campanha #LeiaNovosBR que abriram espaço em suas agendas de publicação e em seus feeds para falar da boa literatura nacional.

Agradecemos também às editoras e artistas que nos concederam prêmios para presentearmos aos ouvintes e leitores que se interessarem pela campanha. Obrigada Editora LeYa, Avec Editora, Oasys Cultural, Editora Dame Blanche, TocaLivros e às escritoras Rebecca Agra, Janaina Bianchi, Ana Lúcia Merege, Barbara Axt, Karen Alvares, Larissa Siriani e Karen Soarele, e aos escritores Lauro Kociuba, Marcelo Zaniolo, Rodrigo Rahmati, Fabio Fernandes e Adams Pinto por nos concederem prêmios para sortearmos.

 

Houston

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— Houston, temos um problema.

Um calafrio percorreu todo o Centro de Controle da Missão.

— Houston, repito, temos um problema — repetiu a voz de John Narbo calmamente.

A voz dos astronautas está sempre calma quando estão no espaço, prestes a aterrar na Lua, e surge um problema. A voz dos astronautas está sempre calma quando surge um problema. A voz dos astronautas está sempre calma.

— Percebido — disse Scott Scott, o líder da missão, com voz calma. — Qual é a natureza do problema, Apollo?

Scott olhou em volta e reconheceu uma calma apreensiva nas faces dos seus companheiros. Ele conseguia ver também alguma surpresa nos seus olhares. Ele também a sentia no seu próprio olhar. A nave tinha descido para a Lua, em direcção ao Mar da Tranquilidade, tinham ouvido a contagem a decrescer, 100 metros, 50 metros, 10 metros, 5… 4… 3… 2… 1… Se surgira um problema nesta altura, só podia ser a nave a despenhar–se no solo do astro. Como podia então John Narbo ainda estar a falar com eles? Calmamente.

A voz de John Narbo voltou a ouvir–se:

— Bem, Houston, não temos a certeza.

Scott Scott ficou ainda mais surpreendido com este comentário. Não é o tipo de comentário que um astronauta possa fazer. Um astronauta tem de ter a certeza do que diz. Disso depende a sua vida. Os factos e apenas os factos. John Narbo devia estar muito perturbado.

— Temos touchdown, Apollo? — perguntou Scott.

— Negativo, Houston — foi a resposta.

Como é que isso era possível? Tinham ouvido a contagem até 1 metro de altitude relativamente ao solo lunar. Como era possível não terem tocado ainda no solo? Scott olhou para Joe Madonna, que monitorava o computador. Este encolheu os ombros e abanou a cabeça: nenhum dos instrumentos indicava touchdown e ele não conseguia perceber porquê.

— Então, Joe?

— Não sei o que se passa, chefe. O computador desceu ao 1 metro e depois começou a reduzir em fracções cada vez mais ínfimas. Está agora a contar 0,000314 metros e continua a descer. A nave deve ter desacelerado muito mais do que prevíamos com a manobra de aterragem, chefe.

Scott ficou a olhar para ele um pouco mais longamente, para que Joe percebesse que ele não estava nada satisfeito. Voltou a virar–se para o microfone.

— Apollo, por favor confirmem a vossa altitude para o solo.

— Percebido, Houston — ouviu-se a voz de Narbo. — Altitude: 0,0000213 metros e a descer.

— Correcto, Apollo. Confirmem, então, a vossa velocidade.

— Percebido, Houston. A velocidade é de 0,0000003 e a diminuir.

— Correcto, Apollo. Por favor, aguardem.

Scott desligou o microfone e virou–se para os outros ocupantes do Centro de Controle da Missão.

— Okay, alguém me explique o que se está a passar!

E, de repente, todos falaram ao mesmo tempo criando o som de um bando de flamingos em pânico.

— Um de cada vez! — rugiu Scott. — Joe?

Madonna encolheu os ombros e abanou a cabeça.

— John?

John Memphis fez o mesmo.

— Paul?

Paul Dallas fez um gesto de desalento.

— George?

George Austin baixou os olhos.

— Parece–me ser um problema do computador, chefe — disse ele.

— Que tipo de problema?

— Bem… não para de contar decrescentemente.

— Não temos touchdown, George! Como é que isso pode ser do computador?!

Austin encolheu os ombros e abanou a cabeça.

— Ele pode estar certo, chefe.

Scott olhou em volta até descobrir o olhar penetrante de Leonard Nimrod.

— Explica–te, Leo.

— Eu sei que é difícil de acreditar, chefe. Mas é a única explicação lógica. O computador está ligado ao propulsor da nave e o computador parece não ter parado de contar decrescentemente a altitude. Neste momento ainda está em 0,00000000012 metros.

— As boas notícias, chefe — fez Paul Dallas —, é que a nave está cada vez mais perto do solo.

— Mas a esta taxa de descendência, quando é que atingirá o solo lunar?

Foi Nimrod que respondeu:

— Teoricamente? Nunca.

Scott pestanejou.

— Como assim, nunca?

— Bem, o novo computador tem uma capacidade aparentemente ilimitada de calcular valores matemáticos, chefe. Como a divisão dos valores matemáticos é infinita, o computador pode continuar em contagem decrescente indefinidamente.

— Quer dizer que a nave vai ficar cada vez mais perto mas nunca vai poisar no solo?

Nimrod assentiu com a cabeça.

— Então ponham–me essas cabeças a funcionar e resolvam o problema, raios! — gritou Scott.

Começaram todos a falar uns com os outros.

— Podíamos tentar fazer um bypass ao loop de alimentação e estrangular a saída no core.

— Não vai resultar. O core tem um time–out demasiado reduzido. E se colocássemos o propulsor em feedback de modo a fechar um circuito com o servidor interno?

— Não é má ideia. Mas para isso não teríamos de usar todo o oxigénio do habitáculo?

— Ah, é verdade…

No meio da confusão, Scott olhou para um canto onde esperava Grace Narbo, a mulher de Narbo, com um olhar angustiado.

Quando o seu olhar angustiado encontrou o olhar preocupado de Scott Scott, Grace Narbo percebeu até que ponto é que o seu marido estava em perigo.

Ela sabia o quanto todas aquelas pessoas tão inteligentes e competentes tinham trabalhado ao longo dos últimos dois anos. Dois anos de intenso trabalho de alguns dos profissionais mais brilhantes do planeta para conseguirem levar o seu marido até ali, ao Mar da Tranquilidade.

E ela lembrava–se de todos os esforços que ele fizera e que ela também fizera. As noites sem dormir, os dias longe um do outro, todos os problemas com a casa e os filhos e a piscina e a empregada hispânica e o carro, que ela tinha resolvido sozinha, sem apelo nem agravo, para que o seu marido, o seu homem, o amor da sua vida, conseguisse subir para aquela nave e estar neste dia, neste momento, lá em cima, junto à Lua, a descer para o Mar da Tranquilidade.

E agora isto. Aquilo que ela mais temera. Uma falha. Uma falha qualquer que ia dar tudo a perder. Que ia tornar um sonho num pesadelo. Tudo para nada. O pior negócio possível. Ela iria perdê–lo para sempre, não apenas por dois anos, não apenas por uns dias de distanciamento, mas para sempre. Toda esta espera, todo este esforço, e nunca o teria verdadeiramente. Ele estava lá em cima. Preso. Num espaço minúsculo. Sem ter onde poisar. Sem ter como atingir aquilo que estava tão perto, quase ao alcance da mão. Iria ficar sem oxigénio. Iria deixar de respirar. Ela própria não conseguia respirar. Ela própria estava a sentir–se presa e incapaz e… Não! Não! Ele tinha que regressar! Tinha que regressar! O que interessava a Lua?! O que raio interessava a Lua?!

A Lua. John Narbo olhou pela escotilha para o solo acinzentado e desolado apenas a alguns metros de si. Era impressionante estar ali. Ali. Junto ao Mar da Tranquilidade. Sonhara em estar ali toda a sua vida. Toda a sua vida trabalhara muito e esforçara–se e sacrificara–se, a si e aos outros, para estar ali naquele momento. Tudo o que sempre quisera era andar na Lua, sem peso, sem constrangimentos. Saltar, jogar golfe até… Na Lua. Deserta.

E agora, que aqui estava, por um motivo que não conseguia compreender, a Lua estava fora do seu alcance. Por mais que pensasse e verificasse e trabalhasse os instrumentos, parecia que a cada segundo que ficava mais próximo do Mar da Tranquilidade mais ele ficava longe do seu alcance. Os números continuavam a descer: 0,0000000000000000000000034 metros. 0,0000000000000000000000033 metros. 0,0000000000000000000000032 metros. O nada parecia infinitamente longe. E o infinito, perigosamente perto.

Narbo olhou para o seu lado, para Bill Crocket, que olhava pela outra escotilha, para cima. Olhava para a Terra, azul e só no centro do vácuo. Bela. Silenciosa. John sonhara em voltar à Terra, nessa noite. E sabia que Bill também. Estava ali tudo aquilo que eles adoravam. E agora estavam aqui, presos no meio do nada, junto à Lua, sem ter para onde ir.

Narbo voltou a olhar para o computador, os números a correrem e a desaparecerem do ecran para darem lugar a mais números e mais números que corriam e desapareciam. Maldito computador! Chega! Num impulso, John Narbo esticou o braço e, sob o olhar de Bill Crocket, carregou num botão e desligou o computador. O ecran morreu.

Os dois astronautas olharam um para o outro e depois para fora. Ali estava a Lua, e ali estava Terra. A nave parecia parada, mas eles não tinham sentido absolutamente mais nada. Parecia tudo na mesma.

— Achas que poisámos? — perguntou Narbo.

— Não sei — respondeu Crocket. — Mas não podemos estar a mais de meio milímetro.

— Tens razão.

Narbo ligou o microfone e transmitiu:

— Houston, temos touchdown.

 


Bruno Martins Soares é português e começou a escrever em tenra idade. Em 1996 ganhou o Prêmio Nacional de Jovens Criadores na vertente de Literatura, tendo representado Portugal na Feira de Jovens Criadores da Europa e do Mediterrâneo em Turim em 1997, onde seu conto Mindsweeper foi publicado em italiano. O seu primeiro romance foi publicado em 2009 — Alex 9: A guardiã da espada —, sob o pseudônimo Martin S. Braun. A conclusão da saga — A saga de Alex 9 — saiu em 2012, já com o seu nome. Em 2013, co–produziu e co–escreveu o longa–metragem Regret, da produtora Castaway Entertainment, assinando um acordo de distribuição para os EUA e Canadá para estreia em 2015. Agora escritor a tempo inteiro, Bruno Martins Soares foi consultor de negócios internacional, tendo trabalhado para clientes como a Sony, Bosch, Nestlé, Philip Morris e muitos outros. Como jornalista, escreveu para o Diário de Notícias e para a Ideias & Negócios, e foi correspondente em Portugal da Jane’s Defence Weekly, a maior revista do mundo de defesa militar. Também colaborou com o The Washington Post.

As Mulheres de Armas em A Torre Negra

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O texto abaixo apresenta possíveis spoilers da saga de livros e provavelmente mudará a sua forma de ver as mulheres de armas em A Torre Negra.

Boa viagem e um brinde a elas!!!

“Não esqueça do rosto de seu pai.”

Stephen King começou a escrever a saga A Torre Negra aos 19 anos, inspirado nas obras de Tolkien

A advertência, que permeia todo o worldbuilding da série A Torre Negra  – obra de Stephen King – deixa claro que o Mundo Médio é um mundo de/para homens. Em sua mitologia há pouco espaço para a figura feminina. Às mulheres desse mundo, e principalmente da patriarcal Gilead, cabem a costura, a dança, a culinária e todas as atividades comuns à corte. O caminho das armas, no entanto, lhes é negado.

 

A inexistência de mulheres pistoleiras segue sendo uma realidade mesmo depois de “o mundo seguir adiante”. É Susannah Dean quem muda o estado das coisas em A Escolha dos Três – segundo livro da série. Nascida Susannah Odetta Holmes, ela é uma negra ativista em um EUA colapsado pela segregação racial. Unindo-se ao Ka-Tet de Roland Deschain, Susannah se torna a primeira pistoleira de que se tem notícia.

Em “Os Lobos de Calla”, Susannah tem contato com as Irmãs de Oriza, um grupo de mulheres guerreiras reunidas em torno da figura de Lady Oriza, a “Senhora do Arroz” e uma das deidades femininas do Mundo-Médio. Essas mulheres costumam ser líderes em suas pequenas comunidades, cuidando de trivialidades como a organização de bailes até assuntos burocráticos como a manutenção de prédios públicos.

São conhecidas, porém, por sua habilidade em manipular as Rizas de Tiro – pratos de titânio com bordas afiadas com uma chapa de metal anexada à parte inferior, que permite à arma emitir um assobio ao ser lançada. Há quem diga que as ofensivas as Irmãs de Oriza podem ser tão destruidoras quanto as de um pistoleiro e, não raro, eles são vencidos pela mira e precisão dessas mulheres em competições.

Ainda sobre o poder das mulheres no Mundo-Médio, em “Mago e Vidro”, enquanto conta sobre sua vida pregressa, Roland apresenta ao seu Ka-Tet Susan Delgado e Rhea de Coos, cujas decisões se antagonizam até desembocar em resultados trágicos. Susan, a mulher por quem Roland se apaixona, é filha de Patrick Delgado – o responsável pelos cavalos de Hambry.

Após a morte do pai, para evitar que ela e a tia sejam despejadas das terras que lhes eram de direito, Susan aceita ser a concubina do prefeito Thorin, uma vez que sua esposa não era capaz de ter filhos. Já Rhea de Coos é uma bruxa e principal responsável por proteger uma das treze peças do Arco-íris do Mago para o revolucionário John Farson. Pessoalmente, eu a considero uma das melhores vilãs da mitologia kinguiana. Ela é execrável e frágil, uma belíssima combinação. Juntas, Rhea e Susan são responsáveis por moldar muito do homem que Roland se tornou. Mais que isso, tomam para si o direito sobre o próprio Ka – sobre o próprio destino – o que nem de longe era algo esperado de uma mulher.

Embora tenha uma cosmologia patriarcal, a saga A Torre Negra nos apresenta uma série de mulheres formidáveis e complexas, embora não se aprofunde com a devida atenção em muitos pontos pertinentes a elas. Seria muito bom saber um pouco mais sobre as Irmãs de Oriza ou sobre o passado de Rhea, por exemplo. Resta torcer para que o aparente comportamento engajado de King (ao menos nas redes sociais) resulte em mais histórias sobre a mitologia feminina do Mundo-Médio. Até lá, vamos entoar:

“Cana’ah, can-tah, annah, Oriza!”*

*Toda respiração vem da mulher, no dialeto superior dos Eld.

Editorial #2

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Quando eu, Lucas Ferraz, e meu amigo, Rodrigo Rahmati, decidimos fazer o trabalho mais profissional que pudéssemos com os contos do Leitor Cabuloso, estipulamos a audaciosa meta de postar um conto por semana. Conseguimos fazer isso no mês de janeiro. De fevereiro até hoje, 21/08, postamos mais oito contos. Nem preciso dizer que já não temos a pretensão de postar semanalmente, não é mesmo?

É importante ressaltar que continuamos firmes com o projeto, e nos reservamos a postar os contos apenas depois de editar e revisar adequadamente. A qualidade nos é o quesito mais importante. Obviamente estamos replanejando o projeto para que, no próximo ano, consigamos manter a periodicidade a que nos propusermos (desde que, claro, haja contos de qualidade em número suficiente para atendê-la).

A recepção dos contos tem sido interessante, mas nosso projeto de votação para escolher os que entrariam em nossa antologia se provou não ser efetivo. Nesse primeiro ano, todos os contos publicados no site estarão na coletânea. Também adianto que teremos dois convidados, um autor e uma autora muito bons, escrevendo contos exclusivamente para esse projeto, e também teremos uma terceira autora que, além de tudo, fará a capa do livro. Essas são surpresas que ainda não revelaremos, mas esperem coisa boa!

E, finalmente, chegamos ao ponto desse editorial onde esperamos contar com a colaboração de todos que estão lendo e acompanhando os contos do Leitor Cabuloso! Quando nossa coletânea estiver pronta, haverá páginas em branco entre os contos. Queremos preencher essas páginas com histórias curtas, e por isso convocamos a todos para que enviem microcontos pelo Twitter com a hashtag #microcabuloso. Ficaremos de olho nessa hashtag, e os melhores microcontos que recebermos vão entrar na coletânea! Não deixe de participar!

É isso que queríamos dividir com vocês a respeito dessa experiência maravilhosa que tem sido editar os contos do Leitor Cabuloso. Como sempre, ficamos no aguardo da submissão da sua própria obra, sempre observando nossas Regras de Submissão, e também dos seus microcontos no Twitter! Até mais pessoal!

A Filha do Sol e da Lua

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A menina veio boiando dentro de um cesto, pelas águas negras do Xingu, como se tivesse sido enviada até eles pelos deuses. Sua pele era branca feito a Lua e seus cabelos eram amarelos, da cor do Sol. Quando o índio que estava pescando avistou o cesto e verificou o que continha, saiu correndo em direção à tribo, gritando que o sol e a lua tinham mandado um presente para eles. Todos os tupis começaram a espalhar histórias, dizendo que ela era filha do Sol com a Lua e que foi enviada para que cuidassem dela como se fosse uma deles.

A essa menina foi dado o nome de Inca-Mair, um nome que combinava o significado de “pequena flor” com “pessoa branca”. Ela sempre se destacou entre a tribo, não só pelas diferenças de pele e do cabelo, mas também pela coragem e teimosia. Não havia nada que a menina temesse e nada que não quisesse fazer. Era uma exploradora e sempre que podia se embrenhava na mata, contra a vontade dos pais adotivos.

Seus olhos eram ferozes e aventureiros. Quando se encarava aquelas íris azuis-claras por muito tempo, dizem alguns, se podia ver todo o universo. Afinal, ela era filha do Sol e da Lua.

Quando completou cinco anos, seus pais tiveram dois filhos gêmeos: Cauê, o mais velho, e Ipê, o caçula. Ela os amou a partir do primeiro momento em que os viu, e jurou para os deuses que os protegeria, custasse o que custasse.

Desde seus dois anos, quando começou a andar e a se aventurar pela mata ao redor da tribo, até completar dez anos, Inca-Mair já tinha matado porcos, cobras e até uma onça-pintada. Cauê herdou um pouco do espírito aventureiro da irmã, porém sempre ficava com um pé atrás quando ela propunha algo muito perigoso ou que faria com que os pais se zangassem. Já Ipê era o medo em forma de pessoa, e, por isso, tanto Inca-Mair quanto Cauê o protegiam. Amavam a inocência do caçula, e, sempre que podiam, o enchiam de beijos e abraços.

 

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Inca-Mair sabia que estava dormindo, mas isso não impedia que os pelos de seu corpo arrepiassem. Encontrava-se na mata, em algum lugar que ela não reconhecia, e sua mãe estava presa ao tronco de uma enorme árvore, inconsciente.

O local estava escuro; era noite e a luz da Lua não penetrava as copas das árvores, tão grandes que, se as escalasse, poderia tocar os céus.

Inca-Mair começou a ensaiar alguns passos em direção à mãe, mas seus pés foram presos por uma espécie de cipó. Já estavam ali antes? Não senti eles enrolados em meus pés, pensou.

Sua mãe começou a despertar. A menina sorriu ao perceber que ela não estava morta, mas os olhos da mãe se arregalaram logo que encontraram Inca-Mair.

— Corra! Ele está atrás de você! — berrou, cuspindo uma mistura de saliva e sangue.

Inca-Mair se virou enquanto algo batia em sua cabeça. Sentiu o sangue jorrar e esquentar o lado esquerdo de seu rosto, ao mesmo tempo que o outro lado se chocava com o chão, cheio de folhas secas. Virou o pescoço o máximo que pôde para tentar ver seu agressor. Viu uma silhueta alguns metros à sua frente, mas sua vista estava borrada e não conseguiu enxergar as feições do que a atingiu. Tentou se levantar, mas a força escapou de seus braços e seu rosto chocou-se novamente com o solo.

Ela não estava entendendo. Não sabia o que era aquela criatura, mas sabia que não era humana. Conseguiu ver, forçando os olhos, que a aura dela era vermelha e suas mãos eram levemente maiores que as de um ser humano normal. Além disso, seus pés tinham a forma das patas de um lobo, peludas, negras e com garras enormes.

A criatura começou a se agachar na direção de Inca-Mair, e ela pôde sentir o hálito moribundo saindo de sua boca. Sussurrou no ouvido da garota, deixando seu rosto fora do campo de visão. Com medo do que poderia acontecer, Inca-Mair apertou os olhos o máximo que pôde, até começarem a doer.

— Escute o que tenho a dizer, filha do Sol e da Lua. Quando acordar, tudo que peço é que traga até mim seus dois irmãos. Veja, criança, o que acontecerá caso você não fizer o que eu lhe digo.

Algo fez com que suas pálpebras se abrissem lentamente, e ela chorou com o que viu. A mata deu lugar à sua tribo, mas não era como ela costumava ser. Havia fogo por todo o lado, e corpos. Corpos espalhados, queimando, estripados, inertes na terra.

Ainda deitada, sem forças para levantar, avistou seus irmãos. Cauê estava no chão, sem se mover, enquanto Ipê se inclinava sobre o corpo do irmão. Ele está tentando reanimá-lo, pensou. O garoto pareceu ouvi-la, e começou a se virar, com dentes vermelhos à mostra, esboçando um sorriso sanguinário. Ele não estava tentando reanimar o irmão; estava comendo o corpo dele, devorando a carne e bebendo o sangue.

Inca-Mair berrou, mas a voz não saiu. Ipê levantou-se e foi em sua direção, um passo de cada vez, se divertindo com a situação. Quando chegou perto, se abaixou, da mesma forma que se abaixou para devorar Cauê, mas quando seu rosto entrou no campo de visão de Inca-Mair, ela acordou, gritando. A última imagem que viu a acompanharia não só pelo resto daquele dia, como pelo resto de sua vida.

 

3

Acordou assustada. Olhou para a porta da oca e viu a luz do sol. Era dia. A rede dos pais estava vazia e aquilo apertou o coração da menina. Os irmãos ainda estavam dormindo, apesar de seu grito.

Levantou-se e saiu. Precisava falar com o Pajé sobre o sonho e também queria saber onde seus pais estavam.

Ela não era a única acordada. Pela localização do Sol, presumia que fossem seis horas da manhã, mas já havia índias e índios fazendo seus trabalhos. Mulheres preparando a comida e homens arrumando suas armas para caçar. Nenhuma mulher era proibida de se juntar aos índios na caça, mas quase que a maioria preferia ficar na tribo, junto aos filhos e às outras mulheres.

As crianças só podiam se juntar ao grupo de caçadores quando completassem treze anos. Inca-Mair tinha dez e, ao ver aquelas pessoas e suas armas, sentiu uma excitação. Não via a hora de poder ir mais além na floresta e aprender outras técnicas com os mais experientes.

Desfez-se daqueles pensamentos ao lembrar do sonho. Foi correndo em direção à oca do Pajé e, ao chegar, chamou-o. Não demorou muito e ele pediu que ela entrasse.

— Inca-Mair, minha pequena. O que traz você aqui tão cedo? Deveria estar dormindo.

Ela sorriu para o Pajé. Adorava conversar com ele e gostava principalmente das histórias que contava. Mas não foi para ouvir histórias que ela foi até lá. Dessa vez, foi ela quem contou a sua história, o seu sonho.

O Pajé ouviu tudo, prestando atenção em cada detalhe do que Inca-Mair dizia. Quando ela terminou, ele sorria.

— Por que está sorrindo, Pajé?

Ele se levantou e pegou a mão da menina. Olhou fixamente os grandes olhos azuis dela e disse:

— Tudo isso foi um sonho, minha criança. A criatura com a qual você sonhou se chama Abaçaí. Ela é um espírito maligno, que persegue índios pela floresta e os deixa loucos. Alguns dizem que ele é apenas uma história para assustar criancinhas, e outros juram que já o viram e tiveram de largar tudo e sair correndo, com medo de nunca mais voltarem. Mas eu nunca ouvi da boca de alguém que eu conhecesse, não nessa tribo, que já o tenham visto. Foi tudo um sonho.

Não podia ser apenas um sonho, e Inca-Mair sabia disso. Foi tudo muito real, mas preferia fingir aceitar as palavras do Pajé. Perguntou-lhe se tinha visto seus pais, pois estava preocupada com eles. Ele disse que os dois tinham saído cedo para caçar. Queriam algo especial para o almoço, pois completavam trinta e dois anos juntos naquele dia.

Ela assentiu e voltou para sua rede. Os irmãos ainda dormiam, como se nada tivesse acontecido. Deitaria-se mais um pouco e esperaria que os pais chegassem quando acordasse.

Mas não chegaram.

Acordou novamente com o canto dos índios chamando os demais para o almoço. Sacolejou seus irmãos até que a preguiça os abandonasse. Lavaram o rosto rapidamente o foram para o pátio onde todo dia comiam com o resto da tribo. Os olhos de Inca-Mair correram por todas as direções e não encontraram nem o pai e nem a mãe. Eles já deveriam ter voltado.

Deixou a preocupação dentro de sua cabeça e se juntou aos irmãos. Assim que Ipê terminou tudo o que tinha pego para comer, Inca-Mair puxou os irmãos pelo braço e levou-os em direção à oca da família.

— O que foi, Inca? Por que toda essa pressa em sair do pátio? O Pajé nem começou com as histórias ainda — resmungou Cauê, chateado por perder a sua parte favorita do dia.

Inca-Mair se sentiu mal por privar o irmão daquele momento, mas seria breve. Logo ele e Ipê voltariam para o pátio. Só precisava avisá-los do que faria.

— Papai e mamãe sumiram e eu vou atrás deles. Sonhei que algo tinha pego nossa mãe e estava prestes a fazer algum mal a ela. Eles sumiram desde as seis horas, Cauê. Vou atrás deles e quero que você fique aqui com nosso irmãozinho.

O garoto esboçou uma expressão de irritação e seus olhos negros se estreitaram:

— Claro que não vou ficar aqui de braços cruzados, Inca. Iremos juntos, nós três.

A garota se segurou para não chorar ao lembrar do que a criatura tinha lhe pedido. Se aquele sonho fosse real e ela levasse seus irmãos junto, seria o fim dos dois. Ela jamais se perdoaria por deixar as duas pessoas que mais amava em perigo.

— Não, Cauê; você e Ipê ficam aqui. Você vai proteger ele de qualquer coisa que possa aparecer na tribo. Não tenho mais tempo a perder. Fique aqui com ele e fiquem seguros. Logo volto com mamãe e papai.

Ela apressou os passos em direção à casa das armas e pegou uma grande lança, sua arma preferida. Saiu de fininho para que ninguém a seguisse.

Da porta da oca, Cauê e Ipê viram a irmã sumindo por entre as grandes árvores. Mas Cauê não ficaria ali de braços cruzados. Eram os pais dele que estavam em perigo, e não deixaria que Inca-Mair fizesse aquilo sozinha. Pegou Ipê pela mão e foi em direção ao ponto da mata onde, minutos atrás, sua irmã havia entrado.

 

4

Como pode estar tão escuro aqui, se há pouco o sol brilhava?, pensou a garota, segundos após entrar na mata.

Não estava tão escuro quanto em seu sonho, mas ela sabia que era porque ainda era dia. Tinha que ser rápida. Acharia o local do sonho e veria se seus pais estavam lá. Caso não estivessem, voltaria para a tribo e, se não tivessem chegado, informaria ao Pajé. Certamente ele convocaria um grupo de busca.

Caminhou pelo que pareceu uma eternidade, tendo que abrir, pelo menos umas três vezes, caminho por entre mata virgem. Sabia que estava perto, mas não sabia como. Era um pressentimento. Durante todo o percurso se deixou guiar por ele, e sabia que estava perto. Ao pensar nisso, seu coração acelerou e suas preces foram enviadas aos deuses, para que não encontrasse nem seu pai nem sua mãe presos a uma árvore. Quando chegou ao lugar do sonho, seu coração congelou. Não encontrou nada além de árvores. Nem sinal de seus pais, e muito menos de Abaçaí.

Resolveu verificar as redondezas em busca de algum sinal perdido, algo que fosse imperceptível caso alguém não estivesse procurando. Mas sua busca foi em vão.

Inca-Mair estava voltando para a tribo, com uma espécie de felicidade por não ter achado seus pais amarrados e sofrendo nas mãos daquele demônio, quando ele apareceu.

Estivera lá o tempo todo, observando-a. Agora ela conseguia vê-lo por completo. Uma criatura um pouco mais alta do que ela própria, com o rosto desfigurado, como se alguém lhe tivesse ateado fogo e, de alguma forma, ao invés de ter queimado, derreteu. Aquela aura vermelha que contornava todo o seu corpo era ainda mais forte do que no sonho.

Inca-Mair congelou. Sua mente gritava para que corresse, mas seus pés não obedeciam. Tinha certeza que a criatura era real e que seu sonho, de alguma forma, poderia vir a acontecer também. As imagens da tribo e de seus irmãos vieram à sua cabeça e aquilo pareceu destravá-la. Começou a correr. Estava quase fora do alcance de Abaçaí quando avistou seus irmãos. E o demônio também percebeu a presença deles.

— Corram! — gritou.

E foi isso o que eles fizeram. Começaram a correr por entre a mata, na frente da irmã mais velha. Se jogavam por arbustos intocados pelo homem e pulavam por galhos de árvores centenárias, que ficavam imóveis assistindo aquela fuga descontrolada.

Inca-Mair arriscou uma olhada para trás e viu a criatura se movimentando. Ela corria rapidamente, como um animal. Corria com suas patas de lobo e suas mãos disformes, todas no chão. Movimentava-se com a boca cheia de dentes pontiagudos escorrendo saliva. Os olhos da criatura eram verdes e sem íris, o que a deixava ainda mais assustadora.

Voltou a olhar para frente e seguir os irmãos. Estavam certos de que conseguiriam fugir daquilo. Que chegariam na tribo e teriam ajuda do Pajé para combater a criatura, quando, ao atravessarem mais um daqueles arbustos, a esperança os abandonou.

 

5

Inca-Mair e seus irmãos estavam encurralados na beira do penhasco. Abaçaí se encontrava na frente deles, sorrindo, mostrando seus grandes dentes.

Finalmente conseguiram ver a luz da Lua. Como o tempo passou rápido. Parece que estou aqui há minutos, pensou a menina.

Os pés de lobo do demônio eram ainda mais aterrorizantes que no sonho de Inca-Mair, e as mãos tinham unhas compridas e afiadas.

— Acho que esse é o fim da linha para vocês, ó, filha do Sol e da Lua. Eu lhe dei a opção de me entregar os dois — disse a criatura, apontando seu dedo pontiagudo para os dois irmãos gêmeos — para que eu poupasse os outros, mas como vocês fugiram e o trato não foi firmado, depois que terminar com vocês acabarei com a tribo toda também.

A menina não sabia o que dizer. Não sabia por quê o demônio estava fazendo aquilo com eles. Nunca lhe fizeram nada de ruim… Arriscou-se a perguntar:

— O que foi que fizemos para enfurecê-lo tanto, criatura?

Abaçaí gargalhou. Olhou a garota no fundo dos olhos e respondeu:

— Você não me fez nada, filha do Sol e da Lua. Quem fez foram seus pais. Eles geraram essas duas crianças do seu lado. É deles que eu tiro meu poder. Quando um irmão gêmeo se alimenta da carne e do sangue do outro, isso me fortalece, me deixa ficar nesse plano por mais tempo.

Abaçaí avançou e Ipê deu um passo para trás, assustado. Seu pé escorregou na beirada do penhasco e ele se desequilibrou. Inca-Mair foi rápida e o segurou pelo braço, trazendo-o novamente para a segurança do solo.

Ela percebeu uma expressão de espanto no rosto de Abaçaí. Se um dos irmãos morresse, ele não teria como se alimentar. Mas logo tirou aqueles pensamentos da cabeça.

A criatura continuou a andar na direção deles, e Inca-Mair não sabia mais o que fazer. Pegou-se, inconscientemente, pedindo ajuda. Não sabia para quem, mas pedia. Clamava por socorro, para que alguém aparecesse e os salvasse daquele monstro.

Foi Cauê quem berrou, pegando Abaçaí de surpresa:

— Deixe-nos em paz! Fique comigo, mas deixe minha irmã e meu irmão em paz! Faça o que quiser comigo, mas não machuque eles!

Lágrimas escorriam pelo rosto do rapaz. Amava os irmãos e não se perdoaria, fosse naquela vida ou na próxima, se algo acontecesse com qualquer um deles.

— Ah, pequeno Cauê, que heroico da sua parte. Mas acho que não há por quê eu aceitar sua vida em troca da dos seus irmãos, se eu já tenho a de vocês três em minhas mãos. Além disso, eu preciso de vocês dois juntos, não separados.

O garoto se deixou cair no chão, sentando em cima dos pés e com as mãos cobrindo o rosto. Estava tudo perdido. Falhara com os irmãos e com a tribo. Todos iam morrer, e a culpa era toda dele por ter seguido sua irmã pela floresta.

Inca-Mair se abaixou e abraçou Cauê. Puxou Ipê para baixo e ficaram ali, abraçados, enquanto Abaçaí avançava. Já tinha perdido a esperança quando algo começou a brilhar no caminho de onde eles tinham vindo

A criatura percebeu a expressão de felicidade da menina e se virou no mesmo instante em que um veado branco, com grandes olhos vermelhos, saía da floresta. Quando falou, sua voz parecia uma mistura de trovão com palavras.

— Deixe essas crianças em paz, Abaçaí. Deixe a elas e toda a tribo em paz

Inca-Mair percebeu um certo temor na voz de Abaçaí:

— Não se meta nisso, Anhangá. Seu dever é proteger animais, e não se intrometer em assuntos meus com os humanos. Você sabe que é dessa forma que eu me alimento e é dessa forma que me mantenho vivo e forte.

O veado branco não pareceu dar atenção ao que a criatura dizia.

— Eu estou aqui para proteger os inocentes dos corrompidos, demônio. Deixe-os em paz e volte para as profundezas da mata, de onde você nunca deveria ter saído.

Abaçaí foi em direção a Anhangá. O veado se transformou em um espectro humano com uma longa lança de madeira. Seu cabelo era amarelo como o de Inca-Mair, e sua pele era tão branca que dava a impressão de que brilhava quando tocada pela luz, que parecia ser da Lua. Os dois travaram uma batalha.

Anhangá se jogou para cima de Abaçaí, mirando sua lança direto no coração da criatura, que desviou por poucos centímetros. O golpe passou rente ao seu peito, criando um pequeno arranhão.

Enquanto Anhangá recuperava o equilíbrio da investida falha, Abaçaí projetou suas garras em sua direção, acertando-o nas costas e derrubando-o no chão. Colocou seus pés nas costas do adversário, pressionando-o contra a terra.

— Nunca gostei muito de você, Anhangá. Que oportunidade maravilhosa essa que me foi dada: acabar com você e depois destruir essas criaturas imundas e toda a sua tribo.

Anhangá tentou se levantar, mas Abaçaí voltou a forçar seu pé contra as costas do outro, e começou a socá-lo. Anhangá estava prestes a perder a consciência quando a sua lança atravessou o peito de Abaçaí, fazendo-o cuspir sangue.

O espectro empurrou o demônio, derrubando-o de lado no chão, ainda com a lança atravessando seu corpo. Viu que quem o tinha salvo era a menina de cabelos amarelos e pele branca. A filha do Sol com a Lua, como todos os espíritos a chamavam.

Anhangá pronunciou algumas palavras que Inca-Mair não conseguiu entender e retirou a lança do corpo de Abaçaí. Virou-se para os três índios e disse:

— Venham comigo. Levarei vocês de novo em segurança até sua tribo. Lembrem bem do que viveram hoje e nunca se aventurem dessa forma novamente. Existem coisas nessa floresta que vocês desconhecem. Coisas piores do que ele — terminou, olhando para o corpo inerte de Abaçaí.

Inca-Mair pegou a mão dos dois irmãos e foi em direção ao espectro, que agora voltara a sua forma de veado branco. Ele pediu que subissem em suas costas. A menina não conseguiu segurar a curiosidade e perguntou:

— Ele está morto? Eu matei ele?

Anhangá olhou-a, virando a cabeça para trás, e falou em um tom afável:

— Não, criança; você apenas o pôs para dormir. Daqui a cem anos ele despertará novamente, e provavelmente acordará furioso e buscando vingança. Mas, no momento, não se preocupe; vocês estão seguros.

Inca-Mair fez um sinal de aprovação com a cabeça e então Anhangá os levou de volta para casa.

Pouco antes de chegar no local onde horas atrás os irmãos adentraram a mata, Anhangá os deixou.

— Vão, crianças. Seus pais e a tribo inteira estão procurando por vocês. Digam a todos o que aconteceu e fale ao seu Pajé sobre a necessidade de proteção. Abaçaí é apenas um dentre tantos demônios que vivem nessa mata, e a história que a filha do Sol com a Lua o derrotou ecoará pela escuridão da floresta e chegará aos ouvidos desses outros seres que se alimentam da escuridão. Você não está mais segura em circular sozinha por aqui. Nenhum habitante da sua tribo está.

A figura deu as costas aos três e se foi, tão sorrateira quanto havia aparecido. Aos poucos o brilho emanado por ela foi engolido pela escuridão da floresta.

Quando saíram da mata, Inca-Mair abriu um grande sorriso e seu coração começou a pulsar mais rápido. Correndo em sua direção vinham seus pais, que logo juntaram os três irmãos em um longo e apertado abraço.

Inca-Mair faria o que a criatura tinha pedido: alertaria o Pajé e a tribo sobre os perigos que eles correriam a partir daquele dia. Contudo, uma sensação de ser observada mesclava-se com a de sentir-se segura. Podia jurar que um par de olhos (ou vários pares) estava escondido por entre os galhos das árvores e arbustos da floresta, observando-os. Estudando-os. Planejando um momento de atacar e talvez até de se vingar por Abaçaí. No entanto, o abraço dos pais foi levando aquele emaranhado de sentimentos para longe, pouco a pouco, até que a sensação de segurança e o amor que eram transmitidos através daquele gesto dissipou-o de vez.

Estava em casa e, naquele momento, era tudo o que importava.

 


João Paulo Effting nasceu na cidade de Blumenau, Santa Catarina. Desde criança é apaixonado pelo gênero de fantasia/terror e, sempre que podia, estava lá, assistindo a filmes com monstros e mistérios. Atualmente, com 26 anos, vive na cidade onde nasceu, e trabalha como Desenvolvedor de Sistemas. Nas suas horas vagas, sempre está com um livro em mãos, paixão que descobriu com aproximadamente quinze anos, quando, em uma biblioteca, encontrou o primeiro livro da renomada saga Harry Potter, da escritora J.K. Rowling.

O Caminho do Louco – Alex Mandarino

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“(…) É por isso que o Caminho do Louco é uma iniciação, mas não necessariamente uma iniciação mágicka. Você é o Louco, não um mago. Ou um sacerdote. O mais importante que tenho a lhe dizer é isto: verdade, conhecimento (ou cultura) e os caminhos da natureza. São as três chaves para manter afastada a escuridão da ignorância e da infelicidade. Mas não preciso lhe tratar como um pupilo ou um iniciante. Você é o Louco. Está aqui para traçar seu Caminho, não apenas para “aprender”. Pode nos ensinar também.” (p. 174)

“De louco, todo mundo tem um pouco”, diz um ditado popular. Será?

Após 20 anos trabalhando na mesma empresa, André Moire surta. Estafado de sua rotina aprisionadora dentro de uma redação de jornal, em uma manhã ele se levanta e joga tudo pra cima (ou para baixo, já que sua mesa fica em um mezanino e é de lá que ele joga seu computador).

Passada a empolgação de sua alforria moderna, André começa logo a perceber as mudanças em seu cotidiano: seu círculo de amigos jornalistas se afasta, seus dias não são mais preenchidos com ordens e longos textos dos quais não se interessa em fazer.

Ele pode fazer tudo e, depois de um breve período, decide jogar a mochila nas costas e viajar para conhecer o Brasil e parte dos países vizinhos. Mas, após pegar uma carta de Tarot no chão, ao acaso, ele descobrirá que sua vida nunca mais será a mesma…

“ – Vim me certificar de que estava bem. Vim recebe-lo. Você é uma nova pessoa agora.
 – Eu me sinto o mesmo, só que com fome.
– Bem, claro, ainda é o mesmo, em certo sentido. Mas também é outro.
– Porque veio ver como eu estava? Quem é você?
– Sou o Bagatto, lhe disse. E vim ver como você estava porque, bem, alguém tinha de vir fazer isso. E, por ser o Bagatto, tinha de ser eu.
– Como assim? Por quê?
– Tradição? Ordem natural das coisas? Chame como quiser, mas é assim. Tinha de ser eu, porque… bem, sabe o que eles dizem. Nunca – repito, nunca – invoque o Louco, a não ser que esteja preparado para que qualquer coisa possa acontecer. Eu vim porque estou preparado. Eu sou o Bagatto. O Mago. Você? Você é o Louco.”

Trilhando o Caminho do Louco

Acompanhando André em seu período sabático, somos convidados a trilhar com ele O Caminho do Louco, o caminho que o levará à iniciação no Tarot. O Tarot é um grupo internacional secreto que utiliza de todas as ferramentas humanas já descobertas e criadas para elevar o nível de consciência da humanidade.

Durante o Caminho, André descobrirá que é a representação de uma Carta Maior do baralho, o Louco, e começará sua iniciação conhecendo outros Arcanos Maiores: o Mago, a Sacerdotisa, a Imperatriz e o Imperador. Além destes, ele também terá oportunidade de cruzar sua história e suas ações com o Carro e muitos outros Arcanos Menores, em várias regiões do mundo.

O Caminho do Louco é repleto de aprendizados culturais, históricos, filosóficos e ação. Enquanto André trilha seu caminho em busca de saber quem é, aprendemos com ele sobre todos os lugares por onde passa. É uma verdadeira viagem de autodescoberta e exploração de novos universos.

Os Arcanos do Tarot – desenhados por Fred Rubim

O background da história

O roubo de um documento importante que estava sob proteção do Vaticano, coloca em risco a vida de todos os integrantes do Tarot, os já iniciados e os que ainda não se descobriram.

Os inimigos possuem agentes fortes e impassíveis que estão determinados a destruir todos que cruzarem o seu caminho.

Não se sabe o porquê e quem está no comando deles, mas é inquestionável que existe uma grande guerra. É melhor correr….

Análise Crítica

O romance de estreia do brasileiro Alex Mandarino é espetacular. “O Caminho do Louco” é um livro bem estruturado e muito bem escrito. O universo criado por Mandarino é grande e ele soube dosar os acontecimentos deste primeiro volume para nos deixar curiosos para continuar a trilogia e ao mesmo tempo satisfeitos por termos encerrado os primeiros acontecimentos marcantes da história ao lado de André.

O livro mistura ação, fantasia, flerta com a ficção científica e, por fim, acabou me fascinando em especial pelo seu conteúdo cultural. Enquanto acompanhamos o protagonista em suas viagens e sua iniciação no Tarot, os demais personagens compartilham fatos históricos, culturais e sociais fascinantes: é simplesmente delicioso ler sobre isso! Esses diálogos são tão prazerosos de ler que nos dá a sensação de estarmos ao lado do Louco, olhando as mesmas cenas que ele e conversando com os demais Arcanos.

O livro é dividido em vários plots e focado em vários personagens. Os capítulos e trechos dedicados ao protagonista são todos escritos em primeira pessoa, onde ele nos conta desde sua vida antes de sua iniciação no Tarot e nos leva pela mão para acompanha-lo em seu trajeto. Os demais capítulos e trechos, os que considero como background da história, são escritos em terceira pessoa. São esses que trazem o tom de universo expandido e nos dá a dimensão de que existe algo muito maior acontecendo com a instituição e nos antecipa alguns possíveis acontecimentos com André.

Ponto extra positivo para o escritor que, apesar de dar bastante espaço em sua obra para os personagens de background, não nos confunde com as histórias ou neutraliza a importância de qualquer um dos arcos narrativos.

Outro ponto extra para a editora Avec que trabalhou muito bem na edição do texto e na diagramação da obra, que é linda! Todos os capítulos começam em uma nova página, sempre ilustrada. No meio da obra também conhecemos as cartas de Tarot onde estão desenhados os personagens do livro, de forma a fechar nossa imaginação de como eles podem ser, depois de termos lido a sua descrição.

Diagramação feita por Vítor Coelho

Se você procura por um livro de ação e fantasia que foge do medieval e tem a dose certa de conspiração e que te levará a conhecer sobre outras culturas e acontecimentos, esse livro definitivamente é indicado para você. O melhor: é nacional!

Nota

Ficou interessado(a)? Você encontra o livro nas lojas abaixo:

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Nome:
 O Caminho do Louco – Guerras do Tarot – Volume I
Autor: Alex Mandarino
Edição: 1ª
Editora: Avec
Ano: 2016
Páginas: 296
ISBN: 9788567901541
Sinopse: O brasileiro André Moire deixa tudo para trás para se envolver com um grupo internacional secreto que representa os arcanos do Tarot. Dispostos a elevar a consciência da humanidade e mudar o planeta, eles lançam mão de magia, ciência, arte, técnicas hacker e até mesmo parkour e videogames para enfrentar as forças da conformidade.
Conheça o Louco, o Mago, a Sacerdotisa, o Carro, o Sol, a Imperatriz, o Imperador e vários outros arcanos maiores e menores neste thriller conspiratório com toques subversivos e sobrenaturais. Com uma trama sombria e misteriosa que ocorre em locais como Rio de Janeiro, Paris, México, Amazônia, Riviera e Inglaterra, Guerras do Tarot fará você pensar e repensar no que acredita. Comece neste livro a trilhar o Caminho do Louco.

 

 

 

Papo de Colecionador 4 – A História das Histórias em Quadrinhos (Parte 2)

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Olá Cabulosos! Sejam bem-vindos a segunda parte do programa sobre A HISTÓRIA DAS HISTÓRIAS EM QUADRINHOS. Nesta parte 2, são abordadas os primórdios da histórias em quadrinhos no Brasil; além de você saber curiosidades sobre os hábitos do colecionador Fábio Ozias, convidado deste programa.

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O segundo trailer legendado de “It – A Coisa” saiu e é muito mais assustador!

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É isso mesmo! A Warner Bros acabou de liberar o segundo trailer legendado de “It – A Coisa”, um dos filmes mais esperados para o ano de 2017.

Baseado no livro gigantesco “It – A Coisa” do escritor Stephen King, o filme chega aos cinemas no feriado de 07 de setembro de 2017 e é a segunda adaptação do livro para o audiovisual já que no ano de 1990 ele foi lançado em formato de minissérie nos Estados Unidos e depois relançado em formato de filme sob o nome “It: uma obra prima do medo”. A nova adaptação será dividida em duas partes, sendo que ainda não foi anunciada a data de lançamento da parte II.

Vale ressaltar que o segundo trailer traz muitas cenas inéditas e nos coloca cara a cara com o temido Pennywise, o palhaço que assombra aos leitores de King há décadas. A Coisa não está de brincadeira e está chegando no Maine para se estabelecer, custando quantas vidas de crianças for necessário!

O vilão é interpretado pelo ator Bill Skarsgård que em entrevista ao The Wrap contou que sua caracterização para as cenas do filme fez com as crianças no set de filmagem chorassem.

Em um determinado momento eles armaram toda essa cena. Algumas crianças chegaram e elas não me viram ainda. Os pais trouxeram esses pequenos figurantes, certo? E aí eu saio como Pennywise evi a reação dessas crianças. Algumas estavam realmente intrigadas, mas algumas não conseguiam olhar para mim e outras estavam tremendo. Um garoto começou a chorar. Ele começou a chorar e o diretor gritou: ação! E quando dizem ‘ação’ entro completamente no personagem. Então algumas dessas crianças ficaram aterrorizadas e começaram a chorar no meio da cena e percebi: ‘Puta m*rda. O que estou fazendo? O que é isso? Isso é terrível!“, contou.

Você vai ter coragem de enfrentar A Coisa nos cinemas?

 

 

Assista ao primeiro trailer de Jogador nº 1

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A Comic Con se tornou referência no quesito de lançamentos de trailers de filmes e séries que estamos aguardando com ansiedade e nesse ano não foi diferente. Em meio a trailers como Thor, Liga da Justiça e Stranger Things, a Warner nos surpreendeu com o trailer de Ready Player One, ou Jogador nº 1 como chamamos por aqui.

A trama se passa em 2044, um futuro distópico onde a sociedade se refugia dos problemas na realidade virtual chamada Oasis. Quando o criador da realidade virtual morre, ele deixa um easter egg dentro da sua criação e quem o encontrar herda sua fortuna, além do próprio Oasis. Wade, interpretado por Tye Sheridan, é um dos vários jogadores que corre atrás desse prêmio.

A adaptação na direção de Steven Spielberg estava marcada para estreia no fim deste ano, mas foi adiada para 2018, ainda sem data definida.

Novo trailer legendado de Blade Runner 2049

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A tão esperada sequência de Blade Runner (1982) ganhou mais um trailer oficial e já legendado. Blade Runner 2049 conta com Ryan Gosling, Harrison FordRobin Wright no elenco.

A história se passa muitos anos após os acontecimentos do primeiro filme e o foco está no policial K (Gosling) que descobre alguns segredos sobre o passado e vai em busca do paradeiro de Rick Deckard (Ford), antigo Blade Runner que está desaparecido há três décadas.

Ridley Scott, o diretor do clássico, participa como produtor executivo e a direção fica por conta de  Denis Villeneuve, que contou que Scott sugeriu unir ficção científica e a arte de filme noir para trazer uma nova visão da condição humana. O longa é uma continuação do primeiro.

Blade Runner foi baseado na obra  “O Caçador de Androides” de Phillip K. Dick, um clássico da literatura de ficção científica.

Leia a coluna A atualidade política da ficção científica de Philip K. Dick

O filme estreia em 05 de outubro de 2017.