[Resenha] Apátrida da Ana Paula Bergamasco

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Apátrida, capa

Uma pequena vila na Polônia. Uma menina repleta de vida. Um encontro. Vidas Ceifadas. Sonhos Destruídos. Infâncias Roubadas. As recordações da personagem Irena amarram o leitor na história do século XX.

O palco da narrativa é a conturbada Europa pós Primeira Guerra Mundial, culminando com a eclosão da Segunda Grande Guerra e a destruição que ela provocou na vida de milhões de pessoas.

A narradora conduz a exposição em primeira pessoa, e remete o leitor a enxergar, através de seus olhos, o cotidiano a que ficou submetida.

Existem livros que nos fazem sentir felizes, com um sorriso estampado no rosto e seu término é sinal de tristeza, pois chegara ao fim aquela leitura gostosa e prazerosa que muitas vezes nos fez pensar e rir-se sozinho(a) das situações ali apresentadas, mas há aqueles que nos trazem angústia a cada virar de página, quando o fechamos nos perdemos a refletir sobre o que acabamos de ler e durante nosso dia não são às vezes em que nos surpreendemos pensando naquilo que ficaram impresso naquelas inocentes páginas. Estas são as minhas primeiras impressões sobre Apátrida de Ana Paula Bergamasco da editora Todas as falas. Um livro que me chegou através do booktour do blog da Nanie’s World.

Sempre gostei de estudar a 2ª Guerra Mundial, tenho várias fontes de pesquisa, como livros, revistas e dvds (documentários), contudo não estava preparado para o que iria encontrar nas páginas deste livro, por isso faço questão de frisar sobre o “discreto” acervo que possuo, para evidenciar o quão esse livro fora prazeroso e torturante. Em momento algum estes adjetivos devem ser vistos como ofensas a obra. Não! O livro conseguiu mostrar-me as conseqüências da invasão nazista a Polônia de um modo que fariam muitos documentários parecerem “comédia romântica”. A narrativa em forma de relato ajuda e muito a garantir a veracidade dos fatos. Irena não nos conta o que aconteceu ela relata e isso muda tudo, pois lembra muito “O diário de Anne Frank”, mesmo que a obra não siga o gênero é difícil saber se a autora escolhera o estilo propositalmente ou ocorrera ao acaso, pouco importa, ver as angústias e tragédias pela qual a protagonista passa sem a distante e fria imparcialidade do autor/narrador é o trunfo do livro.

Chamo a atenção para algo que poderia passar desapercebido pelos leitores mais velozes. Sabemos que Irena sobrevivera ao holocausto, isto não é spoiler, já que logo no início sabemos que ela está bem velhinha enquanto profere uma palestra como “sobrevivente ” ao horror que foram os Campos de Concentração. Ana Paula vai intercalando as lembranças atuais de Irena com as lembranças da infância, adolescência e vida adulta. No início as “pontes” são esporádicas e discretas, ao decorrer começam a alternar entre um capítulo e outro: ora estamos no Brasil, ora no Campo de Concentração e esses links são perfeitos e fazem a narrativa ganhar significado, pois em muitos casos um capítulo fecha com um determinado personagem sumido as “vistas” da protagonista e depois a mesma tendo notícias dele anos depois em solo pátrio.

Comparo este livro a O menino do pijama listrado do John Boyne (livro não li, mas ouvi um episódio fantástico do podcast Grifo Nosso onde eles comentam sobre a obra, clique aqui para ouvir o episódio); percebemos que se em O menino do pijama listrado temos a tentativa de mostrar os horrores do nazismo através dos olhos de uma criança e, por isso mesmo, o autor é acusado de dar uma visão parcial e quase ingênua do regime de Hilter, Apátrida consegue expor o ódio sem motivo ou justificativa, a carnificina quase insana e o sofrimento que vai além de qualquer fotografia, documentário, exposição ou texto sobre o mesmo. Em dado momento, fui pego com uma cena que me fez fechar o livro e respirar fundo: estava lendo na sala de aula enquanto meus alunos faziam alguma atividade. A autora começou a descrever uma fase na vida de Irena quando ela ainda morava em Lublin, na Polônia. Uma alemã que morava no mesmo prédio que ela sentira um cheiro desagradável vindo do apartamento de cima, chamara a polícia, a SS, e os mesmos descobriram que uma senhora que morava sozinha falecera e seu corpo estava apodrecendo no local, iniciaram uma busca pelo local e descobriram que a falecida abrigava uma família de judeus, os policiais atiraram-nos pela janela do apartamento sem dó nem piedade. Fechei o livro imediatamente, deixei que o ar entrasse pelos meus pulmões e percebi que meus olhos estavam cheios de água…

Outro ponto que chamava a atenção de todos que me viam lendo o livro é sua belíssima capa, indagavam-me: “Que capa bonita, esse livro é bom?” Emudecia sem saber o que responder bom é um adjetivo que não combina com Apátrida, não existe bondade para relatar o que há em suas páginas. Fico muito feliz por ter participado deste booktour, não é rasgação de senda, não, pois Nanie poderia ter escolhido muitos livros, mas pois Apátrida para que nós lessemos e compartilhássemos com nossos amigos/parceiros bloggueiros. É bom saber que muito leram e lerão esta obra, pois é necessário falar mais sobre o holocausto e o regime nazista. Em tempos de “esquecimento”, onde há pessoas que querem apagar da memória coletiva os horrores praticados na 2ª Guerra Mundial, fico feliz em saber que existe um livro que deixará sua memória viva, não podemos ter pena de estigmatizar o povo alemão ao rememorar o regime de Adolf Hilter, pois não é pelo povo alemão que lembramos, mas sim por aqueles que morreram de formas desumanas e inenarráveis, para que hoje e sempre possamos olhar e ver os terríveis erros que cometemos para evitar que um segundo ou terceiro ou quarto holocausto possa acontecer. Que depositar nossas esperanças em uma única pessoa pode ser arriscado se não sumimos a responsabilidade pelo que fazemos.

Que as resenhas feitas sejam mais do que motivos para se debruçar sobre as páginas de Apátrida.

Obrigado Nanie’s!

Nota:

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