[Resenha] Quando o Mal Tem um Nome – Glau Kemp

Capa do livro. Um fundo escuro com alguns traços brancos criando formas geométricas e simbolos de estrelas e luas. Em primeiro plano uma moça de vestido, de pé porém demonstrando estar em transe. Sua imagem é totalmente em tom verde. No centro o título do livro.
Capa do livro. Um fundo escuro com alguns traços brancos criando formas geométricas e simbolos de estrelas e luas. Em primeiro plano uma moça de vestido, de pé porém demonstrando estar em transe. Sua imagem é totalmente em tom verde. No centro o título do livro.

O terror não começa com o revelar do monstro. Ele se inicia quando o leitor se identifica com o cenário em que a vítima está inserida. Ver uma família com os mesmos costumes, com os mesmos hábitos e morando em um local parecido com o seu provoca as seguintes questões: será que cometi os mesmos erros que essa personagem? Se sim, também mereço ser punida da mesma forma que ela? A obra Quando o Mal Tem um Nome da autora Glau Kemp cria com muito esmero um contexto narrativo para o aparecimento de um mal muito comum na cultura brasileira.

A vida de muitas brasileiras

A premissa do livro é simples: Marta está grávida e deseja que o filho seja uma menina para ter uma companhia. Com este ponto inicial a autora cria uma protagonista interessante que é o reflexo da realidade de muitas brasileiras. A narrativa se desenrola em uma cidade do interior de São Paulo nos anos 70. A personagem principal tem como base moral o catolicismo e esta religião permeia toda a obra de forma orgânica. Ela possui um marido, dois filhos, já teve uma profissão e projeta no próximo nascimento toda a fonte de felicidade. Esse cenário aliado a uma linguagem simples e fluida gera identificação no leitor.

A vontade que a personagem tem em ter a filha, a Maria Clara, é transmitida gerando empatia. Ao ler o livro Quando o Mal Tem um Nome torci para Marta quando a vi pedir com fé para Nossa Senhora Aparecida uma menina. A realização ou não deste desejo é o ponto alto da história e traz consigo o tema principal que é a punição.

“Toda vez que Marta percebia que o forro de sua alma era podre e grosso, chorava. Sua cobertura era delicada e cuidadosamente organizada, mas bastasse um ponto fora do lugar e a rede estaria em perigo de se desfazer”. 

Um querer que atrai

O desejo obsessivo faz a dona de casa se movimentar, agir. Um desejar é o polo onde a autora mostra todo o talento na construção de cenas, nos fluxos de consciência e no conduzir do ritmo da narrativa. Com a premissa o leitor é fisgado, avança com velocidade e se depara com o primeiro desfecho. Deve-se elogiar a ousadia de Glau Kemp que não segue somente uma personagem e um caminho na história. Porém, o que foi tão bem construído na primeira parte do livro não se mantém na parte seguinte.

O começo dos problemas

Na primeira parte, há elementos introduzidos que geram um peso dramático e não são retomados. Entretanto, a história de Marta cativa e esses erros não prejudicam a leitura. No início da obra há impacto em cada decisão tomada pela protagonista e cada escolha deixa rastros por todo o livro. Na segunda parte, também há cenas fortes que impactam o leitor, mas não deixam rastros. Algo fora do comum acontece com dois personagens em um dia e no virar das páginas não há rastros ou mudanças de comportamento em relação ao ocorrido. É possível notar a falta dessa evolução nos personagens secundários cheios de personalidade. Vários acontecimentos chocantes pedem mudança, um novo comportamento, porém, nada muda.

Há um excelente plot twist na trama. Neste momento fiquei sem fôlego. Logo depois é comum refazer os passos para ver as pistas, para ver os detalhes que estavam tão evidentes mas passaram desapercebidos porque o envolvimento com o personagem era enorme. Uma das grandes viradas do livro não tem indícios de que ela iria acontecer. Um início de livro excelente que contrasta com um miolo com falhas. Agora fica a pergunta:

Um bom final é capaz de fazer o leitor pouco se importar com os erros?

Senti pressa na terceira e última parte. Um novo elemento com uma grande carga dramática é introduzido na história. Em vez de detalhes e um conduzir mais vagaroso do leitor neste novo cenário, há uma aceleração que gera confusão. A última parte tem potencial de ser um livro novo ou a mais longa das três partes. Além disso, o final atinge uma escala exageradamente alta, não combinando com todo o tom do livro. Também deve-se pontuar alguns erros de digitação.

Um núcleo forte

O cenário e a linguagem geram identificação, trata-se de uma leitura rápida, a autora sabe impactar o leitor e trabalha bem com elementos presentes na cultura brasileira. Recomendo a leitura da obra mesmo com os problemas da segunda e terceira parte. Leia e descubra o que a obsessão de Marta gerou e quem e o porquê será punido por ela.

Nota

Quatro selos cabulosos. A nota mais alta são 5 selos cabulosos.
Quatro selos cabulosos. A nota mais alta são 5 selos cabulosos.

 

 

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Ficha técnica

Título: Quando o Mal Tem um Nome
Autora: Glau Kemp
Editora: Amazon
Ano: 2017
Páginas: 204
ISBN: B077NV4K3B
Sinopse: “Sinto medo. O tipo de medo que persegue até a presença de outras pessoas. Segue até a luz e entra nas cobertas. Não está debaixo da cama ou dentro armário. Está em minha pele e tem um nome. Não pergunte. Não descubra. Nunca saiba o nome do seu medo, ou irá chamá-lo… Seus lábios podem estar selados, mas sua mente repetirá: Donavan… Donavan… Donavan.”

Na Aparecida dos anos 70, uma cidade erguida no centro de um milagre, conhecemos a história de Marta e sua filha Clara. De sua terra cultivada por fé a malignidade cresce no coração de uma mãe devota. As orações que a padroeira não atende são feitas agora para eles: anjos caídos. Ela não deveria saber o nome do demônio que atendeu sua prece, e a abominação despertada é tão grande que todos vão pagar pelo seu pecado. O mal só precisava que alguém o chamasse pelo nome e agora está entre nós.

“Faça uma oração antes de dormir e deixe a luz acesa. Se vir a fé em seus olhos, talvez vá embora. Mas ele virá”

— Por que um demônio iria querer vir até à casa de Deus, minha jovem?
— Por que o senhor iria até a casa do demônio, padre?
— Para levar a luz até ele.
— O demônio também tem seus planos.