Fala galera,
hoje a coluna Tirando da Letra vai falar de algo muito comum no nosso cotidiano: os erros. Sabemos que tem gente por aí que se orgulha de seu português perfeito, de sua fluência em outro idioma, de seu volume de leitura… mas nada é mais importante do que se comunicar. Fazer bem essas coisas não torna ninguém melhor que ninguém e todo esse conhecimento certamente não substitui o lirismo da vida.
Trago hoje duas músicas que gosto muito e discutem o tema de maneiras diversas, mas consistentes.
Tirando da letra
A primeira música que eu quero trazer é “Zazulejo” do Teatro Mágico. Nessa letra, de seu primeiro e melhor disco, (ainda que eu goste muito de todos os outros) Anitelli traz, já em sua abertura, uma pessoa simples falando “tudo do jeito dela” até entrar na música composta toda por “erros” de português, de pronúncia, de significado, superstições “absurdas”; vale tudo contanto que esteja errado de alguma maneira… e isso é lindo! Está completamente certo e envia uma mensagem clara sobre a posição do autor.
Caso os versos:
“Pigilógico, tauba, cera lítica, sucritcho,
graxite, vrido, zaluzejo”
Causem estranheza ao ouvinte o autor explica
“Mas quando alguém te disser ta errado ou errada
Que não vai S na cebola e não vai S em feliz
Que o X pode ter som de Z e o CH pode ter som de X”
E emenda:
“Acredito que errado é aquele que fala correto e não vive o que diz”
A outra letra, na verdade é uma poesia do poeta Zé da Luz declamada por Lirinha em grande parte dos shows do Cordel do Fogo Encantado e incluída em versão Ao Vivo no primeiro disco da banda. Antes de declamar o poema, Lirinha explica as circunstâncias de sua criação que foi mais ou menos assim…
“O poeta Zé da Luz, do início do século, escreveu uma poesia porque disseram pra ele que pra falar de amor é necessário um português correto e tal… Aí Zé da Luz escreveu uma poesia chamada “Ai se sêsse” que diz assim…”
“Se um dia nois se gostasse
Se um dia nois se queresse
Se nois dois se empareasse
Se juntim nois dois vivesse
Se juntim nois dois morasse
Se juntim nois dois drumisse
Se juntim nois dois morresse
Se pro céu nois assubisse
Mas porém acontecesse de São Pedro não abrisse
a porta do céu e fosse te dizer qualquer tulice
E se eu me arriminasse
E tu cum eu insistisse pra que eu me arresolvesse
E a minha faca puxasse
E o bucho do céu furasse
Tarvês que nois dois ficasse
Tarvês que nois dois caisse
E o céu furado arriasse e as virgi toda fugisse”
Fui a diversos shows de ambas as bandas. Uma vez vi as duas na mesma noite sob uma lona de circo em uma cidade próxima e antes que alguém pergunte… quando tocaram “Chover”, choveu. Ambas as músicas são experiências catárticas durante a apresentação. Se O Teatro Mágico contava com grande participação da platéia dividindo a platéia nesse momento e pedindo a participação, o caso do Cordel era muito mais espontâneo e, frequentemente, esperando o show começar, as pessoas recitavam continuamente o poema de Zé da Luz até a banda entrar no palco.
A mim, pessoalmente, o approach do Cordel para a questão me é mais caro. Era emocionante cada vez que via isso ocorrendo no palco e decepcionante quando por acaso “Ai se sesse” estava fora do setlist. “Zazulejo”, apesar de ser uma das minhas músicas favoritas do Teatro, nunca teve o mesmo impacto em mim sendo menos visceral. Lirinha é uma das figuras mais carismáticas que eu já vi sobre um palco.
Por hoje era isso que eu queria apresentar e espero que gostem das duas músicas/letras. Será que alguém conhece alguma outra música abordando o mesmo tema?
Abraços e não saiam do tom,
Rodrigo Fernandes