Ouvir o Podcast Serial tem sido uma experiência incrível e que me fez refletir sobre vários assuntos. Para quem não conhece, Serial é um podcast estadunidense onde a repórter Sarah Koenig narra sua investigação do caso do assassinato de Hae Min Lee, uma estudante morta em Baltimore em 1999, e de como seu ex-namorado, Adnan Syed, foi condenado à prisão perpétua pelo crime.
O grande problema é que a condenação é cheia de polêmicas: se baseia nos testemunhos de um cara de confiabilidade duvidosa, o amigo de Adnan, Jay, e em rastreamentos de ligações telefônicas, algo impreciso na época. São tantos, mas tantos furos no caso, que a dúvida sobre a culpa de Adnan é grande.
Mas antes de falar do caso, gostaria de falar sobre Serial. Milhares de pessoas que nem sabiam o que é um podcast passaram a saber. Ao redor do mundo, a audiência de Serial bateu recordes e colocou a mídia em foco na grande imprensa. A pergunta é: qual o efeito real disso para a mídia podcast após o fim de Serial? Lendo as discussões sobre o programa no Reddit, fica claro que muita gente que nem sabia o que é podcast está esperando algo que não deveriam do season finale de Serial: uma resolução definitiva.
É muito, mais muito difícil que isso aconteça. Se a maioria dos novos ouvintes estiverem realmente nessa expectativa, vão quebrar a cara. Serial não é sobre resolver o caso, apresentar evidência ou provas reveladoras, nem nada disso. Pode ser que aconteça? Pode. Mas é muito difícil. Para mim o grande atrativo do programa é apresentar como o sistema de justiça pode ser falho, se baseando em provas muito fracas para colocar alguém na cadeia, porque do contrário a sociedade ficaria sem uma solução para o crime e se instauraria um sentimento de insatisfação. É necessário um bode expiatório. É esse o caso de Adnan? Sinceramente, não sei, mas foi assim que a procuradoria agiu em relação a ele.
Trata-se de pegar uma boa testemunha e parcas evidências, montar um caso bonito, emocionar e convencer um juri, e tirar um problema do caminho. Não é justiça, é resolver um problema, assumindo o risco de faze-lo da forma errada. Uma das falas que mais me marcou em Serial foi um policial que Sarah entrevistou, ele disse mais ou menos isso: “Não se trata de procurar a verdade, mas de montar um bom caso.”
Isso foi dito no contexto de que certas evidências e testemunhas que davam margem à dúvida eram sumariamente descartados pela polícia, porque não ajudavam o caso contra Adnan. Isso me leva a pensar, será que é assim só nos EUA? Óbvio que não. A sede de justiça da sociedade e o desespero político de deixar um caso desse aberto por muito tempo criam bodes expiatórios e destroem vidas em todo lugar. De novo, é o caso de Adnan? Não sei. Mas não é esse o ponto.
Voltando ao grande público, os novos ouvintes do podcast, será que ao receberem o final terão a sensibilidade de entender as nuances do programas, ou ficarão desapontados e irritados por não terem uma conclusão a la Agatha Christie para o caso? Se sentirão instigados a ouvir a segunda temporada, que conterá outra história, e mesmo a explorar novos podcasts, ou abandonarão a mídia por completo? A resposta a isso teremos em algum tempo. Fato é que Serial colocou a palavra podcast em evidência como nunca, mas no final nas contas é possível que não mude muita coisa para os produtores de conteúdo.
Uma última reflexão, na verdade um sentimento confuso que venho nutrindo por minha fascinação em Serial: Adnan estava em paz na prisão, ele conseguiu retomar um certo grau de normalidade na vida lá dentro, e agora está sendo escrutinado e acusado e julgado pelo mundo inteiro. Sua família e amigos, todos os envolvidos no caso, viram o passado remexido e a ferida cutucada, bem fundo. Devo me sentir culpado por gostar tanto dessa investigação? Não sei. Sei que certas coisas que Adnan disse no episódio 11 me fizeram pensar.
Essa quinta-feira (18/12), teremos o episódio final da primeira temporada de Serial e do caso Hae Min. Vamos ver o que acontece, eu só espero que termine sem ter machucado ninguém e que as pessoas ouçam o fim da história absorvendo mais do que apenas a trama da mesma, e tendo consciência de que não se trata de uma novela, mas da vida real de muita gente.