Autora: Tatiana MaretoEditora: GrafbandOrigem: BrasileiraAno: 2010Edição: 1ªNúmero de páginas: 404Sinopse: Na noite que Heather recebeu a primeira visita de Mills, sua vida modificou-se por completo, e seus olhos abriram-se para um mundo novo. A jovem cientista viu-se sugada por um turbilhão de acontecimentos que a fez encarar novas perspectivas e desafiar suas crenças. Enquanto tentava aprender a lidar com seu verdadeiro eu, Heather descobriu-se em outro ser, o bem humorado e antigo vampiro, Henry.
Análise:
“Eram século de guerra e desolação. Os céus se tingiam de vermelho a cada crepúsculo. A noite se abateu sobre Esplendora desde então; desde o início da guerra havia a luz e a escuridão na cidade dos Anjos. Havia sangue derramado pelos ladrilhos impecáveis e o branco estava manchado para sempre. Eram séculos de guerra, e nunca poderia haver um vencedor.”
—Pág. 7.
Saudações, leitores! Cada vez mais me surpreendo com os escritores compatriotas e com certeza a grande participação deles nas redes sociais é a principal porta pela qual tenho feito muitos contatos e dado o primeiro passo para apreciar trabalhos de qualidade. O interessante é perceber também o quanto os textos seguem estilos variados e me considero um leitor de sorte, pois a maioria dos escritores nacionais que tenho conhecido conseguiu me atrair pelas singularidades em suas formas de narrar e o modo como conseguiram me fazer passar horas encantado por mundos que em nada ficam devendo para os cenários estrangeiros mais cultuados da literatura.
A minha mais recente aventura foi pelas páginas de “O Segredo de Esplendora – Livro I: A Origem” da escritora, parceira do blog, Tatiana Mareto. A Tatiana foi extremamente simpática quando a contatei para requisitar a parceria e durante o meu processo de leitura mantive a conversa com ela e posso afirmar que a possibilidade de ler um livro e dialogar com a autora continua me proporcionando uma emoção especial, um sentimento que só que ama livros pode compreender. Atualmente sempre que leio livros nacionais busco manter a comunicação com os autores, mas como nenhum livro é um mergulho duas vezes no mesmo rio, pois o rio muda e mesmo quando ele não muda, nós mudamos, portanto a nossa experiência com um livro nunca será a mesma, a magia de conversar com alguém que é arquiteto de um mundo é como o poder que as estrelas exercem em nossa imaginação, pois sempre a humanidade pensará: “O que há além?”
A obra da Tatiana começa a partir de uma ideia já conhecida dos leitores: uma guerra entre seres sobrenaturais. Esta guerra é um conflito secular, cujo motivo principal parece ser a ganância pelo poder e cujas vítimas, diretas e indiretas, são incontáveis. Nesse ponto vemos o quanto os seres sobrenaturais já são uma metáfora para as mais variadas possibilidades abrigadas no espírito do ser humano e ao longo do livro a autora se preocupa mais em desenvolver esses conflitos morais e sentimentais, ou seja, problemas que poderiam ser enfrentados por qualquer um de nós, do que ficar tecendo uma narração com foco no fato do enredo acompanhar os acontecimentos com criaturas inumanas. Então, vocês podem se perguntar: Onde está a originalidade de um livro que fala sobre uma guerra secular entre criaturas sobrenaturais? O grande ponto alto deste livro está justamente em que a guerra é o menos importante para a história, não é que ela não afete o desenvolvimento do livro, mas é somente um canal pelo qual as questões verdadeiramente importantes passam e obviamente para tudo é necessário um contexto.
O livro começa com uma brevíssima narração de um casal formado por um bruxo e uma anjo que enfrentam o dilema de quererem viver um amor inapropriado para os seus povos e por estarem no meio de uma guerra sofrem ainda mais. O amor trágico é um elemento que, desde que seja bem trabalhado, conquista muitos leitores, afinal o ser humano é provavelmente a única criatura que, mesmo em situações que podem lhe trazer grande perigo, insiste em saciar os seus desejos que o consomem como um fogo transforma a lenha em brasa. Por isso, acredito que o trágico exerce tanto fascínio sobre nós. Quanto o escritor consegue atrair o leitor e envolve-lo com as suas palavras, a tragédia e o que é tido como impossível nos despertam fortes sentimentos, seja ansiedade, medo, empatia, raiva, amor e a Tatiana obteve êxito nesse quesito. Seja você um leitor que aprecia uma história romântica ou uma trama de ação, com certeza ficará satisfeito com a leitura.
Depois da cena inicial, o palco do livro muda para a cidade de Graceland, um lugar comum se não fosse pela presença de dois vampiros que residem em uma velha pousada nos arredores. Um destes vampiros é Henry Austin, uma criatura secular e com um senso de humanidade forte, apesar de ter perdido parte da noção de como os humanos conduzem as suas vidas rotineiramente, e dono de uma veia humorística incrível que o torna um personagem muito carismático. O outro vampiro é Stuart, um ser das trevas que passou a acompanhar Henry na não-vida para evitar a solidão de ser um imortal com a necessidade constante de quebrar o tédio. Enquanto que Stuart é uma criatura que pode se relacionar perfeitamente com humanos como um igual, Stuart inicialmente prefere se manter em uma relação estritamente “alimentar” e chega a ser em alguns momentos bem mal humorado devido às piadas de Henry, mas no decorrer do livro acaba se tornando mais simpático e muda algumas de suas perspectivas. Para matar o tempo os vampiros costumam passear pela cidade e por um acaso acabam encontrando o jovem Wesley, um adolescente socialmente desajustado, que a beira da morte é salvo por Henry, mas para isso é necessário que se torne também um vampiro. Isso é justamente o estopim que fará destinos se cruzarem e seres poderosos tremerem de medo pelo que pode estar por vir.
A história, apesar de ter muitos pontos a partir dos quais flui, é dotado de dois pilares principais: Henry, o vampiro, e Heather, uma híbrida de anjo e bruxo. Heather, por motivos e meios que não explicarei aqui, desconhece a sua real condição e por ter sido criada por humanos que desconheciam os bastidores de fantasia que cercam o nosso mundo, crê que o mundo é uma série de fatos que podem ser quantificados e classificados por uma linguagem cientifica. Achei muito intrigante a ideia de um ser tão incomum e supostamente poderoso que além de não saber de sua real ascendência, sequer acredita no que ela é. Esse conflito de crenças é estimulante, pois quantas vezes ao longo de nossas vidas não as mudamos? Somos seres de contradições, pois podemos dormir acreditando em uma coisa e acordar pensando o oposto do que fomos. Achei maravilhoso como o fantástico é usado para debater sobre questões essenciais à nossa existência, pois seja qual for o nosso alinhamento, temos necessidade de acreditar em algo. Até mesmo a ciência precisa partir da certeza de algo, ou seja, todos possuímos alguma fé, todos acreditamos na certeza de algo e é impossível viver sem adotar uma bússola que guie nossas ações, mas como decidir o que fazer quando não temos certeza do alcance que nossas escolhas possuem? Esse é um dilema enfrentado por Heather, um fardo de peso desconhecido, mas que, de acordo com sinais, é colossal.
Como em toda boa tragédia as forças que operam contra os protagonistas pelos quais torcemos são inúmeras e não medem esforços ou consequências para que as suas vontades prevaleçam, com certeza vocês irão odiar alguns deles, enquanto que outros talvez sejam até perdoados por não passarem de meras peças em um jogo de poder. O desfecho do livro é perfeito e consegue terminar em um ponto que nos deixa numa expectativa tão grande que temos vontade de encomendar logo o Livro II.
O mundo criado por Tatiana é bastante amplo e nos deixa pensando nas possibilidades de exploração deste lugar em que vivem não somente anjos e bruxos, mas elfos, druidas, ogros, vampiros e tantas outras criaturas. Nesse livro poucas raças são desenvolvidas, mas conseguimos vislumbrar uma parcela significativa de fantasia para querermos ler os demais livros da saga de Esplendora, a cidade dos anjos.
O exemplar que li foi de uma edição independente e notei alguns erros, os únicos na obra. Os erros foram: a revisão ficou um pouco aquém do que se espera de um trabalho profissional e a diagramação ficou ruim. A questão da diagramação, para ser mais preciso, foi que as margens do texto oscilavam drasticamente às vezes e as letras ficaram muito próximas do meio do livro e frenquentemente tive de abrir o livro em 180º graus para conseguir ler até os cantos. Sim, eu sou um leitor que tem extremo cuidado com os meus livros e não gosto quando tenho de abri-los acima de 35º, pois eles acabam ficando com as capas tortas e para consertar tenho de colocar um livro pesado em cima. A única coisa em que o livro pecou foi na parte física, mas isso foi remediado, pois recentemente o livro foi relançado pela editora Modo e os erros foram corrigidos.
Parabéns à Tatiana pelo livro! Recomendo à leitura todos! Preciso dizer que estou ansioso para ler os próximos volumes? Aventurem-se também ao lado de Heather, Henry e muitos outros personagens!
A obra vai ficar com quatro selos cabulosos!
NOTA: