Se gostou de The Batman vai gostar de Batman: Terra Um

Montagem, à esquerda recorte de uma cena do filme que mostra o Batman do ombro até a cabeça em um fundo com o céu avermelhado. À direita a capa de uma revista com a ilustração do jovem Bruce Wayne com casaco escuro, expressão de desapontamento, debaixo de uma chuva, logo atras um homem com casaco preto e um guarda-chuva. No fundo o rosto do Batman. No centro um raio amarelo dividindo a vitrine. Quase no topo à direita, uma faixa branca com o texto: Coluna - Se gostou de The Batman vai gostar de Batman: Terra Um
Montagem, à esquerda recorte de uma cena do filme que mostra o Batman do ombro até a cabeça em um fundo com o céu avermelhado. À direita a capa de uma revista com a ilustração do jovem Bruce Wayne com casaco escuro, expressão de desapontamento, debaixo de uma chuva, logo atras um homem com casaco preto e um guarda-chuva. No fundo o rosto do Batman. No centro um raio amarelo dividindo a vitrine. Quase no topo à direita, uma faixa branca com o texto: Coluna - Se gostou de The Batman vai gostar de Batman: Terra Um

Sou fã dos trabalhos do David Fincher. Terminei de assistir The Batman do Matt Reeves, notei as similaridades com Zodíaco e Se7en – Os Sete Crimes Capitais e perguntei-me se existia uma história em quadrinhos usada como referência. Bastou algumas pesquisas para encontrar uma HQ de três volumes chamada Batman: Terra Um. Para quem quiser ler a comparação entre as obras, deixo um aviso: há spoilers das duas neste texto

Gotham é sempre o melhor personagem

A semelhança mais evidente está na Gotham dos quadrinhos e a Gotham da tela de cinema. Ambas são movidas pela corrupção e controladas por criminosos. No filme de Matt Reeves o líder da máfia é Carmine Falcone.

O personagem interpretado por John Turturro é discreto, passa longe de estereótipos e os óculos escuros são um pequeno detalhe que o distingue dos outros. Ele comanda a cidade de forma oculta e não precisa de cenas cheias de violência para mostrar poder. Quem possui envolvimento com a criminalidade em Gotham sabe o controle que Falcone possui nas mãos. Ao compará-lo com a liderança mafiosa das HQs, o contraste é evidente.

Surpreendido pelo bizarro

Pinguim é o prefeito de Gotham em Batman: Terra Um. E não é uma versão mais sóbria do personagem. Ele usa cartola, tem sempre um guarda chuva em mãos e gosta muito de pássaros. Em um primeiro momento achei o mafioso contido mais verossímil. Logo depois pensei no atual cenário brasileiro e concluí que é mais verossímil uma figura caricata, claramente atrelada a crimes, ocupando o posto público de maior destaque em uma cidade.

A necessidade da luz

As duas Gotham precisam de um símbolo de esperança e não só uma alternativa violenta e mascarada. Tanto o filme como a HQ trabalham bem esta questão na figura das prefeitas. O filme é uma narrativa mais curta e nos poucos momentos de tela de Bella Reál, ela apela ao senso de responsabilidade de Bruce Wayne.

Nos volumes 1 e 2 da HQ é mostrado que a prefeita Jessica Dent (irmã de Harvey Dent) possui uma relação mais emocional com Wayne. Os dois cresceram juntos e essa proximidade faz a personagem tentar de forma emotiva informar a necessidade de um símbolo de esperança para a cidade.

Mãe e pai do Morcego

Tanto no filme como também na HQ os pais do jovem Bruce Wayne não são só um gatilho para um trauma eterno. O pai nas duas obras quis ser prefeito. A campanha política, que costuma ser um revelar e ocultar informações enquanto os candidatos recorrem a qualquer tipo de recurso para a vitória, é mais bem trabalhada no filme. Entretanto, o problema psiquiátrico de Martha Wayne ganha destaque e se relaciona de maneira profunda com o garoto que se transforma em um combatente do crime.

Se o Thomas do filme e todo passado de Martha e os Arkham das HQs estivessem em uma mesma história, seria excelente. A obra cinematográfica toca levemente em Martha e na família dela e nota-se a referência a Batman: Terra Um. Tomara que haja um próximo filme onde o passado da família materna de Bruce seja mostrado em detalhes.

Os secundários próximos ao herói

Impossível negar a boa química entre Gordon e o Batman na tela de cinema na última adaptação da criação de Bob Kane e Bill Finger. Durante o filme imaginei como eles construíram a relação de confiança. Graças a atuação de Jeffrey Wright, e algumas cenas bem encaixadas, pude notar em Jim Gordon um policial sem saber lidar direito com um assassino serial louco e fantasiado e um senso de dever intocável. Queria um pouco mais da vida do policial longe da delegacia, nem que fosse o mínimo. Não dá para ter tudo em um filme só.

Na HQ o Gordon está iniciando a relação com o Batman, mas é um personagem que já vi em muitas outras histórias. Trata-se daquele policial cansado, nervoso, pai solteiro apegado à filha e que conhece como ninguém as regras das ruas. Como parceiro, o policial irritadiço e determinado, tem um personagem esquecível. Harvey Bullock é um amontoado de clichês que surge como uma crítica a programas policiais sensacionalistas, e nada além disso.

Os dois Alfreds não assumem a figura de mordomo e são tutores de personalidades frias. Em ambos noto uma história pregressa mais militarizada. Há uma diferença crucial entre os dois. A figura paterna da HQ é atuante, não permanece só no apoio, questiona o modus operandi do Batman e é uma peça fundamental na trama. No filme há menos espaço, porém, gostei da relação mais emotiva com o Bruce e com toda a família Wayne.

A grande diferença

Em The Batman o herói divide a tela com o assassino serial apelidado de Charada. Os dois personagens possuem uma boa construção narrativa e o roteiro é tão coeso que existe uma conexão entre eles sem parecer um artifício forçado.

Ainda falando sobre o vilão, o visual dele choca e é algo novo. O diretor entrega uma nova visão ao mesmo tempo que mantém a essência do personagem (alguém que deseja desesperadamente chamar a atenção e possui uma forte ligação com charadas). Qual a origem deste novo conceito? É na obra Batman: Terra Um?

O Charada na HQ é o pior defeito da obra. Trata-se de mais um vilão que quer o caos pelo caos sem nenhum propósito profundo. Há nele muitas ideias utilizadas no filme: usar charadas em jogos de tortura com pessoas aprisionadas, atacar indivíduos envolvidos em corrupção e incriminar a família Wayne. Entretanto, tudo é pouco aprofundado e sem uma motivação forte do vilão.

O Charada da Terra Um ataca os corruptos mas também outras pessoas e atinge a elite corrompida ao mesmo tempo que não tem nenhuma noção distorcida de justiça como o Charada no filme do Reeves. Além disso, o incriminar a família Wayne não tem nenhuma justificativa. Nem no visual há um mero traço de criatividade.

Recomendação

Quando terminei de ler Terra Um senti que estava diante de um material que não só complementou como também me fez pensar a respeito de The Batman. É interessante identificar como vários elementos da HQ serviram de base para a construção do filme. E outros tiveram mais relação com outros quadrinhos (Mulher Gato). Se não assistiu ao filme assista e leia a HQ. Se já leu, assista o filme porque você não vai se arrepender.