[Resenha] Lua no Céu de Cabul – Nadia Hashimi

0
Capa do livro. A protagonista está sentada num gramado, sua vestimenta que le cobre a cabeça é vermelha. Ela está voltada para uma pequena cerca de pedra, e à longa distancia uma cidade, que compõem o fundo da capa junto a um céu noturno azul escuro e uma lua bem clara. Em primeiro plano o título do livro. Na base um retangulo florido verde e azul, no centro do retângulo uma faixa marrom com o nome da autora.
Capa do livro. A protagonista está sentada num gramado, sua vestimenta que le cobre a cabeça é vermelha. Ela está voltada para uma pequena cerca de pedra, e à longa distancia uma cidade, que compõem o fundo da capa junto a um céu noturno azul escuro e uma lua bem clara. Em primeiro plano o título do livro. Na base um retangulo florido verde e azul, no centro do retângulo uma faixa marrom com o nome da autora.

Lua no céu de Cabul, da autora estadunidense Nadia Hashimi, foi publicado no Brasil pela editora Arqueiro e tradução de Livia de Almeida, conta a história de Fereiba, mulher afegã, que vê seu mundo desmoronar quando o Talibã assume o poder. Após o assassinato do marido pelo regime fundamentalista, Fereiba vê como única opção de sobrevivência fugir de Cabul levando seus três filhos: Salim, seu filho adolescente, Samira, que parou de falar desde o dia em que seu pai foi levado pelo regime e Aziz, um bebê com alguns meses de vida.

Utilizando de documentos falsos, recursos limitados e contando com a bondade de estranhos, a família parte com a esperança de chegar à casa da irmã de Fereiba, na Inglaterra. Sua jornada se inicia com uma travessia perigosa tentando cruzar a fronteiro do Irã no meio da noite. Depois de uma viagem exaustiva, eles conseguem chegar à Grécia, onde Salim desparece, e Fereiba precisa descobrir se tem a coragem necessária para seguir viagem deixando um filho para trás.

“Quando Cabul desmoronou, desabara, também os sonhos ingênuos da minha geração. Não víamos mais os luxos da Europa. Mal dava para enxergar o que havia além das ruas, tão densa era a fumaça da guerra. Quando meu marido e eu decidimos fugir de nossa terra natal, a sedução da Europa se resumia à sua única e mais atraente qualidade: a paz”

Deve haver algum lugar no mundo onde seremos acolhidos

Filha de pais afegãos, Nadia concentrou sua escrita em histórias ligadas ao Afeganistão e sua população, em especial à realidade das mulheres afegãs. Lua no céu de Cabul é seu segundo romance, e aborda tanto a influência que a guerra tem na vida de pessoas comuns, como aponta os problemas enfrentados por aqueles que por algum motivo tiveram que abandonar sua terra natal em busca de uma chance de sobrevivência em terras estrangeiras.

Fereiba não teve uma infância feliz, e prometeu que seus filhos teriam o carinho e a inocência que ela não pode ter. Quando o Talibã assume o poder, ela precisa parar de trabalhar como professora, sua filha é proibida de estudar e seu marido é perseguido pelo regime. Ela vê suas irmãs partirem de Cabul com suas famílias e é deixada sozinha quando seu marido é assassinado. Responsável pela sobrevivência de três crianças, se vê obrigada a privar os filhos da infância que ela desejou para eles, tirando suas crianças da casa em que nasceram e os colocando em risco com uma travessia que poderia resultar na morte de todos.

Com a ausência do pai, Salim se torna o homem da casa. Ele assume a responsabilidade de manter os irmãos e a mãe em segurança, mas como um rapaz recém entrando na adolescência pode sustentar uma família e garantir para eles um lugar no mundo, quando nem ele mesmo encontrou seu lugar no mundo. E que lugar no mundo seria esse, se em todos os outros países eles são vistos como indesejáveis, estrangeiros, refugiados?

O direito de ir e vir tem cor e é pago em euros

Correndo o risco dessa resenha ficar datada, para mim é inevitável comparar a situação da família de Fereiba com a dos refugiados da Ucrânia. Por causa dos ataques por parte da Rússia, milhares de ucranianos precisaram se refugiar nos países vizinhos. Muitos deles foram para a Polônia, outros foram para a Alemanha, Espanha, alguns vieram para o Brasil. É desconcertante ver como esses países estão de braços abertos para receber e ajudar os cidadãos ucranianos (ajuda obviamente necessária, e bom seria se mais pessoas pudessem receber auxílio em um momento de necessidade), mas a mesma disposição não é vista com refugiados vindos a África ou do Oriente-Médio.

É como se apenas as vidas de “pessoas brancas de olhos azuis” merecessem ser preservadas. A impressão que fica é que quando a guerra se dá em um país “civilizado” é mais errada do que aquela que acontecem em países “bárbaros” (para aqueles que ficaram horrorizados com as frases anteriores, esses termos foram utilizados por repórteres e comentaristas durante comentários sobre os primeiros dias da guerra na Ucrânia). Mas quantas mulheres não se tornaram viúvas por causa desses conflitos? Quantos Salims não foram obrigados a amadurecer precocemente por causa da violência. Quantas Samiras não perderam sua voz devido aos traumas de guerra? Será que se Fareiba e sua família fossem europeus receberiam o mesmo tratamento que receberam?

Ao escrever sobre essa família e apresentando a realidade e os perigos enfrentados por outros refugiados que eles encontram pelo caminho, Hashimi joga uma luz sobre a situação sub-humana enfrentada por aqueles que abandonaram seu lar, seus parentes, sua língua e em muitas vezes o próprio nome em busca de uma chance de poder existir. Pessoas que mais do que uma ajuda, buscam pelo direito de serem tratadas como pessoas, independente de seus locais de origem, da cor de suas peles, ou de qual idioma falam.

Nota

Cinco selos cabulosos. A maior nota do site.
Cinco selos cabulosos. A maior nota do site.

Garanta a sua cópia de “Lua no céu de Cabul”!

Ficha Técnica

Nome: Lua no céu de Cabul
Autor: Nadia Hashimi
Editora: Arqueiro
Ano: 2021
Páginas: 368
ISBN: 9786555651362
Sinopse: Casada com um engenheiro completamente apaixonado por ela, Fereiba leva uma vida feliz em seu mundo de classe média, no Afeganistão. Porém, tudo isso implode quando o país é imerso na guerra e o Talibã assume o poder.
Seu marido vira alvo do novo regime fundamentalista e é assassinado. Forçada a fugir de Cabul com os três filhos, Fereiba só tem uma esperança de sobreviver: atravessar a Europa até a casa da irmã, na Inglaterra.
Contando com documentos falsos e a bondade de estranhos que conhece pelo caminho, ela tem que fazer a perigosa passagem para o Irã sob o véu da escuridão. Exaustos, eles conseguem chegar à Grécia, mas, numa reviravolta apavorante, seu filho adolescente, Salim, some.
Será que Fereiba terá coragem de seguir viagem com a filha e o bebê e deixar o menino para trás, no mundo obscuro dos refugiados que vagam pelas ruas europeias?