[Coluna] Uma Cinderela diferente

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Montagem com uma pelicula de filme na horizontal, mostrando dois frames, o da esquerda mostra o postêr do filme
Montagem com uma pelicula de filme na horizontal, mostrando dois frames, o da esquerda mostra o postêr do filme "Jacky in the Kingdom of Women" que mostra o protagonista Jacky de vestido vermelho que cobre todo o corpo, ele salta e demonstra estar feliz e sorridente, na base da imagem, 4 soldadas uma ao lado da outra e a frente delas a imagem da Coronel, delas só é possivel notar do busto para cima. No frame da direita está uma cena da clássica animação "Cinderella", onde mostra a protagonista dançando com o principe.

Provavelmente você conhece a história da Cinderela. Deve ter ouvido ou lido ainda nos primeiros anos da escola e sempre a vê repetida por aí. É difícil – eu diria quase impossível – encontrar alguém que não conheça a história da gata borralheira maltratada pelas irmãs e madrastas e que consegue ser salva graças a uma fada que lhe dá a chance de ir ao baile conhecer o seu príncipe encantado. 

Ou melhor, quem não conhece a grande história da procura do príncipe pela mulher que o encantou na noite e que fugiu assim que o sino tocou meia noite, deixando apenas um sapato de cristal? Pois bem, hoje não falaremos dessa Cinderela, mas sim do filme “Jacky in the Kingdom of Women” disponível na plataforma de streaming Mubi e que conta essa mesma história da Cinderela por um ponto de vista diferente. 

A inversão de papéis na sociedade

Não é algo muito fora do comum a inversão dos papéis de gênero dentro do cinema, se olharmos lá para o início do século passado, a pioneira Alice Guy Blaché fez uma história assim em 1906, no seu filme “As Consequências do feminismo”. Na história de Blache, vemos um mundo onde as mulheres dominam os homens e os papéis, então tradicionais, são invertidos. As mulheres estão no bar enquanto os homens estão em casa cuidando dos filhos. 

Em 2018 a Netflix trouxe para o seu catalogo o filme “Eu não sou um homem fácil”, da diretora Éléonore Pourriat e que conta também uma história em que um homem, após ter um trauma muito forte na cabeça, acaba indo parar em um mundo onde as mulheres dominam os homens de todas as formas possíveis. 

Há outros exemplos desse tipo de abordagem no cinema, mas “Jacky in the Kingdom of Women” vai além, assistirmos a inversão dos papéis de gênero na sociedade e também uma releitura do conto da Cinderela. 

Casamento no reino das mulheres e um aceno para discussões LGBTQIA+

Jacky (Vincent Lacoste) é um garoto que vem de uma família pobre. Ele vê a oportunidade de mudar de vida com o baile que irá escolher o homem sortudo (aqui chamado de bebezão) que vai se casar com a Coronel (Charlotte Gainsbourg). Pouco antes do baile, a mãe de Jacky morre e a sua guarda vai para pessoas próximas a sua família. O convite do baile que era dele é roubado e dado para um dos filhos dessa família que está cuidando dele, não restando outra opção a não ser ficar em casa chorando.  

Quando ele foge e acaba entrando em uma trajetória que o coloca dentro do baile, começamos a ver toda uma discussão de sociedade que vai desde discussão sobre como os grandes oprimem os mais pequenos, como também em relação às discussões LGBTQIA+. Neste último caso, é pelo fato de que relações entre pessoas do mesmo sexo é considerado um ato de blasfêmia, e naquela sociedade pode levar a morte de quem prática. 

Vemos o quanto a personagem de Coronel é reprimida sexualmente e como pessoa de forma geral. Não há escolhas, obrigando-a a seguir um único caminho, o qual foi-lhe delimitado sem o seu consentimento; sua felicidade não é um fator importante a ser levado em conta nessas escolas. Não há liberdades.

Vou evitar comentar o que é a cena final para não estragar a experiência de quem for assistir, mas posso dizer uma coisa, para os fãs do horror dos anos 80 vão sentir um gosto de referência a uma obra que é um clássico absoluto daquela época.  

Jacky in the Kingdom of Women” é uma forma atual de se retratar um conto como o da Cinderela. Não só não se prende a velhos e antigos conceitos de uma sociedade que hoje em dia já não são tão predominantes assim e, por outro lado, acena para discussões que precisamos nos dias de hoje.