Castlevania da Netflix adapta um sucesso que atravessou diversas gerações de videogames. A dark fantasy medieval, que retrata a versão mas clássica do vampiro, é apontada como uma das melhoras animações do serviço de streaming. O traço marcante, as lutas deslumbrantes, o respeito a obra original e a química entre os personagens são marcos na trilha do sucesso. Buscar estes mesmos elementos levará a uma obra tão boa quanto a jornada de Trevor Belmont? Castlevania é mais que estética, excelente animação e um cenário típico com bons personagens. Refletir sobre o que ela é me fez lembrar de Vampire Hunter D: Bloodlust.
A obra japonesa protagonizada por D. é um filme em anime. Da mesma forma que a animação da Netflix, o acontecimento central não está ligado diretamente ao protagonista, entretanto, o afeta. Nas duas obras um amor impossível entre um vampiro e uma humana altera todo um status quo. É interessante como este tema comum em muitos romances reflete o pensamento de uma classe medieval.
Um olhar sobre o ser nobre
Nobreza, sangue puro e linhagem. O sangue deve permanecer real e um mero desejo de sujá-lo com uma raça inferior é intolerável. Reis não podem se relacionar com camponesas. Este nojo da realeza para com todos “de baixo” retrata uma época. Na história adaptada de um videogame essa crítica é escancarada, sendo que, os humanos são chamados de gado por uma elite de vampiros. A obra que dá cores a um romance japonês escrito por Hideyuki Kikuchi é mais sutil, porém, nota-se pelo próprio vilão, um barão, uma das críticas a aristocracia. Este olhar de cima para baixo é evidente nas duas dark fantasies. E os humanos, sejam eles camponeses em Castlevania ou sobreviventes em um mundo pós apocalíptico em Vampire Hunter D: Bloodlust encaram os chupadores de sangue de qual forma?
Como nascem as lendas?
Acho fascinante quando uma obra usa este ser com caninos alongados e de pele pálida para retratar a aristocracia. Escolha uma época entre o início do feudalismo ou os dias atuais. Independente de qual época foi escolhida existe um fato: muitos pobres trabalham até morrer. Calos nas mãos e dores nas costas não são suficiente. O sangue precisa ser derramado pelas feridas da exaustão. Quem tem o poder se compadece? Ao contrário, no sangrar dos menores alguns aristocratas devem sentir uma espécie de fascínio. Morre o avô e o pai e sem nenhuma saída o filho herda o trabalho. Distante de quem tem o poder só ouve falar do nobre no castelo, da mesma forma que ouve falar de uma antiga lenda. Um incontável número de pais e o avôs também nunca viram o nobre senhor de todas as terras e o imaginar preenche as brechas sem repostas:
“Será que é um imortal? Aquele que tem um castelo como lar viverá para sempre?”. Gosto desta crítica.
A maioria dos vampiros são monstros enclausurados no próprio luxo e sem nunca perder a sede. Porém, há alguns que não negam o sentimento, mesmo que gerado por um coração morto. Surge o amor pelo inferior. É claro que a paixão brotará por alguém da casta mais baixa, sendo que, não existe alguém acima do vampiro nos universos de D. e Trevor. Em Castlevania Drácula se apaixona por Lisa Tepes e em Vampire Hunter D: Bloodlust Charlotte ama o vampiro e barão Meier Link. Em ambas o amor impossível é recíproco. As duas personagem são interessantes porque elas encontram no amor uma forma de desbravar um mundo novo em vez de se conformar com a vida da qual são destinadas. Uma deseja as descobertas da ciência e a outra viver como um ser sobrenatural.
As semelhanças
No mundo de Lisa Tepes a igreja quer impedir a união. Na história da princesa Charlotte, o pai dela perdeu tudo e ainda sim deseja controlar a filha em vez de optar pelo diálogo para tentar entendê-la. É na obra mais curta, dirigida por Yoshiaki Kawajiri, que o caçador D. logo se apresenta como um mercenário ao pai desesperado para tomar a filha do vampiro Meier Link. Trevor Belmont não aparece de imediato e não possui nenhuma semelhança com o protagonista de Vampire Hunter D: Bloodlust. A comparação deve ser feita entre D. e Alucard.
Negados pelos dois lados
As criaturas D. e Alucard são metade humanos e metade vampiro. Apesar da obra da Netflix deixar bem claro que o foco é o confronto com lutas espetaculares, há espaço para crises existenciais. O filho do Drácula possui poder para viver entre os nobres vampiros ao mesmo tempo que nutre uma amizade sincera com os humanos Trevor e Sypha e poderia seguir com eles. Porém, enxerga-se como um monstro e não escolhe nenhuma das opções. Este não pertencimento o leva a uma espiral de autodestruição mantida através de isolamento e bebida. De forma lenta no decorrer das quatro temporadas Alucard enxerga tanto um lugar no mundo como também a própria importância para diversas pessoas. D. também possui um arco bem trabalhado em um filme focado em uma caçada.
O caçador D. tem um olhar negativo sobre si mesmo. Entretanto, diferente de Alucard, segue uma visão mais melancólica. Ele aceita o fato de que nunca será bem vindo entre os vampiros e os humanos. Ter essa verdade o tornou um caçador frio e silencioso, que em breves momentos, confessa em poucas palavras uma tristeza sobre a realidade. O existir só ganha algum sentido ao desempenhar a função de caçador. E não caça por raiva, para combater o tédio ou por algum heroísmo. Faz porque é um dos poucos que pode fazer em meio a um mundo pós apocalíptico.
Mulheres fortes
Sypha em Castlevania e Leila de Vampire Hunter D: Bloodlust não são só sidekick dos protagonistas. Elas possuem uma relação com o mal a ser combatida, treinaram para isso, questionam, dão a opinião delas e por muitas vezes tomam a frente na história. Na obra da Netflix o sentimento de amizade transforma-se em amor. Na animação cinematográfica, a amizade se solidifica, mesmo D. sendo muito mais seco que o Trevor. Sypha é mais forte que o caçador do clã Belmont. Ao contrário de Leila que nem chega perto da força de D., mas o arco dela é melhor trabalhado e a luta contra os vampiros é uma questão mais pessoal. Elas são marcantes porque independente do fato de ajudarem e serem ajudadas pelo caçadores, cada um avança por si só mostrando independência.
Obras que conversam
Vampiros com poderes que vão além da super força, voar e sugar sangue para se nutrir; mundos que passam uma sensação de destruição e as histórias até possuem uma personagem em comum. Tão semelhantes e ao mesmo tempo tão diferentes. No final, o elemento fantástico é extrapolado tanto em uma quanto na outra, mas possuem visões e tons diferentes. Assisti-las me fez não só ver as semelhanças como também pude melhor entendê-las através das diferenças.
Cada uma teve algum sucesso e se a espera por uma nova temporada da obra idealizada por Warren Ellis te atormentar, assista Vampire Hunter D: Bloodlust e conheça algo parecido em essência com Castlevania e diferente na execução. Caso conheça só a obra mais antiga, Castlevania ajudará a matar a saudade.

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