O que nos faz acompanhar histórias que nos envolvem muito, tornando-se angustiantes, até mesmo sufocantes e nos fazendo nos preocupar com seus personagens? Histórias como essas são como mergulhos fundos, e para tais mergulhos, precisamos guardar ar de alguma forma. O texto de hoje é sobre esses respiros na narrativa.
Histórias cativam as pessoas. Um dos inúmeros motivos que fazem o leitor se identificar com histórias é a empatia por personagens, é a vontade de conversar com aquelas pessoas, ou criaturas, querer ser amigos delas e isso ocorre porque autores inserem em suas narrativas momentos que mostram que seus personagens são humanos, são amáveis e são como a gente, apesar dos inúmeros desafios que precisam enfrentar.
Esses momentos geralmente se manifestam em interações em que nos identificamos. Em meio a perseguições da sombra que atormenta os protagonistas, autores nos dão de presente momentos de interação entre os personagens. Esses momentos geralmente são refeições risonhas, rodas de histórias em uma fogueira, piadas em uma viagem de carro, e por aí vai. Quando a coisa aperta e as histórias chegam ao seu clímax, são esses momentos que os protagonistas (e o próprio leitor) lembram.
Os momentos que nos fazem enxergar personagens como seres reais. E se eles são reais, não podemos desistir deles, não é mesmo?
Pensando em narrativas como um mergulho profundo, a jornada de Frodo em Senhor dos Anéis inicia com um grande fôlego, com mais e mais páginas (ou cenas) mostrando o quão fascinante é a vida no condado, exposição o suficiente para fazer os leitores encararem milhares de páginas para descobrir se algum dia aqueles hobbits vão conseguir voltar para casa.
Recentemente, o famoso mangaká Kentaro Miura faleceu e muitos fãs reservaram um tempo para refletir sobre seu legado. Sua principal obra, Berserk, é violenta, sombria e polêmica, e os protagonistas parecem enfrentar provações sem fim. Mas há diversos respiros, horas em que os personagens permitem-se descansar, criando momentos que se tornam motivações para continuar (tanto a jornada quanto a leitura).
Há diversos exemplos que podem ser comentados, sejam as refeições na Toca dos Weasley, as pizzas no apê da Ísis em Porém, Bruxa, ou as noites de filme de Arlindo e suas amigas.
Por falar nisso, no décimo terceiro episódio do Leia Novos BR, entrevistamos Matheus Forny, que, dentre muitos assuntos, comentou a respeito da caracterização de personagens, sobre os momentos em que os protagonistas param para ser pessoas normais e interagir entre si, criando esses respiros na narrativa. Por isso, chamamos Matheus para dar sua opinião sobre esse tema:
“Personagens bem-feitos transbordam para além das páginas da história. O que acontece dentro de um livro, geralmente, é a maior aventura que os personagens terão na vida, seus momentos definidores que precisam ser recortados de suas biografias. A narrativa se molda para acompanhar o início, meio e fim de suas sagas, o que pode fazer com que eles sejam vistos apenas como peças do roteiro, peões em um tabuleiro. Momentos de descanso, contudo, permitem que o leitor veja facetas dos personagens que fogem às suas funções no roteiro, uma visão dos heróis em um momento de vulnerabilidade mundana que conecta as duas partes. É mais através do menos, é casualidade que faz crescer a excentricidade, é experienciar o que está entre as frestas”
Aproveito o final desse texto para anunciar que o Leia Novos BR também terá um pequeno respiro na sua jornada de divulgar literatura nacional! Na próxima semana, a Livraria entrará de Férias e a programação mudará um pouquinho: em vez de entrevistarmos autores, conversaremos com outros podcasters aqui do Leitor Cabuloso. Logo, convidamos todos a continuar acompanhando nosso podcast, pois muitas novidades vêm por aí!
