[Resenha] Na ponta dos dedos – Sarah Waters

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Capa do livro. Fundo bege com muldura rosa e texturizado. No topo, o título do livro em rosa. No centro duas chaves de modelo antigo apontada para direções diferentes. Abaixo, o nome da autora.
Capa do livro. Fundo bege com muldura rosa e texturizado. No topo, o título do livro em rosa. No centro duas chaves de modelo antigo apontada para direções diferentes. Abaixo, o nome da autora.

Na ponta dos dedos é um drama que se passa na Inglaterra por volta dos anos 1850. As protagonistas e narradoras desta história cheia de reviravoltas são as órfãs Sue Trinder e Maud Lilly, que tiveram vidas muito diferentes dos padrões e que mudam completamente após as se conhecerem por meio de um golpe.

O plano

Sue é uma órfã de dezessete anos criada em uma família de golpistas em uma casa onde receptação e venda de objetos roubados são atividades corriqueiras. As poucas letras que a moça conhece, aprendeu enquanto retirava iniciais bordadas em lenços de seda roubados. Apesar disso, Sue sempre foi bem tratada por sua mãe de criação e sente grande afeição pela senhora.  Um dia, Sue recebe a proposta participar de um plano para roubar a fortuna da jovem Maud Lilly.

O golpe foi proposto por Richard Rivers, conhecido como Gentleman, que começou a trabalhar com Chistopher Lilly, tio de Maud. O plano consistia em casar com a jovem e logo em seguida interná-la em um hospício, ficando então com toda sua herança. Maud é descrita por Richard como uma moça tola, criada praticamente isolada em Briar, mansão do seu tio que fica na zona rural, onde tem contato apenas com os criados, o tio e seus raros visitantes. O papel de Sue seria manipular Maud para que ela aceitasse a proposta de casamento de Richard.

Sue aceita participar da trama, mas enquanto ela vai conhecendo Maud começa a se encantar com a moça e a realmente se importar com o bem-estar dela, até perceber que na verdade está apaixonada.

Ela ri. O som é estranho, em Briar, como imagino que seria em uma prisão ou em uma igreja. Às vezes, ela canta. Uma vez, falamos em dançar. Ela se levanta e ergue a saia, para me mostrar um passo. Depois me puxa para eu ficar em pé, e me faz girar várias vezes. E sinto, onde ela se aperta a mim, a batida acelerada de seu coração – sinto isso passar dela para mim, e se tornar meu.

Sue/Maud

O livro é dividido em três partes, duas narradas por Sue e uma por Maud. As partes narradas por Sue foram as minhas preferidas, pois os acontecimentos narrados por ela foram bastante envolventes. Porém, achei a parte narrada por Maud um pouco arrastada. Quando ela se lembra de sua infância e seus primeiros anos em Briar a narrativa prende a atenção, mas quando ela narra os acontecimentos mais recentes, eu achei a história um pouco repetitiva e desinteressante.

Eu gostei muito de como a autora usou o ambiente da mansão Briar como uma forma de mostrar como a vida de Maud era controlada em todos os sentidos e em todos os momentos. Sua vontade nunca foi levada em conta em nenhum momento, nem no tipo de alimentação preferida. Maud sempre foi uma propriedade a ser usada, primeiro pelo tio e depois por Richard.

Você foi demasiadamente exposta à obra literária – disse ele em uma de suas visitas -, e esta é a causa de sua enfermidade.

Uma questão importante levantada pelo livro é como mulheres eram tratadas “na época”. Sem direitos, sem voz, sem escolhas. Parte da narrativa trata de como era fácil se livrar de mulheres indesejadas simplesmente com um homem afirmando que elas eram loucas.

A sinopse oficial do livro gerou certa expectativa de qual seria a relevância para a trama da paixão entre as protagonistas. Para mim, essa expectativa não foi realizada e eu gostei disso. Achei o modo como os sentimentos delas foram tratados bem mais realista e também condizente com a personalidade delas.

A maior parte de “Na ponta dos dedos” proporciona uma leitura rápida e instigante, onde somos surpreendidos por novos fatos a todo momento. Com personagens muito bem construídos, a história mostrada de dois pontos de vista diferentes nos faz entender melhor as motivações e decisões das protagonistas.

Nota

Quatro selos cabulosos. A nota mais alta são 5 selos cabulosos.
Quatro selos cabulosos. A nota mais alta são 5 selos cabulosos.

Garanta a sua cópia de “Na ponta dos dedos”!

Ficha Técnica

Título: Na ponta dos dedos
Autora: Sarah Waters
Tradutora: Ana Luiza Dantas Borges
Editora: Rocco
Ano: 2019
Páginas: 592
ISBN: 978-8532531469
Sinopse: Londres, segunda metade do século XIX. Sue Trinder, órfã de nascença, cresceu numa área degradada da cidade junto a uma família onde eram “todos mais ou menos ladrões”. De uma hora para outra, o destino de Sue se conecta ao de outra órfã – esta morando num casarão sinistro num campo não tão distante.  Como parte um plano capitaneado por um colega de golpes da família chamado Richard Rivers, Sue vai trabalhar como camareira na mansão de um idoso pedante, excêntrico e possessivo chamado Chistopher Lilly.

Ele mora sozinho com a sobrinha e única herdeira, a jovem e frágil Maud, mantida parcialmente isolada do mundo. O papel é Sue é conquistar a confiança da moça e, nas palavras de Gentleman, “mantê-la tola e persuadi-la, em sua ingenuidade, a cair na cilada” – ou seja, casar-se com o charlatão após a iminente morte do tio. Em seguida, Gentleman pretende dar o toque final em seu golpe: internar Maud num hospício e tomar posse da fortuna deixada pelo velho.

O que Sue não esperava era sentir tamanha afinidade com Maud, algo que, aos poucos, se transforma em desejo sexual e, enfim, numa avassaladora paixão. Enquanto os detalhes se apresentam em camadas e mais camadas de reviravoltas, jogos psicológicos e erotismo, o ponto de vista da narrativa se alterna entre Sue e Maud nas idas e vindas de uma trama que, página após página, nunca deixa de encantar, surpreender e impressionar.