Antes de ler a resenha de Madiltas: as casas têm atmosfera, é importante que você saiba que cheguei a coletânea de contos porque dentre as autoras uma é amiga deveras cara para mim, negligenciar essa informação, portanto, seria omitir a parcialidade com que li os contos que antecederam o dela e vieram após a leitura de seu texto. Se isso influenciou ou não na avaliação geral da coletânea deixo para o leitor julgar.
A coletânea
Malditas: as casas têm atmosfera, publicado pela editora Estronho, sobre a curadoria Celly Borges, possui no total, contando com a organizadora que também tem conto no livro, com 7 autoras. Toda a coletânea de contos possui altos e baixos, sempre temos textos que se sobressaem e outros que não conseguem arrebatar o leitor como deveria ser uma narrativa curta. Por isso, quando resenho um livro de contos costumo analisar conto a conto, sem muitos spoilers, atribuindo uma nota para cada texto e, ao final, dando uma média geral.
Os contos de sangue (ou não)
Escrito com sangue de Sheilla Liz
Sem sombra de dúvida o melhor conto da coletânea “Malditas: as casas têm atmosfera”. Conta a história de um narrador anônimo que ao receber uma casa de herança (o subtítulo “casas têm atmosfera”, serve como tema central para o onde deve se passar todas as histórias) e em determinado momento fica preso numa parte específica da residência.
A situação absurda e a narrativa em primeira pessoa dão o tom claustrofóbico que o conto exige. A autora sabe lidar com a estranheza da situação nos deixando com aquela sensação saborosa de imprevisibilidade. O monstro é incerteza, é a dúvida que narrador e leitor compartilham. Se o narrador não sabe o que lhe irá acontecer também nós não o sabemos e a cada parágrafo somos levados a pensar “e agora?”.
A casa Grimlin de Valentina Silva Ferreira
Conto de época, que conta a história de uma mãe que vai morar com suas duas filhas numa casa e descobre que vive uma entidade que visa a sua filha mais velha, mas além disso um segredo terrível do passado as acompanha até a casa Grimlin.
Talvez aqui apareça um dos principais problemas que acompanhará outros contos. A relação tempo e exposição de informações. O conto por ser um texto curto lida com eventos que ocorrem num período de tempo que pode variar de horas a dias, nesse ínterim precisa trabalhar com as informações que serão passadas ao leitor para que este se sinta parte daquela realidade. E isso não acontece aqui. A história decorre durante alguns dias e quando a revelação chega até nós é através de uma avalanche de exposição que não para até sua conclusão. Fora que a tentativa de quebrar a quarta parede no final, para mim, não funcionou.
Amarelo para sempre de Luciana Minuzzi
Uma mãe e filha mudam-se para viver em uma casa nova, mas coisas estranham começa a acontecer, como o misterioso poder de influência de um jardineiro.
Mais uma tempestade de exposição na conclusão do conto. A crítica, sobre esse recurso narrativo, vem de que essas informações precisam ser montadas pelo leitor, como numa narrativa detetivesca, ao longo do texto. Também não existe construção da tensão. Os acontecimentos já dão o tom de sobrenatural que se espera ao final da história de forma muito clara.
Reflexo de criança de Inês Montonegro
Essa é a história de vingança de “Malditas”23. Após a morte da mãe, o pai e suas duas filhas vão morar numa casa. Eis que as irmãs, cada uma ao seu jeito, começam a ver uma estranha menina no espelho…
Terceiro melhor conto da coletânea. Desenvolve um clima de mistério e a autora sabe brincar com o clichê do espírito que veio para atormentar seus moradores (será?). Tem um desfecho bem inusitado, mesmo um pouco apressado e trazendo exposição consegue fazer com que nós criemos empatia pelas irmãs.
O sobrado de Debora Gimenes
Um casal se muda para uma casa nova e sua filha começa a ser atormentada por uma entidade que deseja possuir o seu corpo.
Conto muito apressado e repleto de exposição. Todos estão falando tudo até aquilo que nós, leitores já sabemos.
Mudanças de Priscilla Rúbia
Segundo melhor conto da coletânea. Um casal se muda para uma casa nova cheia de móveis de seus antigos donos, os segredos que o lugar revelam podem salvar aquele família.
Apesar de apressado, a autora explora bem seus personagens principais além de criar uma dubiedade com o personagem Alceu. A exposição é bastante controlada deixando ao leitor o papel de juntar o quebra-cabeças através do ambiente. Um dos poucos contos em que a casa é muito mais do que simplesmente um lugar, ela tem uma história e Priscilla explora muito bem por meio dos móveis.
Anne de Celly Borges
Anne perdeu a todos que amava e quando sua vida parecia sem rumo recebe uma grande herança e uma casa de sua avó que até então nunca lhe tinha demonstrado nenhum afeto.
O conto constrói bem a sua personagem deixando claro, porque alguém aceitaria uma casa como herança (e não vendê-la como seria a atitude em nossos dias). Celly consegue construir a tensão e o mistério até a metade quando narrativa começa a ficar confusa e bagunçada.
Malditas: as casas têm atmosfera consegue na medida do possível fugir dos clichês e ao mesmo tempo usá-los de forma consciente sem subestimar o leitor. Você poderá ler de forma física ou em e-book, a edição é profissional, o que significa, não possui erros de grafia.
Nota
Uma dica preciosa sobre a Estronho Editora é que vale a pena segui-la no instagram, pois vira e mexe eles estão liberando livros gratuitos para download na Amazon, esse mesmo apesar de tê-lo físico, adquiri de forma gratuita em uma dessas promoções. Além disso, esse livro está no Kindle Unlimited, que você pode assinar e garantir esse e outros livros sem nenhum custo a mais.
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Ficha técnica
Título: Malditas — As casas têm atmosfera
Autoras: Celly Borges, Debora Gimenes, Inês Montenegro, Luciana Minuzzi, Priscilla Rúbia, Sheilla Liz e Valentina Silva Ferreira
Edição: 1
Editora: Estronho
Ano: 2017
Páginas: 150
Resumo: Nas histórias de horror, o tema casas desperta enorme interesse nos fãs do gênero. Muitos autores escreveram livros que se tornaram clássicos, cujos personagens principais são essas construções que assombram nossas mentes.
O assunto é repleto de simbolismo, magia, crueldade… E para o livro Malditas, as casas têm atmosfera, cada autora foi desafiada a se aventurar, sentir e transmitir ao leitor esse horror entranhado em todos os cantos.
Cada casa, depois de muito tempo abandonada, recebe novos habitantes, no entanto, não haverá o retrato da família feliz nem os sorrisos dos almoços de domingo.
As paredes ocultam os segredos e, quando menos se espera, eles voltam e presenteiam seus moradores com as atrocidades cometidas no passado e manipulam essas pessoas, que sofrem toda sorte de pesadelos reais.
Leitor, bem-vindo à sua nova morada.