É admirável a capacidade que alguns autores têm de imprimir delicadeza na hora de contar uma história. Essa é uma marca possível de perceber no trabalho da escritora Isa Prospero, e sua publicação mais recente, o conto “A feiticeira de São Judas Tadeu dos Milagres”, não foge dessa característica.
O conto, lançado de forma independente, conta a história de Dona Simone que, aos 83 anos, descobriu que é uma bruxa. A premissa é essa, bem simples, mas o que Isa conseguiu fazer com ela é impressionante. A começar pela protagonista inusitada. A maioria das histórias tendem a investir em personagens mais jovens, mas, para essa história, nenhuma outra personagem seria tão adequada quanto essa simpática senhorinha.
Um dos grandes trunfos dessa obra é a construção dos personagens. Não só Dona Simone é cativante desde as primeiras frases, mas também Heitor e Lucas, que têm um papel fundamental na história. Isa Prospero é muito feliz na forma como dá vida aos três, a ponto de a trama parecer transbordar das páginas. É impossível chegar ao final do livro sem querer fazer parte da trajetória desses personagens. Um sonho: comer um bolinho de Dona Simone.
O cotidiano como narrativa
A história é ambientada numa cidade no interior de São Paulo e a autora soube aproveitar muito bem as características de um lugar fora de uma grande metrópole. É possível identificar diversos elementos da vida cotidiana que dão um toque especial à trama. É um conto com gosto de casa, que evoca uma nostalgia gostosa.
Sou uma ferrenha defensora de utilizar acontecimentos comuns, as “micronarrativas” para desenvolver uma história. Nesses pequenos momentos moram elementos riquíssimos e profundos, que podem ser explorados e ganhar novas dimensões pelas mãos habilidosas de uma escritora atenta, como é o caso de Isa Prospero.
O mais encantador de “A feiticeira de São Judas Tadeu dos Milagres” é a magia que reside na vida comum de uma senhora que, quando achava que não havia mais nada que pudesse a surpreender na vida, recebe um presente inesperado. O elemento fantástico do conto serve para mostrar que a graça da vida está nas pequenas coisas — como tricotar acessórios para seus filhos e netos. O fato de a agulha ter poderes e “milagrosamente” resolver os problemas das pessoas é só um detalhe. O que importa é o amor empregado no gesto de presentear e no cuidado de observar o que cada um gosta.
Diversidade
Um ponto surpreendente do conto é a presença de personagens diversos na história. A forma como as diferentes identidades de gênero foram tratadas — com naturalidade, como deve ser — mostra o cuidado da autora em ser representativa de forma respeitosa. Esse era um aspecto que não esperava encontrar no conto e fiquei muito feliz por ele estar lá.
O mais interessante é ver como Dona Simone lidou com a questão. Uma grande lição de respeito e cuidado, deixando a mensagem de que, no fim das contas, o que importa é o amor.
“A feiticeira de São Judas Tadeu dos Milagres” é daquelas histórias que deixam um quentinho no coração ao final da leitura. É possível aproveitá-la em uma sentada só, mas com calma, para ser apreciada degustada como um bom café no fim de tarde. Aconchegante como um abraço de vó. E a mensagem que fica é que, bruxa ou não, o maior feito de Dona Simone é ser um ponto brilhante que ilumina ao seu redor. Precisamos de mais personagens (e pessoas) assim.
Nota
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Ficha Técnica
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Nome: A feiticeira de São Judas Tadeu dos Milagres
Autora: Isa Prospero
Edição: 1ª
Editora: Independente
Ano: 2019
Páginas: 35
ISBN: B07W4419NQ
Sinopse: Aos 83 anos, Dona Simone leva uma vida pacata no interior de São Paulo – até que um dia recebe uma herança mágica extraviada há décadas. Com a ajuda do neto e de um amigo inesperado, Simone terá que descobrir o que significa exatamente ser uma bruxa.