[Quadrinho] Mayara e Annabelle de Pablo Casado e Talles Rodrigues

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Magia nordestina

Sabe aquelas estórias que te pegam pelo pé, te derrubam e só te largam quando você as devorou por completo? Mayara e Annabelle é uma delas. Essa HQ, lançada pela Editora Fictícia com roteiros do alagoano Pablo Casado e artes de Talles Rodrigues conta a historia de Mayara e Annabelle, ambas funcionárias da SECAFC, uma secretária federal de controle de casos sobrenaturais ou “fora do comum” no Brasil. A trama começa quando Mayara, uma ninja experiente, depois de ter se aprofundado em uma investigação que incomodou gente poderosa,  acaba sendo transferida às pressas da SECAFC SP (São Paulo) para a SECAFC CE (Ceará). Lá ela conhece Annabelle, uma maga poderosa e única funcionária de lá, que por sua vez só queria um estagiário para fazer seus relatórios, e não uma parceira. Nenhuma está nada satisfeita com a presença da outra. Lógico que uma amizade acaba nascendo, mas, aos tropeços. Com a chegada de Mayara, Annabelle percebe que há algo errado quando ela e sua nova parceira passam a ser alvo de tentativas de assassinatos e também o aparecimento de criaturas que há mais de vinte anos não se viam por ali. Inicia-se um mistério que as duas terão de desvendar juntas, tudo temperado com boas doses de ação, humor e misticismo.

Logo de cara o que mais me atraiu nessa HQ foi o elemento sobrenatural. Eu realmente amo historias como Hellblazer, Motoqueiro Fantasma e Hellboy, todas recheadas de anjos, demônios e tramas escabrosas com doses cavalares de magia. Porém, Mayara e Annabelle passa longe do tom noturno e lúgubre das HQs acima citadas. Surpreendentemente, a trama trata desses elementos “das trevas” de uma forma totalmente nacional, com dias ensolarados e sequências nas mais lindas praias que o Ceará tem a oferecer.  Tenho que admitir que não sou um leitor feroz, e raramente costumo devorar livros ou HQs de uma vez. Mas, com essa estória, eu acabei me vendo preso na trama, e dando boas risadas com as tiradas de humor, que também são ponto forte desse trabalho, mas sem esquecer do estilo próprio que lembra uma boa mistura entre Hellboy, com suas investigações burocráticas do sobrenatural, e Scott Pilgrim, com suas sequencias de ação espalhafatosas.

Sobre o roteiro

O autor abusa do regionalismo em seus textos, e assim nas páginas cruzamos frequentemente com falas como “ Aff, que trânsito de corno”, “ai dentro” ou “vai timbora carniça”, mas tudo de maneira espontânea e fluente, totalmente diferente daquela coisa estereotipada e as vezes até insultante que somos obrigados a ver sempre que um personagem nordestino é atochado em alguma novela da Globo, por exemplo. O Pablo Casado foi muito competente em criar uma trama envolvente, que cativa, com viradas bem sutis e um bom ritmo colocando elementos que realmente retratam um nordeste real e atual. Grande parte dessa simpatia que a HQs evocam de seus leitores se deve as protagonistas. Elas funcionam bem como tal. A relação entre elas é ponto forte pois o autor soube bem misturar personalidades tão distintas e criar o engajamento necessário para a trama. Annabelle é uma bruxa, mas também é uma mulher moderna de senso de humor afiado. Aliás, é ela a responsável pelo humor tão genuinamente nordestino que tanto agradou esse nordestino que vos fala. Já Mayara, é mais fechada, porém, seu jeito introvertido passa totalmente batido quando ela tem chance de demonstrar suas vastas habilidades em combate, e é muito divertido para o leitor, ir desvendando o mistério junto com essas duas enquanto elas se alfinetam e são obrigadas a trabalhar juntas para vencer as ameaças demoníacas que aparecem. O resultado é uma síntese inesperada que apresenta desde lutas com espadas, passado por magia negra até caranguejos Gigantes e demoníacos.

Sobre o traço

Eu sempre fui fã de um traço mais representativo e detalhista, mesmo assim, o traço um tanto cartunesco e inconstante que algumas vezes beira o esboço conseguiu sim me agradar. A experiência visual que as páginas proporcionam é bem única. Isso se deve em grande parte a pegada mangá que o artista consegue imprimir, dando a HQ uma narrativa de ritmo mais acelerado e de fácil compreensão, sem falar em belíssimas cenas de página duplas e enquadramentos muito bem aplicados. É uma pegada que na minha opinião bebe da fonte de artistas como Bryan Lee O’malleyFabio Moom e Gabriel Bá. Eu demorei um pouco pra identificar a pegada do artista, procurando referências em artistas de fora, mas, só depois de uma segunda leitura me dei conta que a maior referência para a arte se encontra aqui, em nossos cordéis. Resumidamente é isso, a arte de Talles Rodrigues, combinada com uma paleta de cores tão inusitada transformou Mayara e Annabelle em um divertido e moderno cordel colorido.

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 Considerações finais

Mayara e Annabelle é uma HQ daquelas que não devem ser levadas muito a sério, mas que cumprem muito bem seu único papel: divertir.
Eu fiquei muito feliz ao término da leitura pois senti que encontrei algo que me fazia falta. Como leitor (e também escritor de quadrinhos), busco sempre criar boas estórias, cativantes como devem ser, e com o regionalismo que imprima uma identidade nossa, coisa que tanto falta nas HQs brasucas atualmente. Mayara e Annabelle cumpre bem esse papel oferecendo uma trama cheia desses elementos que alimentam a faminta indústria de cultura pop, mas sem nunca esquecer de deixar bem claro que você está vivendo aquela aventura fantástica em um nordeste igualmente fantástico.

Se você quiser dar uma conferida nessa HQ, ela pode ser lida no Social Comics, ou pode adquirir direto no site da editora Fictícia. Lembrando que o segundo volume já está à venda e também pode ser lida no Social Comics.

Nota:

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MAYARA_E_ANNABELLE_VOL_1_1430607714447904SK1430607714BNome: Mayara e Annabelle
Autores: George Schall (capa e cores), Pablo Casado (Roteiro) e Talles Rodriguez (arte).
Edição:

Editora:
Fictícia
Ano: 2014
Páginas: 76
Sinopse: A vida que Mayara conhecia acaba de ir para o brejo. Até então a mais respeitada Assessora Técnica em Combate da Secretaria de Atividades Fora do Comum de São Paulo, ela quase foi exonerada. mas graças ao seu mentor, Salgado, acabou transferida para a Secretaria do Ceará. Não que isso tenha acontecido de graça, é claro: ela investigou onde não devia.