[Resenha] Contos de Imaginação e Mistério do Edgar Allan Poe

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Estão presentes nessa edição exatamente 22 contos. Contos que mesclam desde o macabro ao suspense, ao horror à imaginação. Na grande maioria desses contos, temos Poe explorando a loucura e todas as suas facetas como em William Wilson, O Coração Denunciador, O Gato Preto, e Berenice. Uns são mais sensitivos, outros mais reflexivos, mas todos, de uma forma ou de outra, despertam no leitor alguma forte emoção.

contos poe

O livro começa com o conto William Wilson, que é curto e bem intuitivo. Temos como problemática da história a lenda do Doppelgänger, que segundo as lendas germânicas, falando a grosso modo, seria o “eu malvado” de cada ser humano. Um ser fantástico — provavelmente algum tipo de monstro — que escolheria uma pessoa para copiar e seguir pelo resto da vida, levando caos e desordem para a pessoa escolhida. Ela imita em tudo a pessoa alvo, até mesmo as suas características mais íntimas.

O conto é narrado em primeira pessoa — como a maioria dos contos do livro —, pelo próprio William Wilson, narrando sua história pessoal e seu histórico de combate com seu “eu malvado”. Trajetórias essas que se confundem, sendo até uma mesma história. Ambos se conheceram no colégio e desde já, já trocavam ofensas, vindo essa “batalha” a culminar em algo violento e surpreendente.

Em O Gato Preto, temos um homem tão obcecado com o assassinato que cometeu contra seu próprio gato “querido”, que vê num novo bichano seu antigo “algoz”. Parte daí numa desenfreada loucura, quando cego por sua obsessão ele faz coisas inimagináveis.

Temos também O Coração Denunciador, onde um homem desde o início envolve o leitor numa trama cheia de suspense e toques do macabro, onde somos inseridos dentro da mente de um homem visivelmente louco, mas que mesmo assim afirma ser são e que vai nos provar! No entanto, esse homem “são”, é obcecado (mais uma vez a obsessão, a loucura) pelo olho do seu amo. Isso mesmo. Ele é amedrontado pelo olho de um velho que nunca lhe fez mal. O olho lhe enche de uma fúria descomedida de maneira tão intensa, que ele começa a bolar planos para se livrar do velho e do seu maldito olho.

Em Berenice, temos a “história de amor” de Egeu e de sua prima que dá nome ao conto, que é interrompida por uma doença que se abate sobre Berenice e que a leva a se degenerar aos poucos. No entanto, curiosamente, os dentes dela continuam impecáveis e assim começa a obsessão de Egeu pelos dentes de sua amada, obsessão que vai além da morte.

Este é um conto que representa verdadeiramente a obra de Edgar Allan Poe. Cercada de violência e suspense, onde o foco narrativo é exatamente a figura atormentada do protagonista Egeu e de sua estranha adoração pela sua amada prima Berenice.

morte rubraNo entanto, talvez o ponto alto dessa coletânea esteja em A Máscara da Morte Vermelha. No primeiro parágrafo deste conto temos a descrição do processo de mortificação da peste que é conhecida como Morte Vermelha.

Através da metáfora onde um príncipe buscando fugir da morte, refugia-se em seu grande palácio e vive apenas de felicidade, Poe nos ensina que a fuga da realidade, leia-se, a busca constante e desenfreada pela vida, ignorando a morte, pode não ser a melhor opção. Uma vez que mesmo trancando-se em seu palácio, cercado de festas e convidados queridos, o Príncipe Próspero depara-se com seu último (pior) inimigo.

Em Silêncio Uma Fábula, Poe nos conta uma história sobre um homem a quem o demônio confidencia uma fábula, falando grosseiramente. Durante a leitura, no entanto, nos deparamos com a profundidade dessa história, onde mais uma vez Poe nos surpreende, levando à debate e à reflexão a insatisfação humana, problematizando a solidão, o isolamento e a morte. Um conto deveras filosófico e essencial.

Temos aqui ainda Os Assassinatos da Rua Morgue, e o Mistério de Marie Roget (baseado num crime real), dois dos três contos no qual aparece o aclamado Auguste Dupin, pai da literatura policial.
Por último temos um conto de viés bastante cômico, porém não por isso menos essencial, chamado Leonizando, onde nos deparamos com uma narrativa completamente diferente, cômica até, mesmo assim não deixando de lado o toque obscuro característico de Poe.

Considerações finais:

As características de Poe perpassam tanto pela melancolia como pela poesia. Temos contos altamente encantadores, levando-nos a conhecer o auge da profundidade literária de Poe. Suas obras, por vezes taxada como “Romantismo Sombrio” pegam influência tanto do movimento romântico inicial, como se firma como resposta ao movimento filosófico conhecido como Transcendentalismo.

No romantismo de Poe, no entanto, opondo-se ao otimismo exagerado apregoado pelo Transcendentalismo (visão dos autores românticos sombrios), temos a ênfase na falibilidade humana e na propensão para o pecado, para a destruição (principalmente a autodestruição).

 Um livro que me marcou um bocado e que tirou certo preconceito que eu antes tinha com os escritos do Poe (devido a um contato pouco produtivo com algumas traduções ruins). No entanto, a tradução da Tordesilhas (feita por Cássio de Arantes Leite) assim como a diagramação e toda a edição está impecável — nota dez. Temos ainda um prefácio feito por ninguém menos que Charles Baudelaire (1821-1867) e ilustrações (ótimas, por sinal) feitas pelo irlandês Harry Clarke (1889-1931).

NOTA:

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Ficou interessado(a)? Então compre o livro:

Nome: Contos de Imaginação e Mistério
Autor: Edgar Allan Poe
Edição:

Editora:
Tordesilhas
ISBN: 9788564406353
Ano: 2012
Páginas: 424
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