“Eu procuro salvar a qualquer um que possa ser salvo”
(Wilm Hosenfeld)
“O Pianista” é o premiado filme dirigido pelo reverenciado cineasta polonês Roman Polanski. Lançado em 2002, o filme ganhou 3 Oscar (Melhor diretor, melhor ator para Adrien Brody e melhor roteiro adaptado) e emocionou milhares de pessoas, sendo considerado por muitos como uma verdadeira obra-prima do cinema.
O filme narra a história de Wladyslaw Szpilman, um pianista polonês que viu, viveu e sentiu sua vida desmoronar durante a Segunda Guerra Mundial.
Durante o decorrer do filme conhecemos sua história, seus familiares e principais amigos e participando de seu drama, nos sentimos próximos e angustiados perante às atrocidades que assolaram suas trajetórias.
Como tantas histórias sobre a busca pela sobrevivência durante o Holocausto, o filme mostra a luta e o sofrimento que os perseguidos sofriam naquele sistema. Contudo, um dos pontos positivos trazidos pelo longa “O Pianista” é a sua visão espetacular, divergente do clássico “guerra > soldado > batalhas > perseguição > violência > morte”: é a história de um sobrevivente que demonstra o tempo todo que sua família apenas quer se manter unida, os famintos apenas querem pão e ele próprio, o pianista Szpilman, apenas quer viver sua vida e fazer o que ama: tocar seu piano, fazer música, sentir-se vivo e livre dentro de seus sonhos e perspectivas singulares que não tornam um sobrevivendo, ou um polonês, e sim um indivíduo único no mundo.
Relatando como realmente eram os acontecimentos e as reações das pessoas, sem romanciá-las ou transformá-las em super heróis, o filme surpreende em sua humanidade (como não ficar surpreso ao ver a reação da irmã de Szpilman com a moça que chora em agonia sem parar enquanto espera a decisão dos oficiais sobre seu futuro?!).
Ao unir um roteiro de primeira, uma história inspiradora, a trilha sonora ideal, atuações inesquecíveis e um diretor com visão singular, o filme é um verdadeiro presente para os amantes da sétima arte e interessados pelos mais complicados e complexos acontecimentos da história mundial: a exterminação em massa dos perseguidos e rejeitados pelos nazistas durante a Segunda Guerra.
O diretor por trás das telonas
“O Pianista” é marcado por fatores baseados em fatos reais. Inclusive, todas as personagens citadas no longa são reais, do protagonista aos secundários, incluso os exterminados violentamente durante o desenrolar da história.
Contudo, vale a curiosidade a respeito da vida do aclamado e polêmico diretor Roman Polanski: ele próprio é considerado como um sobrevivente ao holocausto.
Nascido em 1933, Polanski era ainda uma criança quando na Polônia perseguida foi separado de seus pais. Seu pai sobreviveu aos campos de concentração, onde enfrentou seus piores pesadelos e sua mãe foi assassinada no famoso campo de Auschwitz.
A vida do diretor continua marcada por tragédias e sofrimento, incluindo o fato do assassinato frio de sua esposa, a atriz Sharon Tate, grávida de oito meses, pela seita do psicopata Charles Manson. Anos depois, o diretor se refugiou na França e até hoje não tem permissão para entrar nos EUA, após acusação de violentar uma garota de 13 anos em uma festa realizada na mansão do ator Jack Nicholson, na década de 1970.
Apesar de sua vida conturbada, que muitas vezes aparece mais nos holofotes do que suas obras-primas cinematográficas, o diretor tem seu trabalho reconhecido e uma legião de fãs fiéis que se emocionam com o caráter humano e dramático: seus filmes são tão tocantes que te transportam para dentro das telas.
Mas… sabia que tem livro?
O que poucas pessoas sabem é que o longa “O Pianista” é baseado em um livro de memórias escrito por ninguém mais ninguém menos que o próprio Wladyslaw Szpilman.
Apesar de tensa, a leitura é bastante fluída e rápida. Particularmente, me surpreendi com o livro: ele é extremamente tocante e emocionante. Acima de tudo, Szpilman é sincero e absolutamente humano: fala de seus sentimentos, medos, frustrações e experiências com sentimento, porém sem ser abusivo ou apelar ao romantismo heroico de guerra (do qual você desacreditará ao ler essa obra ou assistir a esse filme).
Algumas passagens mostram um pouco do terror vivido pelos poloneses e judeus na época: a violência presente nas ruas, o preconceito da sociedade, a fome, a miséria, a descaracterização humana ao serem separados de seus lares e bens materiais que lhe tornavam singulares, a ruptura cultural e proibição de acesso aos locais onde os alemães frequentavam… em todo esse cenário tão dramático e inadmissível apenas nos resta reconhecer a força que aqueles homens, mulheres e crianças precisaram ter para enfrentar todas as dores e torturas que esse mundo lhes oferecia e também assumir nossa fragilidade e desesperança se nos colocássemos no lugar deles.
Apesar de a guerra ter-lhe tomado, dos acontecimentos terem-lhe atingido bruscamente, o pianista é um apaixonado pela vida. Orgulha-se de sua família, luta por sua sobrevivência, mas acima de tudo anseia por trazer o seu melhor para os seus: a música.
Ele nos mostra mais uma vez um dos principais desastres da humanidade: onde a guerra deixa os campos militares e atinge aos civis, buscando a exterminação de massa uma vez que o orgulho e controle é maior do que a esperança ou crença em si mesmo e na comunidade.
Todo o relato da vida de Szpilman pode ser encontrado no livro “O Pianista”, lançado no Brasil em 2003 pela editora Record e pela Editora BestBolso, com média de 230 páginas.
Wilm Hosenfeld – abençoado sejas!
Apesar de todo o sofrimento, a história do Pianista não é marcada apenas de dor e lágrimas. Sua sobrevivência é derivada da ação de um soldado alemão chamado Wilm Hosenfeld, um ser abençoado em um mundo destrutivo.
Durante sua luta pela manutenção de sua própria vida, o Pianista se esconde em uma casa abandonada onde espera não ser importunado por soldados ou dedurado por vizinhos. Dentre tantas pessoas que poderiam encontrá-lo, qual foi sua surpresa ao ser encontrado justamente por um militar alemão nazista!
O soldado alemão, entre tantos outros, antes da guerra era um professor. Hosenfeld foi o responsável por salvar várias crianças polonesas da morte certa e também por salvar a vida de um certo músico que estava perdido no meio da guerra, faminto e doente. Correndo risco de ser descoberto, Hosenfeld trazia alimentos e bebida para Szpilman enquanto o ajudava a permanecer vivo, longe de ser detectado por seus compatriotas.
Ao se despedir do Pianista, o oficial não lhe deu informações pessoais, levando consigo apenas seu nome. Ao fim da guerra, Szpilman foi contatado por um amigo que recebeu um pedido de um oficial preso na Rússia: disse que conhecia Wladyslaw Szpilman e pediu que o notifica-se de onde estava para que pudesse por ele ser resgatado.
Qual a alegria de Szpilman ao saber de seu herói salvador! Contudo, apesar de todas as tentativas ele não conseguiu salvar seu amigo alemão, que morreu em solo russo após sete anos de prisão.
As primeiras edições do livro “O Pianista” não continham informações a respeito do oficial alemão. Credita-se essa escolha ao fato de Szpilman ter optado pelo silêncio por se sentir fracassado em ajudar quem lhe salvou a vida.
As novas edições (inclusa a versão brasileira citada nessa coluna) possuem os trechos emocionantes da relação entre os dois, bem como o nome verdadeiro do oficial. Ao final do livro, encontram-se anexos extraídos dos diários de Wilhelm (Wilm) Hosenfeld: textos que mostram sua humanidade e sentimento de culpa pelas atrocidades e atitudes que seu país e corporação assume contra os demais.
Um dos trechos mais emocionantes diz: “A vida e a liberdade das pessoas perderam seu significado. (…) Há somente uma explicação [para as brutalidades alemãs]: trata-se de pessoas doentes que enlouqueceram.(…) Será que libertaram os deliquentes e enfermos das prisões e manicômios? Não. Os culpados são os altos funcionários do nosso governo. (…) Gostaria de atirá-los [oficiais que matam judeus] debaixo do bonde. Mas o que fazer se somos covardes e, embora condenado, permitimos essas atrocidades? E é por isso que seremos castigados junto com eles.“
Apesar de toda a destruição, onde existe ação e esperança existe salvação e vida. Por isto, Wilm Hosenfeld abençoado sejas!
O oficial recebeu homenagem póstuma realizada pelo Memorial do Holocausto israelense por sua ação pacifista e salvadora dentro do regime autoritário nazista. Segundo a instituição, foi provado que o militar salvou diversos judeus e nunca se envolveu em crimes de guerras.
Enquanto isso…
Enquanto você decide se vale a pena ver (ou rever) ao filme e ler o filme (acredite: vale muito!!!!), deixo a dica para você ouvir o CabulosoCast #92 – Review: Maus, O Diário de Anne Frank e O Menino do Pijama Listrado, onde a equipe Cabulosa fala sobre três obras literárias incríveis que tem como temática a Segunda Guerra Mundial.
Se você gosta da temática, aconselho também que conheça a resenha da Priscilla Rúbia aqui no site do livro “Nada de novo no front”, de Erich Remarque.
Além disso, você pode conferir o trailer do filme abaixo:
Agora, me conta:
O que achou do tema? Gostou do filme? Leu o livro?
Logo logo trago mais inspirações de adaptações literárias para você aqui na coluna Sabia que tem livro?
Até a próxima! 😉