Por Lucas Rafael Ferraz
A ponta da faca, retirada às pressas do dedo, saiu com aproximadamente meio centímetro do metal enrubescido. O líquido espesso pingava incessantemente. Correu para o banheiro, chamando pela esposa para que o ajudasse com o curativo. Estranhamente, não sentia uma dor forte, como era de se esperar, apenas um incômodo e algumas pontadas, como reflexos fantasmas do golpe tomado. Colocou o dedo embaixo da torneira, e o ralo bebeu avidamente o sangue, que vertia sem dar sinal de que pretendia parar de deixar seu corpo tão cedo.
Essa era, talvez, a maior estupidez que já cometera na vida. Começou com a gula. Lembrou-se de que no armário havia uma Tupperware com um pedaço de chocolate, daquelas barras de um quilo, que havia sido adquirida para usar como cobertura de pão de mel. Pegou a tigela e, com ela na mão, tentou quebrar um pedaço do chocolate com a faca. Após algum esforço, o doce partiu-se abruptamente, cedendo espaço para a lâmina, que, impulsionada pela inércia, quebrou o plástico e penetrou-lhe o dedo anelar da mão esquerda.
Ria da situação enquanto a água avermelhada escorria. Mais ferido que o dedo estava seu ego, apesar de encarar a situação com leveza. Muitas pessoas cometiam trapalhadas no dia a dia, se queimando, se cortando ou se colocando em perigo por bobagens e de modo incauto. Mas havia outras que pagaram preços muito mais caros por tais peripécias impensadas, como a própria vida.
Muitas delas eram nomeadas para o irônico prêmio Darwin, que havia começado como uma brincadeira nos primórdios da internet e, hoje em dia, recebia muitas indicações com a expansão do uso da web. A “honraria” faz alusão à seleção natural, conceito proposto pelo biólogo de mesmo nome. Lembrou-se de casos que haviam tomado os noticiários nos últimos tempos, como a brincadeira de tirar fotos se equilibrando em objetos, que havia culminado em algumas quedas do topo de edifícios, e da competição criada e espalhada no Facebook em que jovens disputavam quem podia consumir mais bebida alcoólica de uma vez só. Nem é preciso dizer que alguns fígados não aguentaram o tranco.
Pensando nessas coisas, refletiu sobre a fragilidade da vida humana e a falta de respeito que algumas pessoas possuem com a própria existência, se colocando em situações de risco extremo que trazem, como único resultado, caso passem ilesas pelo desafio auto-imposto, uma momentânea e ilusória fama virtual, com suas fotos e vídeos se alastrando por algum tempo.
Devido a isso, a internet, e mesmo os criadores de tais competições, acabam sendo penalizados, quando não tiveram qualquer participação a não ser como veiculadores de uma mensagem, aceita e encarada apenas por aqueles que são os únicos e reais culpados das consequências que sofreriam posteriormente.
Foi trazido de volta a realidade por uma outra pontada no corte aberto, e percebendo que o ferimento não ia coagular tão cedo, segurou firme um pedaço de algodão contra o mesmo, e enrolou-o com vários band-aids. Dando-se por satisfeito, limpou a sujeira na pia e foi para a sala.
Analisando a vítima ferida, entendeu o porquê de não ter sentido tanta dor quanto imaginava: havia atingido um nervo. Conseguia mexer o dedo em todas as direções, tudo parecia normal, mas metade da ponta, do mesmo lado do ferimento, estava amortecida. Confortavelmente amortecida, pensou, como dizia a música do Pink Floyd e como indubitavelmente eram as cabeças do ilustres ganhadores do Prêmio Darwin.


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