“Numa toca no chão havia, um Hobbit…”.
A tão aclamada frase que Tolkien rascunhou em uma folha de papel definiria todo o universo que iria maravilhar milhares de pessoas em todo o mundo. Tolkien começou com um universo simples, uma história infantil feita para os seus filhos, e lançou o livro despretensiosamente e foi um sucesso avassalador.
Muito diferente da adaptação de Peter Jackson, que começou com um grande potência: promessas do uso do 3D de uma forma que ninguém tinha visto, com sessões em 48 frames, com o acréscimo de elementos dos outros livros do “senhor da fantasia”, como os Contos Inacabados e o Silmarillion, contudo longe do sucesso inesperado a adaptação do senhor Peter Jackson foi um grande fracasso, como muitos disseram, “a desolação dos fãs”.
Hum, … será?
Assim que o último filme de O Senhor dos Anéis terminou, corri para ler O Hobbit e à medida que a leitura foi sendo concluída um grande mal-estar tornou-se evidente. Aqueles não eram os Elfos de OSdA, aqueles não eram anões de OSdA, aquele livro não chegava aos pés do que eu havia assistido em OSdA. Minha avaliação no skoob foi 1, sim eu dei 1 para o livro de O Hobbit e na época eu e Serena travávamos brigas homéricas sobre o assunto. Eu querendo provar que existiam livros infantis muito melhores e ela querendo me convencer que a leitura fora feita com a ótica errada.
Em 2013, eu reli o livro para gravar um CabulosoCast – CabulosoCast #67 – O Hobbit – e me surpreendi quando ao término da leitura dei a minha irmã todo o crédito que ela merecia. Você deve estar se perguntando por que estou dando tantas voltas para falar deste filme, certo? Um dos motivos pelos quais a leitura de O Hobbit superou minhas expectativas – e fez mudar minha nota no skoob de 1 para 5 – foi a aceitação de que trata-se de uma história infantil criada para os filhos de Tolkien. E como um livro escrito para crianças, ele possui diversos elementos que contemplam este público. Não é uma aventura, mas uma desventura. Os anões são bobos e desastrados, sendo Bilbo encarregado de livrá-los das maiores enrascadas. O tom aventuresco (ou épico) fica pelo próprio prelúdio do UM ANEL. E a expectativa na leitura de O Senhor dos Anéis.
Análise (com Spoilers):
Logo, se você imaginar o livro O Hobbit sendo adaptado para o cinema fielmente como uma história infantil com certeza não seria algo agradável para aqueles que ainda retêm na memória as lembranças de um filme épico como O Senhor dos Anéis, por isso a decisão mais que acertada do diretor de acrescentar elementos dos Contos Inacabados e do Silmarillion. Tentar dar o mesmo tom Épicos a um livro de características infantis teria seu preço. E o mais terrível deles seria tentar agradar aos tolkenianos. Ou os fãs do “mas…”.
São fãs que aparentemente não se decidem sobre o que seria um bom filme. Como disse, eles vivem sempre no “mas…”. Leram O Hobbit e gostaram “, MAS é um livro muito ingênuo comparado a O Senhor dos Anéis”; Leram O Senhor dos Anéis e gostaram “, MAS as descrições do Tolkien são enfadonhas”; Assistiram aos filmes e gostaram “, MAS quem não leu os livros não compreendeu nada”.
E se nos focarmos nos filmes do Hobbit ai que as contradições são mais evidentes. “A canção dos anões não ficou tão épica como no trailer”, “os anões ficam brincando e cantando quando possuem uma perigosa aventura à frente”, semelhante ao livro. Os anões cantam e dançam até que Thorin inicia a canção Misty Mountains Cold e isto cria um tom triste e sombrio entre os aventureiros, despertando o espírito Tûk de Bilbo:
Enquanto eles cantavam, o hobbit sentiu agitar-se dentro de si o amor por coisas belas feitas por mãos, com habilidade e com magia, um amor feroz e ciumento, o desejo dos corações dos anões. Então alguma coisa dos Tûk despertou em seu íntimo, e ele desejou ir ver as grandes montanhas e ouvir os pinheiros e as cachoeiras, explorar as cavernas e usar a espada ao invés de uma bengala.
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Então no segundo filme não há canções, e os anões são focados em sua jornada, e o que os fãs dizem? “Onde estão as canções? Cadê o humor?”;
No primeiro filme, tivemos mais de 40 minutos passados no Condado, até aparecer a primeira cena de ação. Para os fãs “estava lento demais”. No segundo filme, nada de um longo período na Floresta das Trevas, como no livro, ação frenética: Bilbo usa o anel, mata as aranhas e salva o grupo, em seguida o grupo é capturado pelos Elfos e Bilbo tem a ideia de usar os barris. Objetividade, nada de lenga-lenga… e os fãs? “Foi muito rápido, não explicou nada como no livro!”.
Se Gandalf ouve a voz de Galadriel e vai em busca do Necromante, no livro esta cena nem existe. Já imaginou que frustrante se o mago da companhia dissesse que não poderia acompanhá-los, “pois tem assuntos pendentes”. Não podemos esquecer que tem um enorme público que não leu os livros (isto ficou bem claro na minha sessão de cinema). São pessoas que precisam de explicações que nós que vivemos conversando e discutindo sobre o universo do Tolkien já sabemos.
Pontos positivos do filme:
- A ação é o ponto forte: como os personagens já foram apresentados no primeiro filme, não há motivo para “este é fulano, filho de sicrano, avô de beltrano”. A cena dos barris é emblemática, frenética e divertida. No momento em que Bombur sai rolando e derrubando Orcs é divertidíssimo, na minha sessão todos riram.
- O fato de Bilbo ser influenciado pelo anel (fato que não ocorre no livro) foi uma belíssima sacada do senhor Peter Jackson; com medo de perder seu “precioso”, o hobbit mata um bebê aranha sem dó nem piedade e esta ação abominável o faz perceber que existe algo no anel que vai muito além da invisibilidade.
- A aparição de Legolas é importante para conectar as histórias de O Hobbit e O Senhor dos Anéis, como está claro nesta trilogia desde o começo. Legolas é um personagem elfo que o público do primeiro filme conhece, já que Elrond pouco aparece nos filmes da 1ª trilogia. O fato de ele ser arrogante e detestar anões cria o clima perfeito para sua “afeição” com Gimli.
- Existem diversas explicações visuais para Bard ser quem será no decorrer do filme. Em sua primeira aparição, ele desarma os anões com suas flechas (o que mostra que ele não é um arqueiro comum mesmo entre os humanos). Visto como um rebelde na cidade sob às águas, Bard pode fazer a diferença como rei, pois sua preocupação é para com o povo. Outro ponto relevante é a história do seu antepassado. Se alguém achou muito “conveniente”, acho que deveria rever seus conceitos e sair da argumentação do “mas”, pois a construção do livro é muito mais inverossímil, pois quem fala do ponto-fraco do dragão é uma pássaro e no filmes teremos diversos elementos para uma cena épica, já que Bard possui a última flecha negra, ele é um exímio arqueiro, o tal ponto-fraco existe realmente como Bilbo pôde confirmar e tudo isto contribui para que ele não seja qualquer um a realizar o objetivo de matar Smaug.
- O dragão ficou excelente. Quem me acompanha tanto no LCTV – LCTV S03 E02 – , no CabulosoCast ou nas redes sociais sabe muito bem que eu detestei o visual do dragão. Mas ao vê-lo no filme, percebi o quanto minha impressões estavam equivocadas. A bajulação de Bilbo é hilária (cena que por sinal, existe sim no livro) e faz com que o dragão lhe dê alguns segundos de vida.
- O 3D é muito bom. Vi até pessoas se esquivarem da abelha na cena da casa do Beor.
Pontos negativos do filme:
- A “elfa piriguete” – como apelidou Serena – foi criada para o filme, ela não existe na obra do Tolkien e não deveria existir na adaptação. No lugar dela, seria uma excelente oportunidade para Legolas deixar a arrogância de um príncipe élfico e construir um respeito pelos anões. Se em todas as cenas que a elfa aparece, trocássemos por ele, veríamos uma construção que aproximaria Legolas de quem ele seria em O Senhor dos Anéis.
- O amor da “elfa piriguete” pelo anão… sem comentários… se isto foi uma decisão do estúdio e blá, blá, blá não sabemos e nunca saberemos. Esta discussão é para cinéfilos.
Nota:
Se você é um fã da obra do Tolkien e vive com o discurso do “Mas…”, pare para pensar que você não é um único contemplado por este filme. Existem milhares de pessoas que só conhecem a obra do “mestre da fantasia” no cinema e para eles tudo precisa ser explicado. Se você também é daqueles que não gostou, MAS não consegue imaginar como seria um filme fiel ao livro, mas com um toque de O Senhor dos Anéis, ou seja, se não consegue imaginar um filme que fosse infantil e épico ao mesmo tempo, então admitamos que O Hobbit – A Desolação de Smaug vale o ingresso. É divertido no momento certo e épico quando precisa ser. Expande o universo de OSdA e faz de O Hobbit uma parte primordial da saga do anel.