“Estou indo embora”.
Essas foram as palavras exatas que fizeram o mundo de Afonso cair. Até então, ele poderia não estar completamente satisfeito para onde sua vida o estava levando, mas gostava da rotina. Ter alguém em casa para suprir suas carências e ter com quem conversar após um trabalho desgastante. Não que as conversas fossem longas e significativas; na verdade, pelo que ele lembrava, elas também se tornaram escassas no relacionamento. Mas o silêncio em companhia já era o bastante. E agora essa. Mais uma ausência em sua vida. O motivo tampouco interessava. Ele a amava, no fim das contas. E isso era o suficiente para fazê-lo se sentir sem rumo mais uma vez.
“Para onde?”
“Ainda não sei. Para outra cidade. Quero deixar de vez essa aqui.”
“Mas por quê?”
“Não conversamos mais, você não parece me amar, não me procura e a rotina tomou conta da nossa vida”
Afonso queria falar tudo o que estava pensando, o que ela significava para ele e o quanto sentiria sua falta, mas só conseguiu dizer:
“Pensava que você gostasse da rotina”.
“Nunca gostei. O silêncio desconfortável, o trabalho que tomou conta de nós dois. Eu ficava sempre frustrada com o que me esperava em casa.”
“Há algo que posso fazer para você ficar?”
“Não. A não ser que você se lembre literalmente da frase que disse para ti no momento em que nós entramos nesse apartamento.”
“Mas foi há sete anos. Se perguntasse de quando nos conhecemos…”
“Não sabe, então?”
“É injusto uma frase definir um romance que durou tanto tempo.”
“Injusto é você não se lembrar”, afirmou Priscila saindo de casa e batendo a porta.
***
Dois anos depois, Afonso entrava em seu novo apartamento com sua nova amada, Carminha. Estava feliz – ao menos até onde conhecia o significado desse adjetivo. Foi Carminha que falou pela primeira vez ao entrar na residência.
– Olhe para esse lugar! Onde os nossos sonhos nos levaram. Só sairei daqui com você, Afonso. Eu te amo.
Pela primeira vez em anos, Afonso lembrou-se de Priscila. E, pela primeira vez em sua vida, ele chorou.