Entrava ano e passava ano, Maria continuava ouvindo sempre os mesmos chamados de crianças e adolescentes que não a deixavam ter paz. No banheiro de seu antigo colégio, em frente a qualquer tipo de espelho, independente do horário – apesar dos mais comuns serem por volta de 0h, algo que Maria nunca havia entendido o porquê –, os garotos faziam isso há anos e não seria diferente agora.
Os humanos adoravam pedir atenção e grandes bens materiais, pensava ela, enquanto as promessas de Maria giravam em torno do simples e humilde sossego. Cansara de aparecer para grupos de garotos que apenas queriam ridicularizar sua sofrível história e pregar peça em um algum jovem rapaz que teria sua vida interrompida por uma brincadeira tola.
Maria não gostava do que fazia. Muito pelo contrário. Mas o que antes era motivo de anseio, aparecer para os vivos que desejavam vê-la, algo que nunca antes havia encontrado durante sua existência, agora era motivo de agonia e raiva.
– Devo matá-lo por invadir minha privacidade. É isso. Não me incomodará mais.
E, de fato, ela ficava contente pelo medo que espalhava nos pobres rostos juvenis que a atormentavam e pensava que nunca mais precisaria repetir o ato, agora que eles sabiam a verdade. Pobre, Maria. Esquecia-se da curiosidade humana: ora um dom, ora um constante pesadelo. A novidade chegava e todas as crianças voltavam a fazer o mesmo, pensando que não passava de falácias dos amiguinhos. Alguns grupos a chamavam ao mesmo tempo para confundi-la, imaginava ela. Grupos de cinco, seis, em diferentes localidades, declamando seu nome três, cinco, dez vezes diante do espelho e a esperando como se fosse a última pessoa que veriam com vida. Sim, eles estavam certos. Mas a rotina passou a incomodar Maria. Pensava que havia se livrado disso com o fim de sua vida, mas a eternidade era tão cruel quanto sua passagem terrena.
Refletia sobre qual seria o próximo passo, mas não havia jeito, seu sofrimento era eterno. Não devia haver nada mais. Clamava por ajuda e direcionamento a quem tanto diziam existir. Aquela grande e suave voz que aconselhava a todos nos momentos mais tristes, mas nunca se sentia ouvida. Apesar disso, seguia pedindo para que as histórias sobre ela terminassem e ela pudesse vagar sozinha, enfim. Um dia de paz, ao menos. Já pensava ter sofrido o bastante. Enquanto Maria raciocinava sobre sua tragédia interminável, um pequeno garoto, por volta de nove anos, entrava em um banheiro para repetir seu nome em voz alta até ela aparecer. Pegou o machado que repousava ao seu lado e foi para mais um dia de serviço.