RESENHA: “Andanças”, entre a besta e a humanidade…e uma estaca no coração?

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Capa

Autora: Carissa Vieira
Editora:
Multifoco
Origem: Brasileira
Edição: 1ª
Ano: 2012
Páginas: 136
Skoob
Sinopse: Na Inglaterra do início do século XX, Charles, um jovem da alta sociedade londrina vê sua vida ser totalmente modificada ao ser atacado por uma vampira. A partir daí, além de ter que aprender a se adaptar ao seu novo destino e aos sofrimentos naturais da sua condição, ele vai perceber que nem tudo é o que parece, e vai ter que encontrar a resposta para a seguinte pergunta: Em quem eu posso confiar? Visitando alguns cenários da Europa e com alguns personagens intrigantes, como o Russo Mikhail e o sexy Lorenzo, a trama sempre nos faz retornar a mesma pergunta: Em quem confiar? Quem são os verdadeiros mocinhos e quem são os vilões?Onde comprar? Editora Multifoco, Livraria Cultura.

Análise:

“É mais fácil deixar que o monstro sedento por sangue passe a guiar todos os seus passos. Sufocar sua própria dor e desilusão com a vida e permitir que a raiva aflore e tome conta.”

—Pág. 07.

Saudações, caros leitores! Os vampiros representam uma das criaturas sobrenaturais mais reverenciadas na literatura, dentre outras mídias, o número abundante de obras que os abordam serve de prova cabal. Alguns livros os tratam como monstros cujo único propósito é saciar a sede por sangue, outros os exibem como seres melancólicos em que o lirismo é acentuado e também existem aqueles que focam em seu poder de sedução. Sendo “Andanças” da Carissa Vieira um romance vampiresco, explanarei sobre como foi esta “mordida” (leitura).

Charles, o protagonista que narra a história, no prólogo nos apresenta o dilema que irá mover a trama. Como pode ser deduzido, em parte já antecipamos o desfecho, mas isso não estraga a emoção do desenrolar, afinal a jornada com todos os seus relevos é o que mais comove.

Posteriormente, voltamos ao passado, quando Charles ainda era mortal. Apesar de ser um membro da nobreza, ele não demonstra felicidade em sua vida no seio de uma família de grandes recursos. Dono de um intelecto evidentemente aguçado e profundo amante dos livros, o personagem nos captura com seu elevado carisma e até mesmo inocência. Sendo este último traço ainda mais salientado depois de sua transformação, quando se vê envolvido em uma rede de intrigas.

Eliza, uma belíssima vampira com um forte senso de humanidade, atributo que se demonstra raríssimo entre os mortos-vivos no decorrer do romance, é a senhora de Charles. Gentilmente o guiando pela sua nova existência, ela também situa o leitor no mundo concebido pela Carissa. A sociedade vampírica é bastante organizada, regida por uma série de leis e contando com uma rede de comunicação global, claro que dentro dos limites da época (início do século XIX). Sem ser maçante, a autora se atém ao que é essencial para deixar o cenário coerente e cativante.

Depois de certo tempo, durante o qual os efeitos perniciosos da vampirização se manifestam (fome voraz e perda de consciência), Charles demonstra saudades de sua condição anterior, tanto quando o assunto é a família, quanto coisas mais triviais (admirar o sol, por exemplo). Desviando-o desse saudosismo, surge Mikhail, um vampiro, desafeto de Eliza. Dono de um humor sarcástico, astucioso e adepto da visão de que os humanos são exclusivamente gado, sofre de um leve estrelismo que deixa as suas cenas marcantes e extremamente divertidas.

Convivendo com duas pessoas de filosofias tão distintas, Charles passa por muita inquietação ao questionar-se sobre qual caminho deve percorrer como um ser da noite. Como se isto não bastasse, ele percebe que a nova realidade que habita é ainda mais sombria e talvez ele não possa confiar em alguém. Tentem imaginar como seria viver nesse clima paranoico, com certeza extremamente desconfortável. Todavia, será que essa desconfiança tem fundamentos? Deixo a incógnita no ar.

O que mais me impressionou nesta leitura, foi a habilidade com que a escritora elucidou alguns elementos acerca da natureza dos vampiros. Posso citar o caso dos notívagos recorrerem ao sexo frequentemente como uma válvula de alívio para impulsos destrutivos, fato completamente compreensível e abordado sem excessos que poderiam comprometer a maturidade da obra. A história tem um tom adulto, o que achei maravilhoso.

Em um labirinto de informações, Charles descobre coisas que podem leva-lo a uma segunda morte. Será que vale a pena buscar a verdade nessas circunstâncias? Aliás, qual é a verdade?

Os capítulos curtos, com cerca de seis páginas, e a narração sucinta, o que é condizente com o caráter parcial dos relatos do protagonista, deixam o texto ágil e saboroso. A revisão, feita pela própria escritora, está ótima e ressalto que em alguns trabalhos feitos por terceiros não encontro tanto cuidado. O desfecho, inclusive, deixa a abertura para uma continuação. Dou cinco selos cabulosos!

Nota:

Avaliação