NOTÍCIA: ROGER CORMAN PRODUZIRÁ REFILMAGENS DE SEUS OITO FILMES BASEADOS EM EDGAR ALLAN POE, OUÇO ALGUÉM BATER EM MEU UMBRAL E DIZER: “MAIS, MAIS, MAIS!”

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Saudações, caros leitores! Se você gosta de literatura de terror ou suspense, já deve ter ouvido o nome Edgar Allan Poe. Contudo, há a possibilidade de você, mesmo que não goste dos gêneros citados anteriormente, saiba o peso que tal escritor carrega, afinal até hoje ele é lembrado e influencia muitos outros autores. Provavelmente, a maioria dos leitores já deve ter visto ao menos um filme inspirado em uma das obras do mestre Poe. Infelizmente em vida obteve pouquíssimo reconhecimento, como muitos outros escritores, e morreu aos 40 anos.

Roger Corman - The Raven (O Corvo)
Roger Corman – The Raven (O Corvo)

Deixando o clima levemente soturno um pouco mais “alegre”, aviso que Roger Corman (produtor, diretor e ator) produzirá refilmagens de seus oito filmes de baixo orçamento baseados em textos do Poe.

Com 86 anos de idade, tendo dirigido 55 filmes e produzido a enorme quantidade de 385, Roger Corman é uma autêntica lenda cinematográfica. Corman é mais conhecido por seu trabalho em filmes B com baixo orçamento, o que o tornou um referencial no estilo e fez com que ganhasse muitos admiradores. Uma das realizações mais notáveis de Corman foi uma série de oito adaptações de história de Edgar Allan Poe que foram lançadas entre 1959 e 1964, a maioria estrelada por Vincent Price.

Revisitando esse período de sua carreira, Corman visa refazer todos os oitos filmes para a nova geração de fãs de terror. Uma atitude que acho nobre e pela qual, considerando que será feita por um fã, coloco as minhas mãos no fogo.

Segundo o The Hollywood Reporter, as refilmagens vão conservar a característica do baixo orçamento. As oito histórias são: O Solar MalditoA Mansão do TerrorObsessão MacabraMuralhas do PavorO CorvoO Castelo Assombrado, A Orgia da Morte e Túmulo Sinistro (os nomes aqui reproduzidos são os dos filmes no Brasil e não, necessariamente, o título dos textos em que foram inspirados). A primeira adaptação, “O Solar Maldito”, tem o início da produção marcado para 2013. Depois disso, serão lançados dois filmes por ano. Os longa-metragens serão produzidos com um orçamento entre 2 e 2,5 milhões de dólares (o que é baixíssimo hoje em dia) e Corman está ansioso para tirar proveito da nova tecnologia que não estava disponível quando ele fez seus filmes originais:

“Agora, seremos capazes de fazê-los em 3D e com um monte de computação gráfica, poderemos fazer coisas que nunca sonhamos em fazer antes. Poe sempre trabalhou com o lado inconsciente da mente, e isto envolve muita fantasia.”

O produtor prolífico disse que agora o desafio é encontrar um substituto adequado para Vincent Price e Corman espera lançar “um ator cinquentão conhecido da TV” para preencher esse vazio. Os filmes originais de Corman são muito divertidos, e assumindo que eles não são vítimas da  moda de filmes de terror que usa demasiada nudez e violência gratuita, podemos ficar ansiosos pelas refilmagens.

Trailer original de “O Solar Maldito”:

http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=f3v7o8jO_vI

Poster
Poster

Fonte: Collider.

Vou deixar o poema “O Corvo”, que inspirou o filme, como um extra do post:

O Corvo (Traduzido por Fernando Pessoa)

Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de algúem que batia levemente a meus umbrais.
“Uma visita”, eu me disse, “está batendo a meus umbrais.

É só isto, e nada mais.”

Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro,
E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.
Como eu qu’ria a madrugada, toda a noite aos livros dada
P’ra esquecer (em vão!) a amada, hoje entre hostes celestiais –
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,

Mas sem nome aqui jamais!

Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo
Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!
Mas, a mim mesmo infundido força, eu ia repetindo,
“É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;
Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.

É só isto, e nada mais”.

E, mais forte num instante, já nem tardo ou hesitante,
“Senhor”, eu disse, “ou senhora, decerto me desculpais;
Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo,
Tão levemente batendo, batendo por meus umbrais,
Que mal ouvi…” E abri largos, franqueando-os, meus umbrais.

Noite, noite e nada mais.

A treva enorme fitando, fiquei perdido receando,
Dúbio e tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais.
Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita,
E a única palavra dita foi um nome cheio de ais –
Eu o disse, o nome dela, e o eco disse aos meus ais.

Isso só e nada mais.

Para dentro então volvendo, toda a alma em mim ardendo,
Não tardou que ouvisse novo som batendo mais e mais.
“Por certo”, disse eu, “aquela bulha é na minha janela.
Vamos ver o que está nela, e o que são estes sinais.”
Meu coração se distraía pesquisando estes sinais.

“É o vento, e nada mais.”

Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça,
Entrou grave e nobre um corvo dos bons tempos ancestrais.
Não fez nenhum cumprimento, não parou nem um momento,
Mas com ar solene e lento pousou sobre os meus umbrais,
Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais,

Foi, pousou, e nada mais.

E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura
Com o solene decoro de seus ares rituais.
“Tens o aspecto tosquiado”, disse eu, “mas de nobre e ousado,
Ó velho corvo emigrado lá das trevas infernais!
Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais.”

Disse o corvo, “Nunca mais”.

Pasmei de ouvir este raro pássaro falar tão claro,
Inda que pouco sentido tivessem palavras tais.
Mas deve ser concedido que ninguém terá havido
Que uma ave tenha tido pousada nos meus umbrais,
Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais,

Com o nome “Nunca mais”.

Mas o corvo, sobre o busto, nada mais dissera, augusto,
Que essa frase, qual se nela a alma lhe ficasse em ais.
Nem mais voz nem movimento fez, e eu, em meu pensamento
Perdido, murmurei lento, “Amigo, sonhos – mortais
Todos – todos já se foram. Amanhã também te vais”.

Disse o corvo, “Nunca mais”.

A alma súbito movida por frase tão bem cabida,
“Por certo”, disse eu, “são estas vozes usuais,
Aprendeu-as de algum dono, que a desgraça e o abandono
Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais,
E o bordão de desesp’rança de seu canto cheio de ais

Era este “Nunca mais”.

Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura,
Sentei-me defronte dela, do alvo busto e meus umbrais;
E, enterrado na cadeira, pensei de muita maneira
Que qu’ria esta ave agoureia dos maus tempos ancestrais,
Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais,

Com aquele “Nunca mais”.

Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo
À ave que na minha alma cravava os olhos fatais,
Isto e mais ia cismando, a cabeça reclinando
No veludo onde a luz punha vagas sobras desiguais,
Naquele veludo onde ela, entre as sobras desiguais,

Reclinar-se-á nunca mais!

Fez-se então o ar mais denso, como cheio dum incenso
Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais.
“Maldito!”, a mim disse, “deu-te Deus, por anjos concedeu-te
O esquecimento; valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais,
O nome da que não esqueces, e que faz esses teus ais!”

Disse o corvo, “Nunca mais”.

“Profeta”, disse eu, “profeta – ou demônio ou ave preta!
Fosse diabo ou tempestade quem te trouxe a meus umbrais,
A este luto e este degredo, a esta noite e este segredo,
A esta casa de ância e medo, dize a esta alma a quem atrais
Se há um bálsamo longínquo para esta alma a quem atrais!

Disse o corvo, “Nunca mais”.

“Profeta”, disse eu, “profeta – ou demônio ou ave preta!
Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais.
Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida
Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais,
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!”

Disse o corvo, “Nunca mais”.

“Que esse grito nos aparte, ave ou diabo!”, eu disse. “Parte!
Torna á noite e à tempestade! Torna às trevas infernais!
Não deixes pena que ateste a mentira que disseste!
Minha solidão me reste! Tira-te de meus umbrais!
Tira o vulto de meu peito e a sombra de meus umbrais!”

Disse o corvo, “Nunca mais”.

E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda
No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais.
Seu olhar tem a medonha cor de um demônio que sonha,
E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão há mais e mais,

Libertar-se-á… nunca mais!

Fonte: Escritores Perdidos.