[Resenha] A Travessia – Camila Torrano

Recorte da capa do livro, Ilustração com um fundo azul, com várias ondas do mar. No centro, a parte de cima de uma âncora. Em primeiro plano, em branco, o título:
Recorte da capa do livro, Ilustração com um fundo azul, com várias ondas do mar. No centro, a parte de cima de uma âncora. Em primeiro plano, em branco, o título: "A Travessia".

Um navio, um casal e uma lenda que espreita cada canto de uma embarcação. O quadrinho A Travessia de Camila Torrano tem um jeitão de história antiga, algo passado de geração por geração como se fosse uma joia de família.

Receba essa herança

Essa sensação de ouvir algo antigo, onde a história se mistura com lembranças gera identificação. Quem nunca ouviu do avô ou do bisavó “Nós viemos em um navio. Já faz muito tempo, mas lembro como se fosse ontem”?

De início, a autora passa de forma breve e clara o contexto histórico em que o leitor será inserido. Motivado por essa essência realista é fácil querer avançar pelas páginas em busca de descobertas.

O traço infantil colabora para o tom de lenda e os quadros grandes, que emulam quadros artísticos ou fotos, auxiliados com as cores vintages, combinam com a história/herança que nos está sendo contada. Todo esse cenário para um casal de protagonistas jovens em uma juventude tão bem construída através da ilustração e de suas atitudes que nos permite perceber que mesmo com pouca idade, nesse quase começar da vida adulta, há de ser retratado com heroísmo. Na obra de Camila Torrano, o casal Sarah e Henry são inocentes ao não perceber tudo aquilo que os cercam e se tornam sonhadores em relação ao futuro na nova terra. É fácil se apegar a essa inocência, a esse sentimento de querer uma vida nova.

Um casal, um conflito

Sarah é mais emotiva e acredita nas lendas populares. Henry é mais racional e preocupado. Este conflito entre real e irreal move a história e a maneira como a autora o inseriu como um tripulante da embarcação merece elogios.

O conflito central ganha corpo de forma natural e envolve o leitor. Durante toda a obra me senti uma criança diante de um bom contador de histórias. No começo ele retrata a tripulação de forma bonachona. Aí, quando fiquei mais atento, sem piscar os olhos, A Travessia começou a ganhar tons mais sombrios.

Logo percebi que a HQ tem uma alma de lenda, mas uma estrutura narrativa de conto. Apesar desta escolha não vemos pressa ou um ritmo acelerado. Gostei do cuidado com os detalhes: Camila Torrano mostra vários marinheiros da tripulação (cada um a sua maneira) para tornar tudo mais verossímil e as imagens lindas do oceano retratam com perfeição o isolamento do navio.

Belo presentes, mas faltou algo

No final há um desfecho nada banal. Além disso, a autora o usa para dar uma boa dose de cultura para o leitor. Posso até dizer que essa bela obra nacional tem uma “cena pós-créditos”. A ideia foi excelente e faz o leitor pensar em um monte de coisas. Entretanto, tem uma pequena falha. No começo, a autora faz questão de fornecer um contexto histórico. No final, pelo que pesquisei, um dos personagens é uma figura histórica. Sendo assim, faltou uma notinha de rodapé ou quem sabe a mesma ideia aplicada na primeira página.

Um pequeno detalhe que pode ser resolvido com uma pesquisa rápida na internet não apaga ou nubla todo o belo conceito e exceção desta obra nacional. É uma história curta, marcante, com elementos culturais e históricos e que pode ser lida em poucos minutos.

Leia, essa HQ vai te tornar um curioso sobre histórias de imigração.
Muitas lendas surgiram graças a elas.

4 SELOS CABULOSOS

Garanta a sua cópia de A Travessia e boa leitura!

Nome: A Travessia
Autor: Camila Torrano
Edição:
Editora: Escrita Fina
Ano: 2012
Páginas: 88
ISBN: 9788563877536
Sinopse: Em 1847 a Irlanda cai vítima da fome e o desespero se abate sobre o povo. A fuga em massa para a América vira necessidade. O único meio viável são ‘coffin ships’, navios muito velhos e de muitos segredos. Qualquer criatura sã pensaria duas vezes antes de se arriscar, mas a miséria não conhece sanidade. E é assim que hordas de irlandeses famintos tornam-se cegos diante das deploráveis condições. Cruzar o Atlântico é questão de sobrevivência – ainda que, paradoxalmente, possa custar-lhes a vida.