Um Copo de Cólera – Raduan Nassar

A obra de Raduan Nassar é composta por dois romances, a novela Um Copo de Cólera e dois contos. Em 2016, o escritor ganhou o Prêmio Camões e tem sido, mesmo antes disso, considerado um dos mais célebres autores brasileiros contemporâneos. Ele parou de escrever e, pelo que li, vive num sítio no interior.

A Novela

Um Copo de Cólera foi originalmente escrito em 1970 (quando nosso país estava sob a ditadura militar) e publicado em 1978.

A narrativa é um mergulho na intimidade de um casal nada usual. O protagonista, um senhor de meia idade, mantém relação com uma mulher jovem. Ele é um ricaço, enaltece o regime militar e, em si mesmo, se manifestam traços de autoritarismo, muitas vezes em contraste a uma certa infantilidade que suas ações demonstram. A protagonista, uma jornalista libertária, milita contra o regime e é a favor da liberdade de nosso país. Não se sabe o porquê de ela ter um relacionamento com aquele velho, apesar de às vezes ela parecer ter fetiche pela infantilidade dele.

O livro é divido em sete capítulos, sendo o penúltimo o mais longo, onde se desenrola a parte mais interessante do livro. O primeiro e o último capítulos são nomeados como “A chegada” e parecem incentivar uma leitura cíclica da narrativa e do relacionamento, o qual se mantém , apesar dos percalços (isso não é spoiler). A história acompanha o casal desde a chegada dessa jornalista para mais um encontro, demonstrando que são recorrentes há um bom tempo, até quando, após uma longa discussão, a moça vai embora e, algum tempo depois, torna a visitar o velho (a todo um caminho que precede a discussão, que consiste nos capítulos mais curtos, onde cenas íntimas nos são apresentadas).

Impressões

Em Um Copo de Cólera a prosa de Raduan é composta por períodos longuíssimos, os quais  no início passam despercebidos por estarem em capítulos curtos. Contudo, no capítulo mais longo, a escrita se torna sufocante. É proposital, na verdade, pois neste capítulo a relação do casal é retratada através de uma longa discussão (tão sufocante quanto a própria leitura dela). Durante toda narrativa o protagonista demonstra suas tendências autoritárias e atos machistas, o que é sempre rechaçado pela jornalista, ainda que, segundo ele, ela goste de todo aquele jogo. Não vale a pena confiar no que esse protagonista acha, pois toda a situação parece ser mais complexa.

Enquanto lia, tive a impressão de que essas discussões (às vezes tão artificiais) talvez não sejam tão absurdas no contexto do regime militar (tampouco as relações amorosas conflitantes, afinal, mesmo hoje em dia elas existem). É inevitável termos contato com pessoas que discordam de nós e que discutamos, podendo as desavenças tornarem a relação menos saudável ou até mesmo destruí-la. Não é o que acontece no livro.  Apesar do relacionamento parecer tão destrutivo (principalmente para a moça) ele permanece, sugerindo que talvez fosse assim mesmo naquela época. Certamente era diferente de hoje em dia e mais difícil para as mulheres.

Fechamento

Durante esse capítulo mais longo de Um Copo de Cólera (talvez a parte mais importante, o clímax do livro), a discussão põe em cheque toda a relação do casal. Chamou-me atenção a inverossimilhança daquele relacionamento, afinal, não conseguia conceber como pessoas tão diferentes podiam continuar juntas. Depois da discussão, a jornalista vai embora e tenho a impressão que o protagonista sente que é responsável por tudo, talvez até mesmo se culpando ou arrependendo dependendo da leitura.

No fim, a jornalista volta a visitá-lo. Nesse momento, novamente, os traços infantis do protagonista são reapresentados, numa tentativa do narrador demonstrar sua vulnerabilidade. E, no fundo, não sei que leitura fazer dessa história, pois não me parece haver uma leitura que não seja dúbia e esse talvez seja o mérito, o valor desse livro.

Nota

4 selos cabulosos

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Ficha Técnica

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Nome: Um copo de cólera

Autor: Raduan Nassar
Edição:
Editora: Companhia das Letras
Ano: 2007
Páginas: 88
ISBN: 9788571642430

Sinopse: “… e estava assim na janela, quando ela veio por trás e se enroscou de novo em mim, passando desenvolta a corda dos braços pelo meu pescoço, mas eu com jeito, usando de leve os cotovelos, amassando um pouco seus firmes seios, acabei dividindo com ela a prisão a que estava sujeito, e, lado a lado, entrelaçados, os dois passamos, aos poucos, a trançar os passos, e foi assim que fomos diretamente pro chuveiro.””O corpo antes da roupa”, afirma o personagem de Um copo de cólera ao narrar o que acontece numa manhã qualquer, depois de uma noite de amor, quando a aparente harmonia entre ele e sua parceira se rompe de repente. Tensa, contundente, a linguagem de Um copo de cólera alcança tal intensidade e vibração que faz desta narrativa uma obra singular da literatura brasileira, um clássico dos nossos tempos.