O erro de “HAL 9000” em 2001: Uma odisseia no espaço | Homenagem aos 50 anos da obra

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Quando Kubrick concluiu Dr. Fantástico (Dr. Strangelove – 1964), ele decidiu produzir um filme de ficção científica leve, algo que não tomasse o tempo de seus primeiros filmes. Nessa pesquisa, ele acabou lendo o conto O Sentinela de Arthur C. Clarke. Neste conto, Clarke trabalha com o conceito de uma entidade alienígena que acompanha a evolução da humanidade para relatar aos seus criadores o momento exato no qual a humanidade estaria pronta para encontrá-los.

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Kubrick não gostou do conto, mas achou a ideia promissora e passou a desenvolver com Clarke o que seria o roteiro de “2001”: durante dois anos, ambos estudaram Sociologia, Física e Antropologia para poder desenvolver e finalizar o roteiro e o livro (já que Clarke também estava escrevendo o romance simultaneamente).

Kubrick e Clarke no set de 2001: Uma odisseia no espaço (1968)

Em sua estreia, 2001: uma odisseia no espaço causou um alvoroço. Na primeira exibição, cerca de 241 críticos levantaram-se antes do término da sessão. A esposa de Kubrick, a atriz Christiane Kubrick, tentou ligar para o marido para avisá-lo que havia críticas positivas sobre o filme saindo em outras mídias, como por exemplo, o rádio. Como afirma em depoimento para o documentário Stanley Kubrick: a life in pictures, o cineasta estava preso em reuniões com os acionistas da MGM e não sabia que uma parte do público estava adorando seu novo filme.

Acredito que este seja o principal mérito de uma obra como 2001. Não importa quantas vezes você a assista, ainda terá sobre o que discutir. Mas de todas as divergências interpretativas que pude encontrar na obra, livro e filme, a que me chamou mais atenção foram as atitudes tomadas pelo computador HAL 9000 no terceiro ato do filme. O momento em que deliberadamente HAL matava todos tripulantes da Discovery, com exceção de Bowman, é sem sombra de dúvida um dos mais controversos do cinema e da literatura de ficção científica.

Para compreendermos o tal “erro” de HAL é preciso analisar suas atitudes no filme e no livro, porque são relatados de formas diferentes.

Hal pede a Dave (Keir Dullea) para lhe mostrar seus desenhos.

No filme, HAL 9000 é um computador dotado de uma grande capacidade. Ele controla toda a Discovery. Bowman e Poole são meros vigias caso ocorra algum problema do qual HAL não consiga dar conta. E é exatamente isso que ocorre quando, durante uma conversa “informal” com Bowman, HAL descobre uma falha na unidade de comunicação AE-35, que logo depois ficamos sabendo que não apresenta defeito algum. Poole a recoloca e é neste momento que HAL, em controle de uma das cápsulas, ataca Poole e o mata.

PORQUE HAL?

Essa cena no filme precisa ser compreendida em seus detalhes. O que teria levado HAL a fazer o que fez? Seria um complexo de Frankenstein? Não verdade, HAL não é uma inteligência artificial, ele estava apenas seguindo a sua programação. Vamos atentar para alguns fatos importantes:

  1. Quando Poole está jogando xadrez com HAL, ele faz uma jogada “errada”, é o próprio astronauta que revela isso ao dizer que aquela fora uma péssima jogada. HAL pede desculpas, mas logo que Poole faz a sua jogada, descobrimos que HAL “errou” de
    HAL 9000 jogando xadrez com Poole (Gary Lockwood)

    propósito para atrair Poole a uma armadilha e após uma série de lances faz o jogo chegar a xeque. Percebendo a derrota eminente, o astronauta desiste.

  2. Bowman também passa por um blefe de HAL. Assim que mostra seus desenhos para o super-computador, HAL lhe faz uma pergunta pessoal. HAL afirma que Bowman está inseguro quanto a missão, mas diferente do que esperava HAL, Bowman não responde, pelo contrário, devolve a pergunta. A máquina então apresenta o problema na unidade AE-35.
  3. HAL mata todos os tripulantes, com exceção de Bowman. Por quê? Diferente de Poole, Bowman “continua a jogar”, mesmo depois que HAL blefa sobre o erro na unidade.
  4. HAL recebeu a real missão no meio da jornada a Júpiter. A missão na verdade consiste em chegar a fonte do sinal que fora
    Cena na qual Poole é atacado por uma cápsula contrada por HAL 9000

    enviado pelo monólito dezoito meses antes da cratera Tycho na Lua. Não é possível saber quais instruções ele teria recebido, no entanto, diante do descaso de Poole e sabendo que HAL conhecia os demais tribulantes em estado em hibernação, já que ao dialogar com Bowman antes de identificar a pane na unidade AE-35 HAL afirma que os outros tripulantes passaram por treinamentos individuais que Bowman, aparentemente, não tivera acesso, poderia o computar sabê-lo?

  5. Se a resposta a cima for sim, HAL poderia ter analisado que diante dos dados que lhes fora enviados da Terra somando ao que sabia dos tripulantes que apenas Bowman seria capaz de completar a missão.
  6. Poole, além de propor que HAL seja desligado, também mostra-se um ser humano descrente da própria missão. Lembremos a cena em que ele recebe uma mensagem de feliz aniversário dos seus pais e o astronauta permanece impassível. Fora que, se HAL detinha o conhecimento real da missão, ao querer desligá-lo, Poole estava interferindo no progresso da mesma.
  7. Mais um ponto que confirma essa teoria é que HAL usa a cápsula para matar Poole lançando-o no espaço, mas o mesmo parece não fazer o mesmo quando Bowman, dentro da cápsula, deseja entrar na Discovery. O computador apenas fica repetindo a mesma, e famosa frase, “I’m sorry Dave, I’m afraid I can’t do that” (“Me desculpe, Dave, mas receio que não posso fazer isso.”).
  8. É importante lembrar que o próprio Kubrick era um hábil jogador de xadrez. Quando HAL deixa Bowman fora da nave, dentro da cápsula, desafiando-o assim como um “xeque” que antecede o “xeque-mate”. Mais uma vez, Bowman não desiste e consegue entrar na Discovery desativando HAL e completando a missão. Ou seja, a cálculo feito por HAL estava correto: Dave era o único capaz de chega a Júpiter, encontrar o monólito e concluir a missão.

A trajetória da minha reflexão até Júpiter

Essa sequência de fatos é para mostrar que HAL não sofre de um complexo de Frankenstein. Ele não ficou com inveja dos seus criadores e decidiu exterminá-los. HAL 9000 apenas seguiu sua programação que não conhecemos em totalidade, pois as instruções dadas a ele durante a viagem a Júpiter somente ele sabia e somente ao desativar o computador é que Bowman fica a par dessas informações.

No entanto, como o livro escrito por Clarke, trabalha esse momento? Será que na obra escrita em paralelo com o filme o computador teria entrado em contato com o monólito e adquirido consciência? Se o post já estiver publicado basta clicar no link abaixo. Caso não, aguarde que em breve publicarei o desenrolar deste eventos no livro.

E para você, seguindo os elementos que temos no filme, o que aconteceu com HAL 9000? Deixe nos comentários abaixo suas impressões.